Mundo da Bola: Receitas para o futebol

A contribuição-mor, como já defendi aqui, seria ordenar um pouco os comentários sobre arbitragem

Por: Vladir Lemos  -  18/04/24  -  06:24
  Foto: Pixabay

Não sei se vocês sabem, mas o jornalismo costuma usar o termo “suíte” quando um assunto que foi notícia na edição anterior volta a ser explorado. O termo vem do francês, idioma no qual suite significa uma série, uma sequência. É o que de certa forma farei aqui ao retornar não exatamente ao tema arbitragem mas ao que a cerca e que, creio, poderia ajudar àqueles que têm a incumbência de soprar o apito.


A contribuição-mor, como já defendi aqui semana passada, seria ordenar um pouco os comentários sobre arbitragem. Não que isso vá livrar os árbitros do purgatório ou de alguma outra seção mais ardente. Quando digo ordenar, falo em tecer considerações a respeito dos lances duvidosos só depois que eles já tiverem sido decididos.


Sei que hoje, em virtude da maneira como as coisas estão se dando, nem bem o lance ocorreu os narradores já estão pedindo que o comentarista de arbitragem se pronuncie. Uma urgência que deveria ser evitada. Ao evitar essa urgência, os narradores forçariam seus parceiros de transmissão à elegância do veredito em tempo oportuno.


Outra coisa que meu viés romântico sugere é livrar os envolvidos no jogo de qualquer interferência externa. O que significa dar um jeito de proibir verdadeiramente qualquer aparato tecnológico. Celulares e afins. Estou ciente de que há muitas ferramentas de análise que dependem da internet, e uma vez que ela entre em campo, danou-se. Mas seria possível. Há filtros. Há recursos. Condenaríamos assim os envolvidos com o jogo a acreditar no que olhos viram e ponto. Como antigamente.


No jogo de ida da recente decisão paulista, me chamou a atenção o tamanho dos monitores instalados nos bancos de reservas da Vila Belmiro. Com ele, mesmo que não venha a narração, vem a câmera lenta, o replay. Todos esses recursos que costumam complicar a nossa interpretação do jogo. Isso me fez lembrar do velho Telê Santana. No início dos anos 90 ele pediu que fossem instalados monitores nos bancos de reservas do Morumbi para auxiliá-lo durante as partidas. Reclamava com razão que a visão dali era ruim. E vejam, disse também que era mesmo só pra analisar os jogos e não para pressionar o juiz. Ainda se chamava árbitro de juiz. Elegante – e prevenido –, pediu que um monitor fosse instalado também para o time visitante. Mas em um jogo do torneio estadual, orientado pelo juiz, o fiscal da Federação mandou que o desligasse. Telê disse que desligaria. E ficou furioso quando voltou e viu que o monitor não estava lá. Não exatamente por ter sido retirado, mas pelo fato de que o fiscal não havia confiado nele. Irritado com episódio no Brasileirão, pegou um walkie-talkie e passou a assistir aos jogos da tribuna, orientando o auxiliar, Muricy Ramalho, que estava à beira do campo. Dois anos mais tarde Washington Rodrigues, treinador do Flamengo, usou do mesmo expediente sem ser molestado.


A visão ao nível do campo é mesmo ruim. Para os repórteres atrás dos gols também. Quando comecei a trabalhar, lembro que todo mundo queria saber da emoção de poder estar ali à beira do gramado. E lembro das caras de desapontamento quando eu dizia dessa visão prejudicada. Enfim, acho que é uma ideia essa blindagem tecnológica e esse atraso nos comentários de arbitragem.


E encerro tomando pra mim o que disse Telê em 1996 quando a Federação finalmente liberou os monitores. Disse ele: “Antes tarde do que nunca”. E completou: “Aos poucos eles vão aceitando minhas ideias”. Já eu não alimento essa esperança. Não tenho essa pretensão.


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