Porto de Itajaí: o passado pode iluminar o futuro

É difícil até calcular a perda de valor do ativo catarinense nos últimos anos

Por: Frederico Bussinger  -  20/06/23  -  06:38
  Foto: Divulgação

No 1º trimestre deste ano, 118 TEU passaram pelo Porto de Itajaí. Você não leu errado: uma centena! Para quem chegou a cerca de 700 mil por ano (2006-2008) e mais de meio milhão na pandemia, é algo irrisório, não? Como explicá-lo? A hipótese mais imediata seria uma retração de mercado. Mas não: o complexo portuário (porto público mais 6 TUPs) que compartilha da mesma infraestrutura aquaviária e mercado relevante cresceu 36% nos últimos cinco anos (pico de 48%). E a Portonave à frente: saltou de 60% para 77% dos mais de 1,5 milhão de TEU/ano (2019-2022). E, neste 2023, para 99,95%!


Não seria, então, atribuível à diferença de desempenho, de competência dos operadores? Ou seja: a TiL, no caso do TUP Portonave, e a APM, no caso do arrendamento Itajai. A considerar: ambas são empresas privadas, estão entre os 10 maiores operadores portuários de contêineres do mundo e operam em dezenas de países dos cinco continentes. Pertencem aos mesmos grupos econômicos dos dois maiores armadores do mundo: MSC e Maersk. Portanto, tampouco deve ser essa a explicação. Como a movimentação de contêineres em Itajaí cresceu três vezes entre a assinatura do arrendamento e o início da operação da Portonave e quase seis vezes desde a municipalização (1997), deve-se também afastar a hipótese de incompetência da gestão (pública) municipal.


Assim, para explica-lo, o espectro de hipóteses precisaria ser ampliado para incluir, por exemplo: a) enchente de novembro de 2008: sabe-se que o Rio Itajaí-Açu, via de acesso a ambos os terminais, enfrenta cheias periódicas. Mas, como sentenciou a justiça, com base em laudo pericial, “alteração da hidrodinâmica do Rio Itajaí, em razão da construção do Portonave, que constitui aspecto essencial para os efeitos da enchente sobre os berços do Porto de Itajaí” (TRF-4). Ou seja: os impactos dela foram diferenciados sobre os terminais. Itajaí, em 2009, teve redução de 59% na movimentação, enquanto a Portonave registrou aumento de 82%; b) obstaculização do processo de renovação antecipada do contrato da APM, de licitação de um novo terminal de contêineres no Porto de Itajaí, em 2012, conforme constatado pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em auditoria operacional de 2019/2020; bem como implementação das expansões previstas no PDZPI de 2019; c) demora na renovação da delegação (vencida no final de 2022), processo que se arrastou mais intensamente desde 2017; d) principalmente, a heteronomia, assimetria entre as condições de exploração: TUP (Portonave) x arrendamento (Itajaí).


Em maior ou menor grau, dentre outros, esses fatores certamente contribuíram tanto para a diferença de performance dos dois terminais ao longo dos últimos 15 anos como pela decisão da APM de descontinuar sua atuação em Itajaí a partir de 1º de julho. No que concerne à APM, operando desde 2016/2017 no vizinho Porto Itapoá, como subproduto da compra da Hamburg Sud pela Maersk, fica a dúvida sobre seus planos futuros. Já a Portonave recebeu licença ambiental para uma nova ampliação do terminal que lhe permitirá, a partir de 2025, receber navios de até 350 metros de comprimento.


É difícil até calcular a perda de valor do ativo Porto de Itajaí, desde quando tinha aquele invejado terminal de contêineres no início do século (talvez algo que o TCU possa dimensionar em sua próxima auditoria operacional, prevista para o segundo semestre). Como referência: em 2017, 50% da Portonave foi vendida por R$ 1,36 bilhão.


E talvez mais importante: quando o Governo Federal anuncia a intenção de firmar uma nova delegação com Itajaí (25 anos), e de fazer licitação para arrendamento (35 anos) das instalações outrora ocupadas pela APM, uma análise mais minuciosa desse processo, suas relações causais e prognósticos, seria da maior importância para orientar a definição da modelagem do arrendamento e de eficaz governança do complexo portuário.


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