O ambientalista José Bonifácio de Andrada e Silva

Wallace Paiva Martins Junior. Procurador de Justiça, doutor em Direito do Estado e professor de Direito da UniSantos

Por: Wallace Paiva Martins Junior  -  17/04/24  -  06:31
  Foto: Reprodução

José Bonifácio de Andrada e Silva, cognominado Patriarca da Independência, é uma personagem central a que a História do Brasil deve. E muito. Arlindo Salgueiro e José Geraldo Gomes Barbosa têm se encarregado dinamicamente em colocá-lo no seu devido lugar, exibindo urbi et orbe a saga do político, estadista, cientista e poeta. Não bastasse sua atuação decisiva para a independência e a integridade territorial e política do Brasil, em razão de suas pesquisas um mineral foi descoberto - a andradita. Ele ainda figura como uma das estátuas localizada no Bryant Park em Nova Iorque, nos Estados Unidos.


A glória desse genial santista é exponencial: seu nome foi inscrito no Livro dos Heróis da Pátria, que se encontra no Panteão da Liberdade e da Democracia, conforme determinado pela Lei Federal 11.135, de 19 de julho de 2005, fruto de justa propositura da então deputada federal Telma de Souza. Suas obras científicas, políticas e sociais foram coligidas e reproduzidas em livro (com três volumes) por Edgard de Cerqueira Falcão, publicado pela Câmara dos Deputados em 2006.


Reapreciando esse bom arsenal de estudos, constata-se outra faceta de José Bonifácio: a de precursor da defesa do meio ambiente. Para além de sua memória sobre a pesca das baleias, destaco a representação por ele redigida à Assembleia Geral Constituinte e Legislativa do Império do Brasil sobre a escravatura, no exercício de seu mandato como deputado, em que enreda na temática central (abolição da escravatura) potentes considerações ambientalistas e contundentes e incisivas admoestações sobre o modo pelo qual os brasileiros tratavam a natureza no século 19.


Com efeito, comparar a produção agrícola (açúcar) brasileira com a de outros países aponta a eficiência de nações “sem haver necessidade de estragar matas e esterilizar terrenos, como desgraçadamente entre nós está sucedendo”, preconizando o fim desse “péssimo método”, pois a natureza “dá os meios precisos aos fins da sociedade civil”. Vê-se aí não só a preocupação com o uso racional para exploração dos recursos naturais, mas, também, o clamor pela modernidade nas técnicas agrícolas e o despertar para a consciência ecológica.


Nesse memorável paper, sentencia que “a natureza fez tudo a nosso favor, nós, porém, pouco ou nada temos feito a favor da natureza”.


Reclamando da baixa qualidade do cultivo da terra e do mau aproveitamento das minas, diz o patriarca, em tom grave, que “nossas preciosas matas vão desaparecendo, vítimas do fogo e do machado destruidor da ignorância e do egoísmo; nossos montes e encostas vão se escalvando diariamente, e com o andar do tempo faltarão as chuvas fecundantes, que favoreçam a vegetação, e alimentem nossas fontes e rios, sem o que o nosso belo Brasil em menos de dois séculos ficará reduzido aos páramos e desertos áridos da Líbia”. Trata-se de uma crônica que ainda é atual.


“Virá então esse dia (dia terrível e fatal), em que a ultrajada natureza se ache vingada de tantos erros e crimes cometidos”, conclui Andrada. Não se trata de profecia, senão de puro raciocínio científico do intelectual que tinha um projeto para o Brasil, inclusive de desenvolvimento sustentável, antecipando-se centenas de anos ao Artigo 225 da Constituição de 1988.


José Bonifácio de Andrada e Silva foi um dos primeiros ambientalistas desta terra, como observou o professor Vladimir Passos de Freitas. Ele não é o ator coadjuvante do processo de independência brasileira. Melhor posicioná-lo - para justiça na História - como o Founding Father da brasilidade.


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