A escolha dos vencedores?

Descontos em tarifas públicas são uma ferramenta não adequada

Por: Rodrigo Paiva  -  21/07/23  -  08:35
  Foto: Max/AT

Os portos são parte de toda a logística de transporte de bens e produtos que fazem parte de nossa vida. Praticamente 90% de tudo que consumimos, em algum momento, utilizaram os serviços de um porto para chegar às nossas casas. No Brasil, existem cerca de 35 portos públicos, administrados por alguma esfera governamental (município, estado ou Governo Federal) por meio de Autoridades Portuárias ou Companhias Docas, e mais de 600 terminais privados autorizados, operados ou em construção diretamente pela iniciativa privada.


Em 2022, cerca de 1,2 bilhão de toneladas de cargas passaram pelos portos brasileiros, sendo que grande parte se relaciona às principais cargas de exportação do País (minério de ferro, petróleo e derivados e grãos). Mas não menos importante é a movimentação de cargas com alto valor agregado, como materiais para a indústria brasileira, eletrônicos e produtos acabados que são movimentados, em grande parte em contêineres, e que devido ao alto valor agregado são de suma importância para a economia e geração de emprego e renda no País.


Somente em contêineres, foram movimentadas pelos portos brasileiros 128,38 milhões de toneladas, equivalentes a 11,7 milhões de TEU (unidades relativas a contêineres de 20 pés de comprimento).


Como praticamente todo produto que compramos possui uma parcela que utilizou um porto, quero abordar uma recente decisão do Governo Federal, que prevê a redução das tarifas públicas dos portos de Santos em até 65% e do Rio de Janeiro em até 95,5%. Como ficam os portos concorrentes em meio a isso? Os descontos em Santos e Rio poderão gerar uma assimetria concorrencial grande, afetando o destino de cargas que atualmente utilizam a infraestrutura do estado catarinense.


A medida vai no sentido contrário do princípio da neutralidade de política tarifária, tão necessária à saudável concorrência entre entes privados, através do qual deve-se garantir a não distorção das relações de mercado, ainda mais em cenário onde as demais autoridades portuárias veem necessidade de aumentos tarifários por razões diversas. É importante ressaltar que este tipo de subsídio traz impactos em portos concorrentes por meio da perda de serviços e/ou redução forçada de tarifas abaixo de patamares razoáveis, com reflexo sobre sua capacidade de investimento em expansão e melhorias de eficiência.


Os demais portos afetados precisam lutar para a reversão desse tipo de política e, sobretudo, enquadrar seus custos de forma a ter uma gestão ainda mais eficiente, visando manter sua competitividade, que não pode vir atrelada a aumentos sucessivos de tarifas, mas ao contrário, pela redução expressiva de custos. Essa política vem na contramão do que se pretende para o setor portuário brasileiro, que é a eficiência, com gestão eficaz e capacidade de investir em infraestrutura.


Descontos em tarifas públicas, mesmo que por meio do uso do caixa gerado pela Autoridades Portuárias, são uma ferramenta não adequada, gerando distorções no mercado e afetando não somente as demais Autoridades Portuárias, mas investidores privados, que acreditaram na isonomia concorrencial quando decidiram operar no setor e agora poderão ver portos e operadores “escolhidos para vencer” por meio de incentivos desproporcionais e em muitos casos desnecessários.


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