Polanski sendo Polanski no drama histórico 'O Oficial e o Espião'

Filme se passa em Paris, no fim do século 19, e retrata visão do controverso cineasta sobre caso de linchamento

Por: André Azenha - Crítico de Cinema & Especial para A Tribuna &  -  12/03/20  -  12:15
Longa é baseado no caso de linchamento público vivido pelo Capitão Alfred Dreyfus
Longa é baseado no caso de linchamento público vivido pelo Capitão Alfred Dreyfus   Foto: Divulgação

Filmes são reflexos de sua época. Não importa o gênero, se a trama ocorre no passado, no futuro, no presente. Se mergulham na fantasia ou não. A visão de um cineasta sempre vem carregada da experiência pessoal, do contexto do mundo. 


O Oficial e o Espião, mais recente trabalho de Roman Polanski, é baseado no famoso caso de linchamento público vivido pelo Capitão Alfred Dreyfus em 1894. De origem judaica, o oficial de artilharia do exército francês foi condenado por alta traição. Injustamente.


O veredito baseava-se em documentos falsos. Quando os oficiais de alta patente perceberam o absurdo, tentaram ocultar o erro judicial. Eram tempos de xenofobia e nacionalismo na Europa do final do século 19. Alguém pensou nos dias atuais? 


Tanto no Caso Dreyfus como em vários relatos de fake news do mundo moderno, a pessoa é condenada antes de ter a chance de defender-se. Polanski, responsável pelo roteiro em parceria com Robert Harris, autor do romance


An Officer and a Spy, faz um tratado sobre a injustiça. Aborda o antissemitismo, tema recorrente em sua filmografia (inclusive em O Pianista, que lhe rendeu o Oscar). Ele que viveu os horrores do Holocausto. 


Por outro lado, parece gritar ao mundo contra as acusações de assédio que enfrentou e enfrenta. O cineasta é condenado nos EUA por estupro de menor e só consegue filmar em países onde não pode ser extraditado. É alvo frequente de protestos. 


Como na última edição do Cesar, o Oscar francês, quando recebeu os prêmios de direção e roteiro adaptado mas não compareceu à cerimônia. Centenas de mulheres compareceram nos arredores da Sala Pleyel, em Paris, indignadas com as 12 indicações da obra - cujo currículo incluir, ainda, o Cesar de figurino e quatro prêmios no Festival de Veneza. 


Em O Oficial e o Espião, o diretor volta a trabalhar com a esposa, a atriz Emmanuelle Seigner. Louis Garrel (de Os Sonhadores, 2003), filho do diretor Philippe Garrel e da atriz Brigitte Sy. interpreta Dreyfus.


Uma de suas melhores atuações na carreira. Jean Dujardin, Oscar de melhor ator pelo já esquecido O Artista (2011), vive o oficial Picquart, que decide investigar o caso após encontrar contradições nele. 


A trama começa meio devagar, demora para entregar, mas a partir da metade deslancha. Polanski mantém o competente nível de sua carreira. Reúne bons atores e levanta temas importantes. Alguns intencionalmente: o poder destrutivo das fake news e a maneira como imprensa, população e parte do poder contribui para disseminá-las. Outros, sem intenção: como separarmos o artista da pessoa?


Oficial e o Espião (J'accuse). 2019. França, Itália. Direção de Roman Polanski.
Com Jean Dujardin, Louis Garrel, Emmanuelle Seigner, Grégory Gadebois. em cartaz no Cinemark Praiamar, Cineflix Miramar e Roxy Pátio Iporanga.


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