A vitrine do País

Desvio, desperdício e roubo de recursos públicos podem piorar se ética, investigação e punição não forem estimulados

Por: Da Redação  -  24/12/20  -  10:48

O trágico fim do mandato de Marcello Crivela (Republicanos) à frente da Prefeitura do Rio de Janeiro, no qual o eleitor da capital fluminense é o grande prejudicado, mostra uma necessidade de defender com todas as forças os meios que se tem hoje para investigar e combater os abusos na política. Crivella, que na terça-feira foi preso preventivamente e teve horas depois a medida relaxada para domiciliar com tornozeleira, é acusado pelo Ministério Público de formar o “QG da propina”. A organização criminosa, diz o MP, movimentou pelo menos R$ 53 milhões, com pagamentos feitos a 20 empresas de fachada em nome de laranjas. A cada mês, de R$ 1,5 milhão a R$ 2 milhões eram drenados das contas públicas do Estado do Rio para os bolsos dos participantes da quadrilha. O que impressiona é que depois das primeiras operações policiais até setembro, quando se expôs suposto envolvimento de Crivella, o grupo continuou em ação como se tivesse carta branca para depenar os cofres da Prefeitura do Rio. 


Para o cidadão do Rio, a prisão não é surpreendente, porque o cerceamento da liberdade do alto escalão do Executivo e do Legislativo, ambos tanto na esfera estadual como municipal, atingiu praticamente todos os últimos mandatos. O noticiário mostra que a contaminação da política fluminense pela corrupção se espalhou por múltiplas conexões, como transporte pública, prestadores de serviços da saúde e empreiteiras. Há ainda, conforme o MP, uma onda de esgotamento da verba pública por meio da ocupação de cargos e, no Legislativo, de apadrinhados fantasmas ou com presença esporádica para retroalimentar o esquema de desvio de salários para o bolso do parlamentar. Essa prática é antiga e parece estar presente em muitos cantos do País, mas as investigações estão mais adiantadas em Alagoas e no próprio Rio, inclusive levantando suspeitas sobre o então deputado estadual, agora senador Flávio Bolsonaro (ele nega). 


Tais escândalos mostram seu impacto evidente na segurança. Sem recursos, no Rio, o governo está cada vez mais ausente dos serviços sociais, como saúde e educação, e os bolsões de pobreza acabam rendidos pelos criminosos, seja via tráfico ou milícia – e ainda a milícia que trafica. Hospitais e escolas decadentes, mortes por balas perdidas, violência policial e salários públicos atrasados completam a bola de neve da tragédia social do Rio. 


Entretanto, erra quem acha que está em situação melhor por não morar no Rio. As condições para o martírio de lá são as mesmas das outras regiões do País, só que ampliadas. A coalizão partidária que compartilha cargos para formar bases no Legislativo abre a porta para a corrupção, assim como as licitações têm muitas brechas e os inúmeros recursos retardam o Judiciário. Por isso, desvio, desperdício e roubo de recursos públicos podem piorar ainda mais se a ética e os meios de investigação e punição não forem estimulados. 


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