Brasil precisa de legislação para regular o uso da tecnologia

Conclusão é do jornalista e escritor Alexandre Le Voci Sayadi

Por: ATribuna.com.br  -  03/03/24  -  18:13
  Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

É urgente a criação de uma legislação que regule o uso da inteligência artificial (IA). Esta é uma certeza para o jornalista, educador e escritor Alexandre Le Voci Sayad, que também entende que esta não é uma tarefa para o Congresso Nacional. Isso porque, para ele, a tecnologia não afeta todas os setores da sociedade da mesma forma, o que cria um cenário difícil para que os parlamentares consigam debater o tema de forma apropriada.


“O ideal é que cada ministério ou secretaria legisle em sua área”, disse, exemplificando: “Na educação, existem dados dos alunos, de crianças e adolescentes. Eles são úteis, pode-se avaliar uma região inteira da cidade. Mas, são dados de crianças e adolescentes. Como lidar com essa dicotomia? Nada melhor que o MEC (Ministério da Educação) para fazer isso. Por que o Parlamento interferir? O MEC pode se regular neste sentido. E como controlar o fluxo de informação que circula internacionalmente sobre o país? O Itamaraty tem de criar uma barreira. É difícil jogar isso para o Congresso”, considerou.


Por sinal, ao falar sobre deputados e senadores tentando solucionar o tema, o jornalista e escritor afirmou que algumas das conversas anteriores realizadas em Brasília o preocuparam. “Eles cogitaram que a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) seja o órgão brasileiro de regulamentação da inteligência artificial. Deixar para ela ou criar outro regulador é uma armadilha, pois é preciso olhar um universo muito grande. Achei o pior caminho”.


Dificuldades geral


Apesar disso, Sayad destacou que chegar a uma lei eficiente não é um problema brasileiro. “A Europa passou por isso. Porém, o que aprovaram tem coisas interessantes”.


Segundo ele, um dos pontos positivos da legislação do Velho Continente é atribuir sempre ao homem a responsabilidade da tomada de decisões, ainda que as máquinas tragam análises e diagnósticos. “Não estamos no ponto de deixar a decisão final ser do algoritmo”.


Além disso, os europeus discutem acabar com procedimentos de reconhecimento facial. “Existe um movimento para (banir) em cinco anos”.


Confiança


O deputado estadual Caio França (PSB) esteve no evento e deu sua opinião sobre o Congresso criar uma legislação para a inteligência artificial. Em sua explanação, ele disse acreditar que os parlamentares têm condições de elaborar uma boa legislação. “Penso que o Congresso tem boas cabeças, e eles utilizam referências de outros lugares. Claro que, quando vai fazer legislação com temas muito atuais, ainda sem um histórico, busca-se em outros lugares, para saber como foi, resultados, o que serviu de positivo e o que foi negativo. Estes são assuntos que não vão ter uma lei que vai resolver o problema como todo. É necessário um conjunto de medidas, que vão nos fazer ter ferramentas para melhorar a convivência em sociedade”.


"LGPD é boa, mas precisa ser atualizada", considera escritor


Ainda sobre legislações, o ex-consultor da Unesco elogiou a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), que entrou em vigor em 2020. No entendimento do especialista, a norma brasileira, de fato, resguarda o cidadão. Por outro lado, com o avanço da inteligência artificial, o estudioso entende que as regras existentes têm de ser atualizadas.


“A LGPD é muito boa, foi feita à luz da lei europeia. Porém, vai ter de se atualizar. Com o uso de dados pela IA e por deepfakes, a lei vai ter de criar mais robustez e ser revista”, sentenciou o especialista, que abriu o fórum realizado no prédio do Grupo Tribuna.


Criada em 2018, a legislação em questão estabelece diretrizes a respeito de coleta, armazenamento, tratamento e compartilhamento de dados pessoais. Seu objetivo é assegurar a privacidade e a segurança das informações de todos os indivíduos, determinando procedimentos corretos para o uso responsável desses dados pelas organizações, sejam elas públicas ou privadas. O descumprimento das normas acarreta em penalizações, com multas que podem chegar a R$ 50 milhões.


Na Europa


Como mencionado por Sayad, a LGPD teve por base uma medida criada na Europa. Trata-se do Regulamento Geral de Proteção de Dados — no original, General Data Protection Regulation (GDPR) —, que foi concebido em meados de 2012, tendo sido assinado somente em 2016. Apesar disso, a legislação só entrou em vigor em 2018.


Alesp analisa projeto da Semana Estadual de Educação Midiática


Já existem movimentos de algumas autoridades públicas no sentido de criar leis que preparem a população para ter um bom convívio no ambiente digital. Uma das iniciativas é do deputado estadual Caio França (PSB), autor do projeto de lei 45/2022, que institui a Semana Estadual de Educação Midiática.


Conforme a propositura, que já foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp), a ideia é que a campanha ocorra na última semana de outubro, seguindo as diretrizes traçadas pela Semana Global de Alfabetização Midiática e Informacional, liderada pela Unesco. A sugestão é que, no período, ocorram atividades em escolas de Ensino Fundamental II e Ensino Médio da rede pública estadual. Essas ações se estenderiam à sociedade em espaços não-formais e informais, sendo, também, facultativa às instituições das redes municipais e privadas.


Comentando sua proposta, o parlamentar admitiu que ela não é suficiente para que haja a conscientização geral a respeito do tema. Entretanto, França entende que a medida vai ajudar no processo para que este tipo de educação se espalhe por São Paulo.


“Ela é uma forma de chamar atenção. Sei que uma semana é pouco perto do que a gente precisa. Porém, se conseguirmos fazer (ações) para o Ensino Fundamental II e o Médio, onde os jovens conseguem ter mais acesso ao telefone e são propagadores de notícias, penso que é caminho adequado”, falou.


O parlamentar disse esperar que sua proposta ajude a tornar os estudantes mais críticos. “A ideia não é que a semana resolva todos os problemas, mas que chame atenção, para termos algo permanente nas escolas estaduais, com os alunos sendo mais inquietos com o que recebem”.


O deputado acredita que seu projeto será aprovado até o próximo mês de outubro. “Hoje, está na Comissão de Educação, mas já temos parecer favorável. O projeto estará pronto para ser votado em um ou dois meses. No plenário, creio que não teremos dificuldade. Estou esperançoso”.


Prefeitura de Santos discute a criação de lei municipal


A vice-prefeita de Santos, Renata Costa Bravo, afirmou que o município debate a criação de uma legislação própria, para que a educação midiática se torne política pública. E, enquanto estudos são executados neste sentido, a prefeitura tenta obter o selo de cidade midiática da Unesco. Caso isto aconteça, o local poderá receber recursos de fora do país.


“Este trabalho está em andamento, e estamos em um estágio avançado. Na América Latina, são cinco municípios midiáticos, Santos pode ser um deles. Além do reconhecimento mundial de nosso trabalho, essa conquista abre espaço para utilizar, na cidade, fundos internacionais de investimentos da Unesco”, explicou.


Buscando avançar neste contexto, a Secretaria de Educação (Seduc) se debruça sobre o tema, tentando implementar a norma. Embora a legislação ainda não tenha sido elaborada, alguns aspectos já estão decididos. Um deles é levar a educação midiática a todas as unidades educacionais.


“Estamos fazendo a discussão da lei municipal e de onde fazer implantação, na grade curricular, da educação midiática”, disse, ressaltando que o Executivo planeja abrir espaço no orçamento, inclusive, para capacitação de professores. “Ao longo deste ano, precisamos deixar estabelecido, para que em 2025, eles participem desta formação”.


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