As mudanças no primeiro escalão do Governo, ventiladas aos poucos na imprensa e confirmadas, no início da noite de ontem, em uma lacônica nota da Secretaria de Comunicação Social, são mais chamativas pela quantidade — seis em um dia — do que por uma eventual mudança nos rumos políticos e ideológicos do Palácio do Planalto.
Das nomeações, a mais surpreendente parece ter sido na Secretaria de Governo. Deputada estreante pelo PL do Distrito Federal, Flávia Arruda atuará na articulação política do Planalto: será o centrão no cérebro palaciano. O general Luiz Eduardo Ramos, antes nesse posto, foi transferido para a Casa Civil, mais gerencial que de diálogo.
A surpresa, contudo, não se sobrepõe à relevância da demissão do ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva. Em nota divulgada pela assessoria do ministério, ele escreveu que “preservei as Forças Armadas como instituições de Estado”.
É mais que uma platitude. Denota sinais autoritários no Governo ou em seu entorno, reprimidos com o uso da Constituição. Na Carta, Exército, Marinha e Aeronáutica estão “sob a autoridade suprema do presidente da República” e (ou porém) destinam-se “à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”. Isto não deveria constituir paradoxo.
O substituto de Silva, também general da reserva Walter Braga Netto, é mais próximo ao presidente Jair Bolsonaro e, até ontem, era o titular da Casa Civil. Agora, as Forças responderão a esse militar, abaixo do presidente. Que garanta água fria às fervuras presidenciais.
Veja-se, agora, a evolução do ministério da Justiça e Segurança Pública. O ex-juiz federal Sergio Moro, ícone da Operação Lava Jato, foi sucedido por André Mendonça, então advogado-geral da União e que volta ao posto com a nomeação de um policial federal: o delegado Anderson Gustavo Torres, secretário de Segurança Pública do Distrito Federal e amigo do senador Flávio Bolsonaro, filho mais velho do presidente. Flávio já esteve às voltas com a Polícia Federal, a ponto de Moro ter saído do Governo por alegar tentativa de interferência na PF sem sua anuência.
Ligado a outro filho do presidente, o deputado federal Eduardo Bolsonaro, assumirá o Ministério das Relações Exteriores o diplomata Carlos Alberto Franco França, de discreta carreira. O antigo chanceler, Ernesto Araújo, passará à história como um mero tarefeiro do presidente. Sob ordens deste, deteriorou a imagem do País ao abandonar, justamente, a diplomacia no equilíbrio ao dialogar com as duas maiores potências deste início de século: Estados Unidos (em uma vexatória submissão ao então presidente Donald Trump, depois rejeitado nas urnas) e China (ao subscrever picuinhas com o maior parceiro comercial do Brasil).
A despeito das evidências, é de se esperar que os seis novos ministros representem mais do que a troca de meia dúzia de antigos titulares.