Marcelo Sammarco: Reflexões sobre a desestatização do Porto

Inclusão da autoridade portuária de Santos no programa do Governo Federal foi apenas o primeiro passo de uma tarefa não tão simples

Por: Marcelo Sammarco  -  15/01/20  -  22:10
Marcelo Sammarco: Reflexões sobre a desestatização do Porto
Marcelo Sammarco: Reflexões sobre a desestatização do Porto   Foto: Ilustração: Padron

Como já amplamente noticiado, a Santos Port Authority - SPA (atual denominação da Codesp, a autoridade portuária de Santos) foi incluída no programa de desestatização do governo federal. Este projeto deverá ser concluído no terceiro ano do mandato presidencial. Ou seja, em 2021.


Evidentemente, o anseio da comunidade portuária é de que a conclusão de todo este processo ocorra o mais breve possível. No entanto, não se trata de tarefa das mais simples. A desestatização implica na realização de estudos técnicos complexos e na implementação de uma série de medidas a fim de equilibrar as contas da companhia e equacionar questões sensíveis, como a dívida com o Instituto Portus (fundo de pensão dos portuários), dentre outros temas, o que demanda tempo.


Neste aspecto, a atual diretoria da SPA vem fazendo a “lição de casa”, concentrando esforços na recuperação da saúde financeira da empresa, com importantes resultados no primeiro ano de gestão. Em novembro de 2019, a companhia registrou superávit de R$ 138 milhões, contra uma herança negativa de R$ 468,72 milhões no ano anterior.


Além disso, já é possível notar a implementação de mecanismos de governança e controle, acesso à informações e documentos, dentre outras ferramentas de transparência e modernização. Tudo isso é necessário e ainda há muito a ser feito para que a empresa, enfim, possa estar pronta para ser desestatizada e, sobretudo, para que se torne atraente aos olhos da iniciativa privada.


Em paralelo às medidas de saneamento em curso, o Ministério da Infraestrutura encomendou junto ao BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) um estudo técnico sobre a privatização do Porto de Santos, com vistas a encontrar o modelo de desestatização mais adequado.


A expectativa é de que estes estudos sejam entregues ainda em 2020. E aqui reside uma importante questão: qual seria o melhor modelo para a desestatização do Porto de Santos? Algumas opções vêm sendo discutidas com maior ênfase nos últimos meses. Uma delas é a abertura de capital da empresa através de um IPO (Initial Public Offering - oferta pública de ações), com venda parcial de ações.


Existe também a possibilidade de privatização integral da companhia, com transferência total do controle da empresa ao setor privado. Outro modelo seria uma concessão apenas da gestão dos serviços operacionais à iniciativa privada.


A abertura de capital se apresenta como uma solução arrojada, na medida em que implicaria na consolidação da modernização e do profissionalismo que vem sendo implementados pela atual diretoria da SPA. Na privatização total, entretanto, há o receio de que um dos players do mercado adquira importante volume de cotas da empresa (ou a totalidade), passando a exercer influência nas decisões estratégicas da companhia de acordo com os interesses particulares do seu próprio negócio.


Na privatização parcial, o poder público teria poder de veto através de uma golden share (ação especial que garantiria à União o poder de veto nas decisões), o que limitaria esse fator, mas ainda assim haveria espaço para players diretamente interessados no mercado participarem do conselho de acionistas e, consequentemente, das estratégias e tomadas de decisões da empresa.


Por outro lado, na concessão de serviços operacionais, as decisões da companhia ficariam a cargo exclusivo do poder público. Em contrapartida, o Porto ganharia em agilidade na execução de serviços operacionais, como o aprofundamento e a manutenção do canal de navegação, a dragagem de berços de atracação e bacias de evolução, realização periódica de batimetrias, modernização e padronização de cabeços de amarração, implementação e aperfeiçoamento de sistemas, etc.


Os modelos aqui mencionados são interessantes e nenhum deles parece estar descartado neste estágio. O certo é que o tema merece muito estudo e discussão, levando-se em consideração a relevância do Porto de Santos para a economia regional e nacional.


Seja qual for o modelo adotado, é imprescindível que seja assegurado um equilíbrio na participação do poder público e do setor privado na gestão do Porto de Santos. Além disso, é importante que se consolide uma política de Estado para o sistema portuário que ultrapasse as fronteiras de futuras transições de governos, de forma que se dê continuidade aos importantes avanços projetados neste momento.


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