Qualificação médica

Mudanças em regras tão específicas devem, sempre, ter o envolvimento e a participação de todos os envolvidos

Por: ATribuna.com.br  -  30/04/24  -  06:38
  Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O Ministério da Saúde, que já é alvo de críticas pela epidemia de dengue, está comprando uma nova briga, e agora com a quase totalidade da classe médica, incluindo as entidades setoriais. O Decreto 11.999 altera o plenário da Comissão Nacional de Residência Médica (CNRM), que faz a regulação e supervisão dos programas de residência existentes no País. O decreto foi assinado pelo presidente da República em exercício dia 17 deste mês, Geraldo Alckmin. A CNRM desempenha diversas funções essenciais para o funcionamento e qualidade dos programas de residência médica no Brasil. Suas atribuições principais incluem credenciamento de instituições, autorização de programas de residência, reconhecimento do programa e renovação do reconhecimento. São tarefas ligadas à boa formação de médicos para o mercado de trabalho após a conclusão do ensino regular, oferecido em seis anos.


O decreto muda a ocupação das cadeiras em posição de decisão, ampliando para três membros do Ministério da Saúde e três do Ministério da Educação. Dessa forma, decisões divididas no plenário terão sempre a votação em bloco desses seis membros indicados pelo Governo, o que garante maioria. A mudança é polêmica e desagradou severamente todas as entidades da classe médica. Para promover o diálogo e a tomada de decisões na área, a CNRM realiza plenários nos quais são debatidas propostas e questões relacionadas à residência médica. Esses encontros fornecem um espaço importante para discussões que influenciam diretamente a formação dos profissionais de Medicina no País. Se o Governo terá, agora, ampla maioria, fica fácil entender o motivo das queixas. Um agravante adicional previsto no decreto acirra ainda mais a indignação da classe médica: as decisões caberão à Câmara Recursal, composta por três membros, dos quais dois do Governo.


A formação em Medicina há muito vem sendo colocada em xeque, especialmente pela proliferação de faculdades no País, em que o primeiro critério de seleção é o valor das mensalidades. É fato que o acesso ao curso de Medicina deve ser ampliado aos jovens em idade de escolher a profissão, seja pela via das faculdades públicas, seja pelo financiamento estudantil, mas essa oferta maior não pode representar abertura desenfreada de escolas e vagas, sem o devido reconhecimento de qualidade do corpo docente, infraestrutura física e programa eficiente para o internato. A residência está na esteira da qualificação, é o momento em que o jovem médico receberá o título de especialista e poderá ingressar com mais propriedade no mercado de trabalho.


É fundamental que qualquer mudança nas regras que regem os programas de residência tenha o debate transparente e amplo com as entidades de classe e até mesmo com o setor hospitalar, em tese, o local que recebe e emprega essa mão de obra. Impor mudanças de forma unilateral não parece conversar com um governo democrático e aberto ao diálogo. É tempo de revisitar o decreto.


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