O amor não pode ser esquecido

Cuidar de quem nos cuidou é mais do que um dever humano e legal, é um ato de gratidão e justiça

Por: Paulo de Jesus  -  24/02/24  -  06:55
Os idosos de hoje, em sua fragilidade, são os mesmos que nos guiaram com sabedoria em nossa juventude
Os idosos de hoje, em sua fragilidade, são os mesmos que nos guiaram com sabedoria em nossa juventude   Foto: Divulgação/Pixabay

Em meio ao turbilhão da vida moderna, um eco de lamentação ressoa nos cantos esquecidos de nossas consciências. O tema do abandono de incapaz, que costumeiramente evoca imagens de vulnerabilidade infantil e deficiência, ecoa com uma tristeza especial quando se volta para os idosos, frequentemente relegados ao esquecimento. É com pesar que observamos a inversão cruel da lógica: aqueles que um dia foram nossas referências, agora são silenciosamente deixados à própria sorte. Cuidar de quem nos cuidou é mais do que um dever humano e legal, é um ato de gratidão e justiça.


Numa sociedade que frequentemente enxerga a figura do incapaz como sinônimo de criança ou pessoa com deficiência, os idosos se perdem no meio desse olhar seletivo. O arcabouço legal que protege os incapazes muitas vezes se torna uma mera formalidade, enquanto os mais velhos enfrentam um abandono silencioso. Esquecemos que os idosos de hoje, em sua fragilidade, são os mesmos que nos guiaram com sabedoria em nossa juventude.


Infelizmente, a inversão de papéis na vida nos coloca diante de uma realidade angustiante. Enquanto, em nossa infância, éramos os protegidos e orientados pelos idosos, a terceira idade traz consigo a cruel inversão: agora somos nós que devemos cuidar de nossos parentes com mais idade. O lamento ressoa na constatação de que muitos esquecem desse dever moral e legal, relegando os que nos deram amor e orientação ao abandono emocional e físico.


Não podemos ignorar a dimensão criminosa do abandono de incapaz, codificada no artigo 133 do Código Penal. Este crime, que deveria evocar repúdio coletivo, muitas vezes permanece oculto nos cantos escuros da negligência e da omissão. No caso dos idosos, o Estatuto do Idoso, especialmente nos artigos 98 e 99, busca oferecer uma camada adicional de proteção legal, mas muitas vezes essa legislação é ignorada diante do descaso.


A desnutrição, desidratação, falta de higiene e a ausência de acompanhamento médico são apenas alguns dos horrores que configuram o abandono de incapaz, uma triste realidade que muitos idosos enfrentam diariamente. Nesse cenário de negligência, todos nós nos tornamos cúmplices ao permanecermos em silêncio diante da dor silenciosa dos mais velhos.


Diante de qualquer suspeita de abandono de incapaz, a recomendação é clara: acionar as autoridades imediatamente. A queixa silenciosa dos idosos exige uma resposta urgente, um despertar de nossa consciência coletiva para a responsabilidade que temos em garantir que aqueles que um dia nos guiaram com amor e sabedoria não sejam deixados à margem do esquecimento e do abandono.


Ao final, é inevitável confrontar a triste realidade do abandono de incapaz, particularmente quando se trata de nossos parentes idosos. A inversão de papéis deveria ser acompanhada por uma inversão de compaixão e responsabilidade. É essencial que despertemos do torpor da indiferença, agindo de maneira diligente para evitar que a sociedade continue a silenciar aqueles que nos deram tanto. O cuidado com os idosos não é apenas um dever legal, mas uma expressão de nossa humanidade.


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