Problemas como greve e condições climáticas atrasam navios e geram prejuízos no Porto de Santos

Empresários criticam sobrestadia e falta de infraestrutura em Santos; em janeiro, 85% das embarcações de café atrasaram

Por: Bárbara Farias  -  18/02/24  -  09:27
Os atrasos de porta-contêineres que transportam café atingiram o maior número em um ano, segundo o levantamento feito pelo Cecafé
Os atrasos de porta-contêineres que transportam café atingiram o maior número em um ano, segundo o levantamento feito pelo Cecafé   Foto: Vanessa Rodrigues/AT

Nos portos, tempo é dinheiro e quanto maior for a espera para embarque ou desembarque de carga, mais cara é a sobrestadia (também chamada de demurrage e detention). Ainda assim, uma série de fatores vem atrasando as operações no Porto de Santos. Os problemas vão de condições climáticas até a falta de infraestrutura de acesso. Mais recentemente, a greve dos auditores fiscais, que paralisou o desembaraço de mercadorias por três semanas, contribuiu para a situação.


A dimensão dos atrasos de navios no cais santista é atestada em estudo logístico feito pelo Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé). Segundo a entidade, os atrasos de porta-contêineres que transportam café atingiram 85% em janeiro deste ano, maior número registrado em 12 meses - desde que o levantamento começou.


Segundo o diretor técnico do Cecafé, Eduardo Heron, os atrasos resultam em altas despesas aos exportadores, que precisam pagar pelo tempo de armazenagem adicional. Ele diz que há uma série de problemas, como a falta de precisão na ETA, sigla em inglês para a hora estimada da chegada do navio ao terminal.


“As empresas iniciam seus processos logísticos a partir da indicação do ETA do armador. E na hora de devolver a carga (quando o navio atrasa), os terminais ficam impedidos de receber porque estão com seus pátios cheios, também pelos atrasos dos navios”.


Para Heron, o aspecto regulatório é fundamental para evitar cobranças indevidas aos exportadores, mas o principal envolve a infraestrutura portuária. “Os terminais estão com a capacidade quase que totalmente ocupada. Outra questão importante é a logística de entrada e saída de carga, que deveria ser mais rápida no Porto de Santos. Hoje, há um custo elevadíssimo por ineficiência portuária”.


De quem é a culpa?

O advogado especialista em Direito Marítimo, Portuário e de Regulação Osvaldo Agripino explica que, apesar de existir uma norma que regule a cobrança de sobrestadia, os exportadores são obrigados a recorrer contra os pagamentos. Ele deu exemplo.


“Um exportador embarcou os contêineres dentro do prazo fornecido pelo armador e o navio atrasou no Porto. Isso gerou uma detention (paga ao armador) de R$ 222 mil para 82 contêineres e multa de


R$ 2,2 milhões. Recorremos à Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) e conseguimos uma liminar suspendendo a cobrança e a multa, que ainda estão em análise na agência”, explica.


O especialista ressalta que existe norma determinando que não se pode cobrar armazenagem adicional, quando o atraso não foi causado pelo usuário.


Agripino diz que a carga é quem paga a conta de tudo. “O usuário não pode pagar por aquilo que não foi causado por ele. Ocorre que qualquer custo e ineficiência é jogado para o usuário, o que vai se refletir na economia brasileira, na prateleira do supermercado”.


Mais problemas

O diretor de Investimentos em Terminais da Terminal Investment Limited (TiL) e presidente do Conselho de Administração da Brasil Terminal Portuário (BTP) e da Portonave, Patricio Junior, afirma que a falta de berços de atracação para atender à demanda de navios é um dos principais gargalos.


“Devido à falta de berços, o Porto de Santos reduziu a capacidade de atender navios. Os números de ocupação dos pátios de terminais, de utilização de berços, de espera de navios na barra para atracar e os preços em geral de todo o sistema logístico portuário estão aumentando”.


Patricio Junior diz que o volume de TEU (unidade padrão de contêiner de 20 pés) aumenta ano a ano, mas não há novos berços desde a chegada da BTP e da DP World a Santos.


“Além disso, a Libra deixou de existir. No lugar, em vez de um terminal de contêineres, opera-se granel. A BTP e a Santos Brasil continuam tendo três berços cada, a DP World dois ou três e a Libra tinha mais dois ou quatro que não existem mais”.


O executivo parte de três premissas para o equacionamento desse gargalo logístico. “É necessário investir em planejamento, acessos e industrialização”.


Patricio Junior frisa, ainda, que o STS10 (área de 601.102 m2 no Saboó) aumentaria a oferta de atracadouros no cais santista. “Há quatro anos, eu estive com o Tarcísio de Freitas (atual governador), que era ministro de Infraestrutura, e mostrei a ele como ficaria a BTP mais o STS10. E alertei: Santos está crescendo e vai faltar berço. Mas nada aconteceu”.


Autoridade Portuária diz que operadores privados devem investir
Autoridade Portuária diz que operadores privados devem investir   Foto: Vanessa Rodrigues/AT

APS nega filas e afirma que ampliação cabe aos terminais

A Autoridade Portuária de Santos (APS) informou, em nota, que a atracação de navios no Porto de Santos está normal. “Alterações de escalas de embarcações são naturais e não significam atrasos, uma vez que decorrem de diversos fatores: conveniência dos operadores marítimos e portuários, clima, desembaraço documental, dentre outras situações menos comuns”.


De acordo com a APS, em 2023 ocorreram 5.452 atracações, que resultaram, em média, em 15 a 16 atracações por dia, cerca de 460 por mês. “A única interferência na navegação é o clima, mas, quando a praticabilidade não está afetada, não há atrasos na saída de navios”.


Quanto à expansão da oferta de berços de atracação, a gestora do Porto de Santos ressaltou “que as cargas são movimentadas por operadores privados” e que responde apenas “pela infraestrutura pública” do complexo.


Movimentação

A APS mencionou ainda que, em 2022, foram movimentados em torno de 5,7 milhões de TEU e que os terminais de contêineres têm investido no aumento de suas capacidades operacionais. “No final de 2022, a Santos Brasil homologou a ampliação de seu cais em mais de 220 metros, com previsão de aumentar a capacidade do terminal para 2,4 milhões de TEU/ano. Em 2023, a DP World aumentou o cais em 200 metros, ampliando a capacidade em 200 mil TEU/ano. Desta forma, a projeção da APS é de que, até 2030, as atuais condições atendam perfeitamente o movimento e o crescimento previsto”.


Por fim, a APS disse que a capacidade de movimentação de contêineres será beneficiada “com o encerramento de uma disputa de mais de dez anos”, referindo-se à transferência do terminal da Marimex, de Outeirinhos, para a área do antigo Teval, na entrada de Santos. A mudança de local é devido à instalação de uma pera ferroviária que atenderá aos terminais de grãos.


Ainda de acordo com a APS, “este terminal retroportuário ficará próximo ao terminal de contêineres da BTP, que teve o arrendamento da área prorrogado por mais 20 anos após o término da vigência atual (até 2047). Com a prorrogação, está previsto o adensamento de área e a obrigatoriedade de investimentos por parte da arrendatária, para aumentar sua capacidade de movimentação”.


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