Caso Marielle e suas implicações

Investigações poderiam ser levadas para outras regiões, pois relações de poder não se dão apenas no Rio de Janeiro

Por: ATribuna.com.br  -  27/03/24  -  06:28
  Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Além da importância de fazer justiça, revelando e punindo os mandantes dos assassinatos de Marielle Franco e Anderson Gomes, a solução do caso poderá ter contornos mais amplos. O principal deles, como lembrou o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, seria aprofundar o combate ao crime organizado. A investigação conduzida pela Polícia Federal mostra como grupos políticos podem corromper a polícia e por meio da violência impor suas vontades e fechar negócios.


Os crimes que resultaram nas mortes da vereadora carioca e do motorista dela foram desvendados a partir de delação premiada que, associada a provas, permitiu avançar rapidamente com a investigação em pouco mais de um ano, sendo que nos cinco anos anteriores esse trabalho patinou por interferência de autoridades superiores.


No último domingo foram presos os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão, respectivamente conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) e deputado federal (ex-União, que o expulsou). A PF também deteve o delegado Rivaldo Barbosa, apontado como o responsável por atrapalhar a investigação antes dela ser federalizada. Aliás, ele foi nomeado para a função um dia antes do atentado, que ocorreu em 14 de março de 2018 no Centro do Rio de Janeiro. Na prática, apontou a PF, seu cargo trouxe a garantia da impunidade aos mandantes (a defesa alega que ele não obstruiu; o defensor de Chiquinho diz que o deputado é inocente).


Neste caso, há o elo também dos milicianos, com o PM reformado Ronnie Lessa, que de fato matou Marielle e Anderson com a ajuda do ex-PM Élcio Queiroz. Lessa e Queiroz foram presos em 2019. Segundo os investigadores, quando Lessa notou que estava sozinho, como um arquivo vivo, ele ofereceu a delação, entregando os mandantes. Depois, a PF concluiu que a motivação foi a grilagem de terras na zona oeste do Rio, reduto político dos Brazão e controlada pela milícia. O estopim teria sido a oposição de Marielle a um projeto de regularização fundiária, em 2017, que deixou Chiquinho furioso. A proposta foi aprovada, mas acabou sendo anulada pela Justiça.


A partir de agora, fica a dúvida se esse caso vai permitir conhecer com profundidade os laços entre políticos com o crime organizado e os jogos de interesses, com sucessivas reeleições em troca, por exemplo, do verniz da regularização das atividades econômicas ilegais. Ampliando essa expectativa, as investigações poderiam ser levadas para outras regiões do País, pois com certeza essas relações de poder não se dão apenas no Rio. Esse movimento é da maior importância, pois as facções estão em expansão em boa parte do País, com o risco de conexões promíscuas com autoridades policiais e políticas ficarem cada vez mais aprofundadas. E garantindo o que alguns especialistas chamam de condição de máfia, quando o crime está muito bem inserido nos órgãos governamentais e ficam blindados.


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