Doutor sem emprego

IBGE aponta aumento da população com ensino superior completo que está desempregada, desalentada ou trabalhando menos do que gostaria

Por: Da Redação  -  16/11/19  -  18:54

Dados do IBGE revelam que a parcela da população com ensino superior completo que está desempregada, desalentada ou trabalhando menos do que gostaria passou de 930 mil para quase 2,5 milhões entre o segundo trimestre de 2014 e o mesmo período deste ano, incluindo-se tanto trabalhadores com carteira assinada como aqueles que atuam de modo informal.


Deve-se considerar que boa parte desse efeito negativo se deveu à recessão econômica de 2014-2016, que fez a taxa de desemprego dobrar entre 2014 e 2018, e que houve também expansão da quantidade de pessoas que conseguiram diploma universitário no Brasil ao longo dos últimos cinco anos. 


Não há dúvida que os profissionais de nível superior vêm enfrentando dificuldades crescentes para ingressar ou manter-se no mercado de trabalho. Quando é considerado o emprego formal, a precarização é um fato: muitos têm sido obrigados a aceitar vagas que exigem menos anos de escolaridade e menor qualificação. Entre 2013 e 2018, o mercado de trabalho formal absorveu quase 1,7 milhão de trabalhadores com diploma universitário, mas 318 mil deles aceitaram postos em uma das 50 ocupações que mais empregavam trabalhadores com ensino fundamental completo ou médio incompleto no início do período analisado.


Há nítido descasamento entre qualificação e ocupação no País. Estudo da pesquisadora Ana Tereza Pires revelou que o percentual de indivíduos com nível superior ocupando cargos de nível médio ou fundamental cresceu de 25% em 2014 para 29,5% em 2019. 


Embora a crise tenha papel relevante nesse quadro, deve ser salientado que existe claro descompasso entre a formação universitária e a demanda de profissionais pelo mercado. As transformações tecnológicas são profundas e a maioria das instituições de ensino superior não consegue responder a elas. O Brasil tem hoje falta de trabalhadores em diversas áreas, que normalmente exigem qualificação que não é proporcionada.


Existe distância entre as empresas e as universidades. Estas são lentas para acompanhar as transformações, e oferecem cursos tradicionais, voltados para profissões que caminham para a extinção, saturando o mercado com pessoas que não conseguem obter empregos. Estudos mostram que 85% das profissões que existirão em 2030 ainda não existem. Nesse ambiente, o profissional do futuro será essencialmente polivalente, e precisa ser formado em ambiente multidisciplinar, que o capacite a enfrentar problemas e desafios crescentes. 


O ensino, de maneira geral, precisa ser repensado no Brasil. Não há mais sentido em oferecer disciplinas estanques e isoladas nos cursos fundamental e médio, nem formar, nas universidades, profissionais com habilidades específicas, limitadas a um determinado campo do conhecimento, exigindo novas abordagens e perspectivas. 


Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
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