Milton Lourenço: Cabotagem: uma nova perspectiva

Diante de tantos problemas, a cabotagem até hoje não conseguiu se fixar como opção confiável, o que tem representado um grande prejuízo para o País; novas incrementação podem mudar este cenário

Por: Milton Lourenço  -  07/03/20  -  23:33
Cabotagem: uma nova perspectiva
Cabotagem: uma nova perspectiva   Foto: (Ilustração: Padron)

Para estimular a cabotagem, incrementando o transporte de cargas entre os portos nacionais, o Ministério da Infraestrutura está enviando ao Congresso um projeto que prevê ampla abertura desse mercado a empresas estrangeiras. Mas, a princípio, deverá ser exigido que as empresas que queiram operar com navios estrangeiros no País tenham um “lastro” em embarcações brasileiras. Segundo o Ministério da Infraestrutura, o grupo econômico que quiser participar do modal poderá usar embarcação estrangeira sem suspensão da bandeira (ou seja, sem precisar se submeter às regras brasileiras), numa proporção de 50% do total da capacidade das embarcações próprias. 


Com mais de 9 mil quilômetros de costa, é incompreensível que o Brasil nunca tenha se preocupado em desenvolver também o seu sistema de cabotagem. Até porque, ao contrário dos países do Hemisfério Norte, tem a vantagem de desfrutar de condições favoráveis de navegação durante todo o ano. Sem contar que a cabotagem constitui um modal muito mais barato e racional que o rodoviário, que foi incentivado especialmente a partir dos governos Dutra (1946-1951) e Kubitschek (1956-1961), em detrimento dos modais ferroviário e marítimo. A cabotagem apresenta, em média, um custo de 20% a 30% mais barato do que o modal rodoviário, além de oferecer maior segurança a cargas que exigem a presença de escolta, o que encarece o frete. 


Segundo dados da Confederação Nacional do Transporte (CNT), em 2018, foram transportadas 162,9 milhões de toneladas por cabotagem, registrando-se um aumento de 4,1% em relação a 2017. Mas parte desse aumento deve ser atribuída à greve dos caminhoneiros, que, em maio daquele ano, fez com que as empresas buscassem alternativas de transporte. Atualmente, o modal responde por 11% do mercado.


Essa pouca representatividade se dá em razão da falta de incentivo que faz com que poucos armadores ofereçam esse serviço. Hoje, são os armadores estrangeiros que dominam esse modal, especialmente no transporte de contêineres, enquanto os armadores nacionais operam a maior parte de granéis líquidos, com produtos da Petrobras, e alguns sólidos, principalmente o sal.


É de se lembrar que a legislação brasileira já permite que qualquer investidor brasileiro ou estrangeiro constitua uma empresa brasileira de navegação e, assim, construa no País ou importe navios para operar na cabotagem. Porém, o que se viu até hoje foi somente empresas estrangeiras comprando empresas brasileiras de navegação, com interesse em seus mercados de longo curso, como a Aliança, que foi comprada pela alemã Hamburg-Sud – que, em 2016, foi adquirida pela dinamarquesa Maersk Line. 


A saída não seria apenas a liberação do embarque de contêineres nos navios de longo curso de bandeira estrangeira, mas um processo mais amplo, que significaria dar às empresas brasileiras condições para que tenham custos operacionais mais competitivos, a partir de uma reforma tributária que acabasse definitivamente com os impostos em cascata. Estes certamente seriam caminhos para que empreendedores investissem na construção de navios de bandeira brasileira e passassem a operá-los não somente na cabotagem, mas também no longo curso.


Diante de tantos problemas, a cabotagem, por questões políticas e em razão de graves problemas criados por armadores e estaleiros brasileiros, com desvios de recursos da Superintendência Nacional de Marinha Mercante (Sunamam), autarquia criada em 1969 e extinta em 1983, até hoje não conseguiu se fixar como opção confiável, o que tem representado um grande prejuízo para o País. O que se espera é que, a partir de agora, uma nova perspectiva se abra para o modal.


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