Novas regras para a saída temporária

Matheus Guimarães Cury*

Por: Matheus Guimarães Cury  -  23/04/24  -  06:26
  Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

No último dia 11 de abril, o presidente Lula sancionou a Lei Federal 14.843/2024, que modificou as regras para a saída temporária, as famosas saidinhas de presos, com veto que pouco repercutirá no projeto de encarceramento em massa, política clara do atual Legislativo.


Apesar de entendermos como equivocada a intenção do legislador em acabar com a saída temporária, o tema central deste artigo não é sobre a conveniência ou não da saída, mas sim sobre o que foi sancionado e o que foi vetado pelo presidente da República.


O projeto inicial proibia a saída temporária para qualquer preso com a finalidade de visitar a família, permitindo-a tão somente para os presos frequentarem cursos profissionalizantes, supletivos, segundo grau, curso superior etc.


O projeto proibia também a saída, independente da finalidade, para os presos condenados por crimes hediondos ou crimes praticados com violência ou grave ameaça à pessoa.


O presidente Lula vetou a proibição da saída que tinha por finalidade a visita à família, mas manteve o texto proibindo qualquer espécie de saída temporária para os presos condenados por crimes hediondos ou por crimes praticados por meio de violência ou grave ameaça à pessoa.


Primeiramente, vale destacar que tal proibição, mesmo com o veto, já atinge aproximadamente 90% da população carcerária, uma vez que cerca de 80% são condenados por tráfico de drogas e roubo e outros cerca de 10% por outros crimes hediondos como homicídio qualificado, estupro, etc., restando apenas cerca de 10% da população carcerária, calcula-se, que continuará tendo direito à saída, pois cumpre pena por crimes comuns.


Lembrando que só tem direito à saída temporária quem está no regime semiaberto, e sempre foi assim. Nunca se permitiu a saída para presos do regime fechado.


Mas, vale destacar, também, que apesar do presidente ter vetado a proibição da saída com a finalidade de visita à família, manteve a revogação do Artigo 124 da Lei de Execução Penal, que regulamentava a saída temporária, como por exemplo máximo de 7 dias por saída, máximo de 5 saídas por ano etc. Ou seja, permite-se a saída temporária, mas agora sem regulamentação legal. Como fica esse vácuo legislativo?


O Artigo 24 da Constituição Federal estabelece que compete concorrentemente aos Estados e à União legislar sobre direito penitenciário, razão pela qual é possível que na ausência de norma reguladora por lei federal, possa cada Estado regulamentar a saída temporária, o que é absolutamente temerário e que poderá gerar, além da insegurança jurídica, diferença no tratamento de presos por região, em evidente afronta à isonomia.


Bem por isso, o atual ministro da Justiça, Ricardo Lewandovski, defendeu uma regulação sobre o tema pelo Conselho Nacional de Justiça, o que seria o mais prudente e correto.


A verdade é que mesmo com o veto do presidente Lula, praticamente acabaram com a saída temporária, uma vez que a maior parte da população carcerária não terá esse direito como já explicado acima.


Dessa forma, nos resta assistir mais uma vez o insucesso de mais uma medida populista que certamente em nada ajudará no controle da criminalidade. Ao contrário, como tem sido a cada endurecimento da lei sem que haja um debate sério, fortalecerá ainda mais as organizações criminosas que se alimentam de jovens encarcerados por mais tempo e em estado de vulnerabilidade. Essa é a triste realidade.


*Matheus Guimarães Cury. Advogado Criminalista associado ao escritório Cury e Moure Simão Advogados, professor de Direito Penal e Prática Jurídica Penal da Universidade Católica de Santos


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