Antonio Fagundes fala dos planos para depois de Bom Sucesso e da mulher e do filho

Ator está com duas peças em São Paulo. Ele tem fãs que o seguem há 53 anos e, recentemente, aderiu ao Instagram

Por: Stevens Standke  -  02/02/20  -  21:26

É inevitável olhar para Antonio Fagundes e não pensar imediatamente na sua trajetória de tremendo sucesso na TV. Mas, ao longo dos mais de 50 anos de profissão, o ator também sempre se dedicou intensamente ao teatro, onde, além de aparecer em cena, passou a escrever roteiros e produzir seus próprios espetáculos. Tudo em nome da tão sonhada liberdade artística, de poder construir a sua carreira do modo como bem entendesse.


Após se despedir da novela Bom Sucesso, que obteve ótima audiência na faixa das 19 horas da Globo, Fagundes agora vai focar no podcast que nasceu a partir do folhetim, com indicações de livros, e em duas peças, ambas em cartaz no Teatro Tuca, na Capital: Carmen - A Grande Pequena Notável, musical sobre a icônica Carmen Miranda, do qual é apenas produtor; e Baixa Terapia, espetáculo sobre três casais que reveem suas relações, em uma engraçada lavação de roupa suja - Fagundes não só produz essa montagem como integra o elenco, junto com a mulher, Alexandra Martins.


Na entrevista a seguir, o carioca de 70 anos fala ainda da sua recente entrada no Instagram, do quanto gosta de literatura e pintura e da parceria profissional com o filho, Bruno Fagundes, com quem desenvolveu uma cooperativa para facilitar a viabilização de uma peça.  


TELEVISÃO Bom Sucesso não foi apenas um sucesso de audiência. Principalmente seu personagem na novela, o Alberto, ajudou a incentivar o gosto pela leitura. Como se sente por poder fazer isso, ainda mais que é apaixonado por livros?
Esse trabalho na Globo me deu a feliz oportunidade de abordar a importância da leitura e de estimular esse hábito. Por causa da novela, passei a ter até um podcast com indicação de obras, que se chama Clube do Livro por Antonio Fagundes. Fizemos 21 programas enquanto Bom Sucesso esteve no ar e, como tivemos resposta maravilhosa, vamos partir para a segunda temporada.


Fagundes lê sobre tudo, especialmente pintura. E tem até podcast.
Fagundes lê sobre tudo, especialmente pintura. E tem até podcast.   Foto: Renata Almeida/ Divulgação

Lembro que, em uma das entrevistas que fizemos, você chegou com um livro a tiracolo no teatro. Essa cena me marcou.


Eu leio o máximo que posso. Não dá nem tempo de contar quantos livros leio por ano, pois emendo um no outro. Em casa, possuo uma biblioteca e a minha coleção pessoal. Gosto de ler sobre tudo, o que importa para mim, na verdade, é o livro ser bom. Um tema que me interessa bastante e sobre o qual sempre estou lendo é pintura. As artes plásticas, em geral, chamam a minha atenção.


Tem um movimento preferido?
Não há exatamente um de que goste mais, procuro não destacar nenhum dos movimentos. O que acho bacana é justamente a dinâmica da história da arte, não dá para se aprofundar em um movimento sem entender o anterior, suas origens e reflexos.  


INTERNET Foi sua a decisão de abrir um perfil recentemente no Instagram?
Muitas pessoas pegaram no meu pé para ter uma conta. Ao mesmo tempo, o que também pesou bastante para mim é que, como as redes sociais vieram para ficar, ou eu aprendia logo como utilizá-las, ou ia ficar para trás.


Está curtindo?
Tenho achado tudo divertido, bem gostoso mesmo. Ainda não posso falar direito sobre o assunto, porque sou novato. Mas vamos ver no que isso vai dar.


LIGAÇÃO No momento, você pode ser conferido no teatro na Capital. Apesar de ter nascido no Rio de Janeiro, passou uma boa parte da sua vida em São Paulo, não é mesmo?
Eu vim pequeno para São Paulo, basicamente fui criado na cidade. Eu a adoro, sou apaixonado por ela. É um lugar muito bom para se viver. Considero a cultura e a gastronomia fantásticas. E a minha família inteira é de São Paulo. Como me formei ator na cidade, naturalmente comecei a trabalhar nela e acabei conquistando um grande público de teatro. Tem gente que me acompanha há 53 anos, é gostoso demais saber disso.


Essas pessoas costumam procurá-lo depois das sessões?
Sim, elas sempre me dão feedback sobre os espetáculos, nestes anos todos. Algumas colecionam programas e guardam vídeos das peças. Tenho o maior prazer em atendê-las.


RESPEITO Você é conhecido por sua pontualidade nas apresentações, por não deixar ninguém entrar atrasado e não aprovar celulares no teatro. Isso o inspirou, inclusive, a escrever uma peça, chamada Sete Minutos. 
Essa é uma questão de respeito mútuo, entre o ator e o público. Quero que a plateia tenha prazer em assistir ao que preparamos. Mas, se a pessoa se põe a falar no celular ou chega atrasada à sessão, isso mostra um descaso, concorda? Não vale a pena a gente viver esse tipo de situação.


Continua escrevendo roteiros?
Não, esse é um trabalho que requer bastante tempo. Particularmente, gosto demais de escrever, mas teria que parar todas as minhas outras atividades para me dedicar aos meus textos. Quem sabe, quando eu ficar mais velhinho, foque só na escrita. Por enquanto, sinto que ainda tenho muita coisa a fazer como ator.


Além de produzir as suas peças, Fagundes já escreveu roteiros.
Além de produzir as suas peças, Fagundes já escreveu roteiros.   Foto: Renata Almeida/ Divulgação

INDEPENDÊNCIA Além de Carmen – A Grande Pequena Notável, que está em cartaz em São Paulo, você já produziu vários outros espetáculos ao longo da carreira. O que foi fundamental para se aventurar nessa função?
Comecei a trabalhar no teatro em 1966. Até 1975, eu era ator contratado das peças. Mas percebi que, se não tivesse domínio dos meios de produção, jamais iria fazer da minha carreira o que queria, pois precisaria me sujeitar ao mercado e às pessoas para que me chamassem para trabalhar nos seus projetos. Apesar de, até 75, ter contado com muita sorte – tanto que tudo o que fiz foi exatamente o que eu desejava –, sabia que, com o tempo, nem sempre seria assim. Por isso, comecei a produzir espetáculos, e não parei mais. De lá para cá, apenas fiz peças que produzi. O musical Carmen, nesse sentido, é um trabalho diferenciado.


Por quê?
Eu comprei a produção, ela não é minha desde o início. No primeiro semestre do ano passado, fui assistir ao espetáculo no último dia da temporada e não me conformei com o fato de que ele iria sair de cartaz, por falta de patrocínio. Achei um pecado aquele musical tão bem montado, tão bonito, estimulante e brasileiro e que diverte todas as idades, de crianças a idosos, ser encerrado. Resolvi fazer uma proposta para o elenco e o resto da equipe e acabei comprando a produção. Desde então, tenho mantido o espetáculo em cartaz. Ele também é diferenciado por eu não estar em cena, como ator.


Faz questão de ir para o palco em todas as peças que produz? 
Não necessariamente. Já produzi uma série de espetáculos em que não entrei em cena, como Margarida Margot do Meio Fio e O Abajur Lilás.


O que busca geralmente em um texto?
Quero que o público, de alguma forma, saia modificado do teatro, que o espetáculo faça a pessoa repensar algo da sua vida. Acho que para conseguir isso é preciso que a plateia se divirta com a peça. Costumo brincar que o bom texto é aquele que faz a gente refletir sobre ele, pelo menos, por cinco minutos, até chegar ao estacionamento.


SUCESSO Você também está em cartaz no mesmo teatro, o Tuca, com Baixa Terapia. Como foi a produção desse espetáculo?
Eu estava em Buenos Aires resolvendo problemas de uma peça que fiz antes, Vermelho, com o meu filho, Bruno, porque os direitos autorais estavam nas mãos de um argentino. Me acertei com esse produtor e pedi uma indicação de espetáculo para assistir na cidade. Ele sugeriu ver Baixa Terapia. Fiquei encantado, morri de rir e me surpreendi no final. Os atores argentinos eram muito bons; o texto, brilhante. Imediatamente, entrei em contato com o autor e comprei os direitos para montar no Brasil. Acertei na escolha: nós estamos em cartaz há três anos, já passamos de 300 mil espectadores e de 400 apresentações. Ficamos por três meses com a peça em Portugal, onde mais de 60 mil pessoas foram nos assistir. Viajamos para três lugares dos Estados Unidos: Miami, Orlando e Boston. E percorremos 27 cidades aqui no País. Após a temporada em São Paulo, que vai até 29 de março, vamos estrear no Rio de Janeiro, em maio.


O que mais o fascina nesse espetáculo?
Ele gira em torno de três casais que vão para a terapia e o psicólogo não aparece, mas deixa envelopes com indicações para eles mesmos conduzirem a sessão. Aí, tem início a maior lavação de roupa suja, é algo muito engraçado. É bem legal o que conseguimos: as pessoas que assistem à peça acabam não contando para seus amigos e parentes o final, que é surpreendente. Acredito que elas não queiram estragar a experiência dos outros com nenhum spoiler.  


FAMÍLIA Após fazer Vermelho com seu filho, Bruno, em 2012, vocês montaram uma cooperativa em 2013 para viabilizar o espetáculo Tribos. Ela ainda existe?
Tenho mantido esse modelo de trabalho desde Tribos e vou continuar apostando nele daqui para frente. Eu o encaro como uma parceria. Assim, todos os atores podem usufruir do (faturamento) líquido do espetáculo, é uma forma que eu e o Bruno descobrimos para a equipe inteira participar da produção, com seu trabalho.


Além de já ter contracenado com o Bruno, você trabalha no momento com a sua mulher, Alexandra Martins, na peça Baixa Terapia. Sem falar que, na novela Bom Sucesso, vocês também dividiram cena. Como é ter a família assim, ao seu lado?
No teatro, se o camarim é bom, você já tem 80% do sucesso do espetáculo garantido. Então, a melhor coisa que posso fazer é me cercar de pessoas que amo e com as quais me dou bem. Não tem erro: sempre que houver personagens com os perfis do Bruno e da Alexandra, eles estarão no elenco.


O que procura transmitir de aprendizado para os dois?
No teatro, nós somos todos iguais. Afinal, é a única arte democrática que existe. Se um falha, destrói a peça. Portanto, todos estão aprendendo e ensinando constantemente.


Que legal que tem essa humildade depois de tanto tempo de estrada.
Humildade? Para mim, é apenas a verdade (risos).


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