2023: Santos, São Sebastião e Itajaí como cases portuários

Que tal um ambiente concorrencial em bases isonômicas voltar a ser o mote das reformas portuárias?

Por: Frederico Bussinger  -  20/12/22  -  06:25
A desestatização do Porto de São Sebastião passa a ser cercada de incertezas
A desestatização do Porto de São Sebastião passa a ser cercada de incertezas   Foto: Porto de São Sebastião/Divulgação

A decisão de 13 de dezembro do Tribunal de Contas da União (TCU) que remeteu para 2023 a desestatização santista quiçá agradou tanto ao atual como ao governo eleito: àquele, pelo voto favorável do relator (ainda que com determinações e recomendações). E a este pelas objeções e dúvidas dos três ministros que pediram vista: são várias, e algumas tão preliminares, que se abriu uma janela para ampla reavaliação.


Três outras implicações. Ela deixou: i) um sentimento entre frustração e luto naqueles entusiasmados com a desestatização; ii) um alívio e certa esperança entre os que anteviam prejuízos com a “nova ordem” (no conceito de Maquiavel); e iii) incertezas nos outros dois portos em estágio avançado na carteira do Programa de Parceria de Investimento (PPI): São Sebastião e Itajaí. Pode ser; mas parece haver mais diferenças que semelhanças entre os três.


Por exemplo: Santos e Itajaí são portos consolidados; realidade distinta de São Sebastião: seu Terminal de Uso Privado (TUP) é um dos principais do País, mas o porto público ainda é embrionário. Santos é um porto plural e equilibrado (granéis sólidos e líquidos, carga geral e contêineres); Itajaí quase só contêineres; e São Sebastião majoritariamente granel sólido. Suas dimensões físicas são díspares: o complexo santista é cerca de 15 vezes maior que os de São Sebastião e Itajaí; similares. De igual forma os volumes movimentados: Santos algo como sete vezes Itajaí; que é 20 vezes São Sebastião.


Santos é o único com acesso ferroviário. Acessos aquaviários e rodoviários são gargalos para Santos e Itajaí, mas as realidades de São Sebastião são distintas: se aqueles dependem de dragagem periódica para acesso de navios “usuais”, o porto do Litoral Norte é privilegiado com duplo acesso e canais com profundidades, naturais, superiores a 20 metros. Rodoviariamente, Santos e Itajaí operam no limite das capacidades; já o principal gargalo de São Sebastião (serra) deixou de existir com a inauguração da Nova Tamoios, enquanto se anuncia que o trecho do contorno deverá ser concluído em breve.


Essa sinopse indica que são três complexos bastante distintos: já atualmente, e mais ainda em suas trajetórias para atendimento das respectivas hinterlândias e desenvolvimento de suas logísticas. Confirma-se, assim, a ideia de que “cada caso é um caso”, ouvido nas audiências públicas e entrevistas sobre as desestatizações nos últimos anos. Tal diretriz, porém, precisa ser posta em prática; mesmo na hipótese de a desestatização seguir adiante.


Já na hipótese contrária, do planejamento estratégico do complexo vir a ser rediscutido, vale observar outra diferença: a participação e o envolvimento das respectivas comunidades portuárias e sociedades da região não são iguais. De Itajaí está muitos quilômetros à frente!


Por fim, nos três casos os respectivos portos organizados passaram a integrar um completo portuário; também com perfis diferentes: São Sebastião não tem nenhum arrendamento, Itajaí um e Santos dezenas. São Sebastião tem um TUP, Itajaí alguns e Santos vários.


Em todos três há TUPs de grande porte: Tebar, Portonave e DPW; respectivamente. Desses, Tebar é terminal dedicado, tem vida própria; mas DPW e Portonave são concorrentes diretos de terminais arrendados: e com vantagens competitivas, conforme atesta auditoria operacional do TCU, e as seguidas e recentes transferências de linhas, da APM (arrendamento) para a Portonave (TUP vizinho), como a rota Índia-Ásia, falam por si só. Enquanto essa heteronomia existir, consolidada pelo modelo da atual Lei dos Portos, dificilmente linhas serão “retomadas”, como preveem o diretor-superintendente da APM e o prefeito de Itajaí.


A par de governança (objeto de coluna anterior em A Tribuna), essa questão de natureza concorrencial e regulatória, fora do eixo central das modelagens da desestatização, é nevrálgica para o desenvolvimento logístico e a tal decantada segurança jurídica. Que tal um “ambiente concorrencial em bases isonômicas” voltar a ser o mote das reformas portuárias? Com suas diversidades, os encaminhamentos para os três portos podem ser paradigmáticos. Um Natal de renovação, a todos nós!


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