As limitações da classe política

Com abaixo-assinados, podem ter despertado para a importância do povo. Mas, sem perceber, admitem potencial limitado

Por: Rafael Motta  -  19/01/24  -  06:34
  Foto: FreePik

Deputados estão apelando a abaixo-assinados para que o Estado ou o Congresso se mexam. Considerando que eles são a instância mais próxima dos governos e das casas que representam, algo está distorcido no papel que devem ter, de representantes do povo.


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Os autores dessas coletas de assinaturas para causas de interesse comunitário expõem a boa intenção de fazer com que a população participe mais da vida coletiva. Em tese, ótimo. Mas fazer subscrição é coisa de quem não tem poder. Parlamentares exercem um deles, que é o Legislativo.


Se vereadores, deputados e senadores apelam para práticas que são uma das últimas saídas a quem não tem poder além do voto, é sinal de que talvez não estejam recebendo a consideração que deveriam do Poder Executivo.


Esse respeito vai além do que determina a Constituição, sobre poderes independentes e harmônicos. Ele consiste em entender a legitimidade do trabalho parlamentar. E, quanto mais correto e honesto for o exercício dele, mais peso terão os atos e as palavras de quem está no Legislativo.


Não se acusa nenhum deputado autor de abaixo-assinado de nenhum ato ilícito. O que se diz é que os legislativos, a começar pelas câmaras municipais, estão afetados por dois problemas. Um deles já está velho e carcomido, mas resiste. O outro se agravou de uns dez anos para cá.


A primeira questão, a velha e carcomida, consiste no clientelismo. Vê-se o parlamentar como um despachante de luxo para questões particulares, como pedidos de emprego e patrocínio a iniciativas de bairro. Quando esse parlamentar faz o jogo, até pode ganhar voto, mas perde prestígio e força.


O problema mais recente é a troca de voto por dinheiro. Já foi, também, por cargos. Continua, mas as fatias orçamentárias que legisladores querem abocanhar para direcioná-las da forma que lhes convém só cresce. Há cidades mudando a legislação municipal para elevar essa porcentagem.


Essa situação, de o Legislativo tomar para si parte da atribuição de investir a verba do contribuinte em serviços que cabem ao Executivo, reduz vereadores, deputados e senadores a instrumentos tanto de ameaça a governos quanto de aceitação ao que governos querem, caso paguem.


Emaranhada na teia da polarização forçada por políticos, parte do eleitorado defende um ou outro por se convencer de que ele representa suas aspirações particulares. Besteira. Políticos que alimentam falsas brigas e, indevidamente, conseguem destaque no noticiário pensam neles.


Considerando a boa-fé de parlamentares que propõem abaixo-assinados, com base na afirmação constitucional de que todo poder emana do povo, entende-se que estes tenham despertado para a importância popular. Mas, sem perceber, admitem estar com o próprio potencial limitado.


Reconhecer essa realidade e aproveitar o poder do qual fazem parte para se rebelar contra ela são passos importantes para que o Legislativo, se realmente o desejar, resgate sua função. E o eleitor dê importância à escolha de seus representantes, sempre atento ao que os eleitos deveriam fazer.


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