Trânsito, exercício do bom conviver

Educação é elemento chave para bom entendimento entre todos os atores que circulam por ruas e estradas País afora

Por: Da Redação  -  05/10/20  -  00:26
Fórum A Região em Pauta traz luz à questão da segurança do trânsito
Fórum A Região em Pauta traz luz à questão da segurança do trânsito   Foto: Vanessa Rodrigues

Que a Educação é primordial na vida de todos, não resta dúvidas. Mas, quando ela tem papel preponderante para a preservação da própria vida, isso fica ainda mais latente. Pois não entender seu papel no ambiente do trânsito, seja como condutor ou pedestre, pode resultar em acidentes e, consequentemente, mortes. E é justamente este tipo de orientação, desde os primeiros anos de vida, que pode fazer a diferença nessa questão. 


Essa é a principal mensagem extraída de mais uma edição do fórum A Região em Pauta. A live, realizada na última segunda-feira (28/09) na página do Facebook do Grupo Tribuna (www.facebook.com/grupotribuna), foi comandada pela editora-chefe, Arminda Augusto, e pelo editor de Local, Rafael Motta e contou com vários especialistas no tema. Este caderno procura ampliar a discussão.


O sinal amarelo foi acionado mais uma vez no mês passado. De acordo com dados do Governo de São Paulo, responsável pelo programa Respeito à Vida, houve aumento de 77% nas mortes no trânsito na região da Baixada Santista em agosto, comparado com o mesmo mês de 2019. Entre janeiro e agosto dos dois anos, o comparativo mostra ligeira queda, de 3%. Mesmo assim, o cenário inspira atenção. 


É neste contexto onde entra a educação. Para José Aurélio Ramalho, presidente da Oscip Observatório Nacional para Segurança Viária (ONSV), é ela quem vai criar consciência nos integrantes desse ecossistema de trânsito.


“O fator principal para reduzir os acidentes de trânsito é a questão da educação do condutor e da formação do cidadão como condutor. A gente trabalha em duas frentes muito fortes: a educação de trânsito nas escolas e a formação do novo condutor”, sintetiza. 


Ele cita um exemplo pessoal de como o convencimento sobre boas práticas, ainda na infância, pode modificar para melhor o adulto em construção. “Uma professora ‘enfiou na cabeça’ da minha filha que existia uma coisa chamada planeta e um negócio chamado Meio Ambiente. Coisa de quinze anos atrás. Hoje, reciclo meu lixo em função dessa educação que ela recebeu. A Educação de Trânsito vai ser um grande fator transformador desse panorama”.


Luiz Pazetti, diretor-geral substituto do Denatran, vai na mesma linha. “Nós temos, por premissa, que o trânsito se baseia em três vertentes: educação, engenharia da via - uma curva mal projetada ou mal sinalizada pode provocar um acidente - e esforço legal, onde é incluída a fiscalização. Para muitos, fiscalização e educação são bandeiras que se contrapõem, o que eu acho uma insanidade. A educação e a fiscalização têm que andar alinhadas, de mãos dadas, para que a gente tenha um resultado positivo. Há muito o que se fazer pela educação, ela é tímida ainda, em relação às questões do trânsito”.


Fiscalização


Ele ressalta que uma fiscalização mais efetiva também serve como intrumento de educação dos motoristas. “Temos exemplos que demonstram isso de maneira muito tranquila. Quando nós olhamos para o uso de capacete e para o cinto de segurança nos veículos, o que temos? Onde há fiscalização, toldo mundo usa cinto e usa capacete. Onde não há fiscalização, ninguém usa. Há capitais de estado em que, no centro da cidade, não há ninguém usando capacete e ninguém usando cinto. E o que explica este fenômeno? A inexistência de fiscalização”, descreve. 


Pazetti insiste que trata-se mais de um problema de gestão dos órgãos que fazem a fiscalização do que do conjunto de leis de trânsito. 


“Tenho uma visão muito particular: existem autuações indevidas? Sim. Só que esse problema de autuação ou fiscalização indevida é um problema de gestão do órgão. Assim como nós temos deficiências na Educação, na Saúde, na Habitação, no saneamento Básico e na Segurança, temos deficiência de gestão pelo País afora. A gestão no trânsito é ruim”, avalia. 


Evolução necessária


Ronald Marangon, diretor-superintendente da Ecovias, é direto. Para ele, enquanto as pessoas não seguirem as regras de trânsito, para não ser multado, ser fiscalizado e perder sua carteira, a discussão sobre segurança no trânsito vai persistir.


“As pessoas precisam começar a dirigir, se comportar no trânsito, seja dentro da cidade, seja na rodovia, pensando na segurança de suas próprias vidas, de seus familiares e de quem está ao seu redor. Aí, sim, vamos começar a ter números interessantes. Para chegar nesse patamar, precisamos ter leis muito claras e fiscalização, para que tornem isso um hábito. As crianças são um exemplo nítido de que, desde pequenas, são educadas a fazer direito. É algo que a gente tem que buscar”. 


Seguro DPVAT


José Aurélio Ramalho, do Observatório nacional para Segurança Viária (ONSV), destaca a importância do Seguro DPVAT para as vítimas de acidentes. “É um seguro único no mundo. É somente o Brasil que indeniza as vítimas de acidentes de trânsito sem julgar a culpa ou responsável. O pedestre também recebe indenização, independentemente se ele tem um veículo motorizado ou não. Ele é importante para milhões de acidentados que, ao sofrer o acidente, se veem dependentes do INSS e apenas dele. O seguro ajuda e melhora um pouco uma situação gravíssima e que, na maioria das vezes, desestrutura e desestabiliza toda família. O Seguro DPVAT é, sem dúvida alguma, um benefício para todos os brasileiros”, avalia.


Formação de novos condutores é motivo de críticas


Um dos problemas apontados no espectro do trânsito reside na formação e aperfeiçoamento dos novos condutores de carros e motos. Deficiências nos exames práticos, preocupações com elementos que não fazem parte do dia-a-dia nas ruas e estradas entram na lista de melhorias que podem ser feitas. Ramalho, do Observatório Nacional para Segurança Viária (ONSV), é bem enfático. 


“Na verdade, a gente adestra as pessoas a tirarem Habilitação. Decorar placa, decorar legislação... Eu não vou fiscalizar nada, não vou aplicar multa. Então, por que eu vou ter que saber o artigo do Código de Trânsito Brasileiro (CTB)? Não sei o Código Civil, não sei o Código Penal, mas tenho que saber o Código de Trânsito. Tenho que saber, sim, quais as condutas, a percepção de risco, de um bom relacionamento no compartilhamento do espaço público”. 


Ele revela, inclusive, uma mudança de perfil de quem busca sua primeira Carteira Nacional de habilitação (CNH). “Antes, quando se completava 17 anos, onze meses e 29 dias, já estavam na porta da autoescola. Hoje, eles têm 21, 22, 25 anos e nem se preocupam com isso. Está mudando um pouco esse perfil”. Ele estende sua preocupação com quem busca licença para conduzir uma motocicleta. 
“Precisamos habilitar melhor nossos motociclistas. Nossa habilitação de motocicleta é uma das piores do mundo. O que rege o CTB é perfeito. Nenhum Detran faz as aulas na rua. Quem é habilitado em motocicleta, sabe. Fica dentro de um quadradinho de x metros por x metros, faz um slalon, um oito e te dão um “atestado de óbito” antecipado, que chamam de habilitação. E é para você morrer longe. É desesperador”, reforça.


Sustento


A crise gerada pela Covid-19, na visão de Ramalho, tem potencializado essa preocupação com a qualidade dos condutores de moto, especialmente os que abraçaram modalidades de trabalho sobre rodas para aplacar o desemprego.


“O motofretista precisa ter um curso específico. Nesse momento, o cara está desempregado, e não há coisa que doi mais no coração do que a palavra desemprego. Aí, ele pega a moto do primo ou do irmão, sobe mela e vai entregar pizza. E morre. São raras as cidades que avançaram com isso. Tem até a legislação, mas não a exercem”, complementa Ramalho.


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