Leis de incentivo e editais são um caminho para a Cultura; veja como acessar

Interessados em receber recursos públicos vão passar por avaliações, fiscalização e pelo crivo de empresas

Por: ATribuna.com.br  -  03/12/23  -  16:19
Depois de aprovados em comissões, artistas devem procurar empresas, que também vão avaliar se os projetos se enquadram à organização
Depois de aprovados em comissões, artistas devem procurar empresas, que também vão avaliar se os projetos se enquadram à organização   Foto: Pixabay

Os convidados de A Região em Pauta falaram da importância das leis de fomento à cultura, para que os artistas possam custear seus projetos. O artista visual e filósofo Maurício Adinolfi, por exemplo, disse que, no Brasil “ainda vivemos de editais”. O problema é que nem sempre é simples acessar os recursos.


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A questão é que existe um longo caminho para se chegar ao dinheiro. Uma das etapas é a avaliação feita por comissões existentes, por exemplo, no Programa de Ação Cultural (ProAC), uma iniciativa do Governo de São Paulo.


Ele tem duas modalidades. Uma é a de editais, na qual o colegiado pesa se a atividade proposta está de acordo com o chamamento. Já na de renúncia fiscal do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), outros elementos são apreciados.


“Avalia-se mérito cultural e precificação, porque precisa-se saber se não há custos sem sentido”, explicou o chefe de gabinete da Secretaria de Cultura, Economia e Indústria Criativa do Estado, Daniel Scheiblich Rodrigues.


O gestor também citou as condições para um trabalho ser reprovado. “Caso seja considerado ruim artisticamente (não passa) e se os valores não forem os de mercado. Existem também as contrapartidas”.


A partir da aprovação da comissão, os artistas podem procurar empresas, a fim de pedir que repassem parte do tributo para seu projeto. No entanto, é preciso saber quais organizações procurar.


“O incentivador analisa sua diretriz e vê o que está alinhado com seu proposito naquele território. Este ator tem poder de decisão também (e tem o direito recusar a proposta)”, citou Diego Nunes, fundador e sócio da Nunes Projetos Incentivados.


Por fim, vale destacar que a fiscalização do poder público continua mesmo depois da liberação do dinheiro. “Precisa respeitar o projeto”, avisou Rodrigues. Portanto, não é permitido mudar o que foi aprovado antes do recebimento da verba.


Daniel Scheiblich Rodrigues ressaltou que, se as organizações não repassarem seus impostos a projetos culturais, elas vão ter de enviar o mesmo recurso para os cofres do governo
Daniel Scheiblich Rodrigues ressaltou que, se as organizações não repassarem seus impostos a projetos culturais, elas vão ter de enviar o mesmo recurso para os cofres do governo   Foto: Sílvio Luiz/AT

Orientar contadores
Daniel Scheiblich Rodrigues disse que muitos contadores costumam colocar obstáculos e evitar repassar parte de tributos a projetos culturais por acharem que isto vai onerar os cofres das empresas. Segundo ele, este fato se dá pela falta de conhecimento da legislação. Para contornar o problema, o chefe de gabinete da Secretaria de Cultura, Economia e Indústria Criativa do Estado orientou os artistas a esclarecerem os setores financeiros das organizações.


“Embora a empresa seja chamada de mecenas, de patrocinadora, ela não precisa tirar nada de seus cofres. É muito importante que, ao abordar a companhia, se leve este conhecimento, principalmente à área contábil, que é onde, normalmente, os entraves acontecem”, disse.


Reforçando a necessidade de se explicar como funciona a renúncia fiscal, o especialista explicou que, ao negar repassar dinheiro a criações culturais, as companhias não vão economizar. Isso porque a quantia que poderia ajudar um artista vai ser recolhida pelo Estado.


“Tem de dizer à empresa que ela já recolhe ICMS. O artista pede parte do que se recolhe, para ser destinado ao seu projeto. Assim, ela não tira nada do bolso, do lucro, porque o imposto já é pago. Então, se não destinar ao projeto, vai para os cofres públicos”.


Receio
Rodrigues também afirmou que muitos contadores não gostam de trabalhar com repasse de tributos por acharem que isto vai tornar as organizações em que atuam mais visadas por fiscais. “A mentalidade deste profissional é de que se ele expuser a empresa, vai abrir as portas para auditores da Fazenda encontrarem pelo em ovo. Mas, não é assim”.


Aprender a concorrer
O secretário de Cultura de Santos, Rafael Leal, enfatizou que o poder público, independentemente de sua esfera de atuação, tem dinheiro disponível para artistas. Porém, para ele, muitos não tentam acessar a verba por medo ou dificuldade de lidar com o processo de candidatura aos recursos. O gestor acha que estes problemas são resolvidos com informação e capacitação.


O convidado de A Região em Pauta afirmou que existe um cenário consolidado: em sua cidade, o número de indivíduos que se inscrevem em editais não aumenta. Além disso, não existe alternância, ou seja, geralmente, sempre os mesmos entram nas concorrências.


Para Leal, esta situação só vai mudar a partir do momento em que os processos atingirem a população em geral. “Falta informação. Esses editais precisam chegar à ponta, a pessoas que queiram mostrar seu trabalho”.


Só que isto não é suficiente. Os artistas também necessitam de esclarecimentos, a fim de que a concorrência “não vire bicho de sete cabeças, mas uma solução para o produtor”.


“Precisamos ensinar as pessoas. O dinheiro está aí, e devemos levar isso ao maior número de interessados. E, quando a informação chegar a eles, capacitá-los para acessarem o dinheiro”, disse, citando que a prefeitura já cria grupos de trabalho, com palestras e materiais, tendo como objetivo instruir pretendentes.


Nunes disse que qualquer indivíduo pode apoiar projetos culturais
Nunes disse que qualquer indivíduo pode apoiar projetos culturais   Foto: Sílvio Luiz/AT

Democrático
Os especialistas na legislação de incentivo que participaram de A Região em Pauta afirmaram que todo processo de acesso aos valores é democrático. Os dois disseram que tanto pessoas físicas quanto empresas podem se habilitar a disputar os recursos. Aliás, isto vale não só para proponentes, mas também para quem quiser ser incentivador de projetos culturais.


Daniel Scheiblich Rodrigues falou, resumidamente, a respeito do tema. Ele esclareceu que qualquer indivíduo pode tentar obter o dinheiro destinado pelo poder público. “Pessoa física ou jurídica, com ou sem fins lucrativos, e organizações da sociedade civil podem propor projetos. Até mesmo cooperativas”.


Já Diego Nunes deu mais detalhes a respeito de quem pretende acessar o montante tendo somente o Cadastro de Pessoas Físicas (CPF). “Essa pessoa, que é agente ou produtor cultural, pode ingressar nas leis de incentivo”, declarou. Contudo, fez uma ressalva, dizendo que se for um artista buscando apoio para seu primeiro trabalho, é possível que ele tenha um pouco mais de trabalho “na primeira gestão de recurso”.


Com relação aos incentivadores, Nunes destacou que também não há limitação. “Aqui, também pode ser pessoa ou empresa. Tirando a lei do Estado, porque o ICMS não é recolhido por pessoa física, quem quer incentivar tem a chance de usar parte do IPTU (Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana) para ajudar um projeto, ou até 6% do Imposto de Renda para um projeto cultural federal”, citou o convidado do fórum.


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