Juros baixos na pandemia

O problema é que no Brasil, com todas as suas deficiências, as boas notícias não acontecem de forma simultânea

Por: Da Redação  -  24/06/20  -  11:49

O impacto avassalador do novo coronavírus na saúde e, no âmbito da economia, no caixa das empresas e no mercado de trabalho, centraliza as atenções. Entretanto, a covid-19 traz outro efeito importante, mas que é positivo: a queda dos juros básicos, a taxa Selic. Na quarta-feira passada, o Banco Central reduziu a Selic de 3% ao ano para 2,25%, indicando que em agosto poderá fazer um último corte, para menos de 2%. O objetivo claro é por meio da política monetária reduzir drasticamente o custo do dinheiro para estimular a economia sufocada pela pandemia.


A ação do BC é limitada, porque os efeitos de uma calibragem dos juros leva por volta de seis meses para chegar ao mercado e também porque as taxas cobradas do consumidor final ou da pequena empresa pelos bancos são bem mais elevadas. Entretanto, o consenso dos economistas é de que a crise vai atravessar o próximo semestre, com reflexos em 2021. Por isso, a medida tem sua importância, pois prepara o terreno para o pior que está por vir. 


A queda dos juros não está toda relacionada à pandemia. Seu recuo tem sido gradual desde o impeachment da presidente Dilma Rousseff, quando a Selic atingia 14,25%. No ano passado, a taxa já estava a 6,5%. Nesse período, o governo foi surpreendido por um efeito benéfico da diminuição dos juros básicos, que é o impacto deles na dívida pública – a ponto do ministro da Economia, Paulo Guedes, conseguir um rombo bem menor do que o esperado nas contas federais, que no ano passado fecharam em astronômicos R$ 4,2 trilhões. Esse endividamento não paga o mesmo percentual da Selic – varia conforme o comprador dos títulos e do prazo do vencimento dos papéis, mas de qualquer forma esse custo é influenciado pela taxa básica.


Além da esfera do governo, a queda dos juros, ainda que eles tenham uma pequena elevação no próximo ano – eventual subida dependerá do comportamento da inflação – influenciará todo o comportamento da sociedade, da pessoa física à jurídica. A começar pelo cidadão com recursos aplicados. Antes, na prática, ele indiretamente dependia do País não dar certo, porque os juros altos acabavam melhorando seus rendimentos no banco. Toda essa rentabilidade também estimulava o setor bancário a não cumprir seu objetivo principal, que é emprestar dinheiro. Para que correr risco de calote se os títulos públicos garantiam retornos elevados e seguros? Já as empresas, sem crédito barato, pensavam duas vezes em investir. Agora, o poupador precisa melhorar seus rendimentos em áreas mais arriscadas, como a bolsa, onde mais companhias podem abrir seu capital, obtendo recursos sem os juros bancários.


O problema é que no Brasil, com todas suas deficiências, as boas notícias não acontecem de forma simultânea. Essa política benigna dos juros ocorre em meio a uma pandemia que desemprega e impossibilita o consumo. Pelo menos, o conforto é que poderá atenuar os sofrimentos resultantes da recessão.


Tudo sobre:
Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
Ver mais deste colunista
Logo A Tribuna
Newsletter