Racismo não é uma questão política, é moral

Episódio na travessia de balsas levanta mais questões sobre racismo no país

Por: Júnior Bozzella  -  31/01/22  -  06:32
Racismo estrutural presente na sociedade
Racismo estrutural presente na sociedade   Foto: Reprodução/ Pixabay

Na última semana um assunto tomou conta do noticiário regional e nacional. Um homem negro, de 36 anos, foi abordado por Policiais Militares enquanto fazia a travessia da balsa Santos-Guarujá. O motivo da abordagem? O homem dirigia um carro considerado de alto padrão.


Não houve na ocasião qualquer infração ou indício de irregularidade cometida por Jean William, que é um tenor com uma longa trajetória em palcos no exterior e já chegou a se apresentar até para o papa Francisco. A justificativa para os policiais que o abordaram foi o fato de ele ser um homem negro dirigindo um carro de luxo.


Segundo William, o policial, na companhia de outro colega, apontou uma arma e ordenou que ele saísse de seu carro, questionando o cantor, aos gritos, se o carro era dele, se ele já tinha sido preso e se levava drogas no veículo. Depois de revistarem todo o carro os policiais encontraram apenas duas cadeiras de praia, que era o que ele carregava consigo.


Constrangido, intimidado e sem compreender o que levou a tal abordagem, Jean William precisou esclarecer para os policiais e para os curiosos que estavam na balsa que ele não era um bandido, que era o proprietário do veículo e que não tinha cometido nenhuma infração ou feito nada de errado. Que ele era apenas um homem negro dirigindo o seu próprio carro como qualquer cidadão comum.


Infelizmente, o tenor Jean William é mais um nome em meio a uma triste estatística. Um levantamento realizado pelo Instituto Locomotiva, em parceria com a Central Única de Favelas (Cufa), aponta que 50% dos negros sofreram algum tipo de situação de violência policial no Brasil, enquanto 4 em cada 10 brasileiros de periferia relatam ter sofrido algum constrangimento do tipo.


Os dados mostram que 29% dos brasileiros adultos declararam ter sofrido algum tipo de constrangimento durante uma abordagem policial. O percentual assusta, pois levando em conta a população do nosso país o número de 49 milhões de brasileiros expostos a situações como essa é maior do que a número de habitantes de grande parte dos países do mundo.


Ainda de acordo com a pesquisa, 50% dos negros ouvidos afirmaram que já passaram por situações de constrangimento em uma abordagem policial, como desrespeito, agressão verbal, agressões físicas, extorsão, pedido de dinheiro ou de suborno. Se considerada a classe social, o levantamento atesta que os homens negros pobres estão mais expostos ao desrespeito policial do que os homens brancos pobres. Os números mostram que 64% dos homens negros das classes C, D e E já foram abordados alguma vez pela polícia.


O racismo é um câncer da sociedade brasileira que precisa ser extirpado. Não consigo deixar de me indignar em ver situações como essa. Em que ponto da nossa história um negro dirigir um carro de luxo virou crime? Não dá para culpar apenas os policiais. A questão é mais grave, o racismo no Brasil é um problema estrutural. Infelizmente, as políticas públicas e as práticas institucionais, juntamente com a ideologia e valores daqueles que estão no Governo Federal, ocupando a hierarquia máxima da República só reforçam esse cenário repugnante. Racismo não é uma questão política, é uma questão moral e perpetuar desigualdades raciais é um gesto criminoso, que não pode ser tolerado, e deve ser combatido com Maximo rigor!


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