Mulher se entrega ao trabalho voluntário para superar morte dos filhos e se reerguer da depressão

Elisabete Francisco da Fontoura dá aulas de padaria artesanal em Santos. 'Foi o jeito que escolhi para não enlouquecer', afirma

Por: Egle Cisterna & Da Redação &  -  13/07/19  -  16:32
Dois filhos de Elisabete sofreram com o vírus HIV
Dois filhos de Elisabete sofreram com o vírus HIV   Foto: Vanessa Rodrigues AT

Se entregar ao próximo para sobreviver ao sofrimento. Esse foi o caminho escolhido por Elisabete Francisco da Fontoura, de 78 anos, que depois de perder dois filhos, se dedicou ao voluntariado para se reerguer da depressão.


Quem a vê, sorridente, dando aulas de padaria artesanal no Fundo Social de Solidariedade (FSS) de Santos, não imagina que foi a dor do luto que a fez buscar um trabalho voluntário.


“Foi o jeito que escolhi para não enlouquecer, pois já andava pelas ruas, falando sozinha dentro do meu sofrimento”, conta ela.


O drama de Elisabete começou nos anos 80, quando descobriu que um dos filhos era HIV positivo. “Meu mundo caiu. Eu só chorava e não sabia como reagir. Ele tinha entrado há poucos meses no Exército, tinha 18 anos e o sonho de seguir. Foram anos muito difíceis, pois ele sabia que não teria mais que cinco anos de vida”, lembra.


Num momento em que a doença era tabu, o tratamento não era tão avançado e o preconceito existia até dentro da própria casa, Elisabete se dividiu entre o trabalho de auxiliar de costura e os cuidados com o filho.


“A partida dele foi um baque, ainda mais porque eu havia perdido minha mãe três meses antes. Mas ergui a cabeça e comecei a tocar a vida para frente”, diz, entre lágrimas.


Outro baque


Mas a tranquilidade no coração da mãe durou pouco tempo. Um ano depois, ela soube que outro filho também era portador do HIV. “Foi bem complicado, porque ele não aceitou bem, ficou revoltado e passou um tempo trancado no quarto. Eu fiquei desesperada, sem saber como ajudar”.


Ela o convenceu a procurar tratamento e ajudou o jovem a realizar o desejo de fazer faculdade de Jornalismo. A luta pela saúde do filho durou 20 anos. “Ele era meu companheiro de vida. Foi quem cuidou do pai quando teve enfisema, saía comigo. Perder dois filhos é uma dor que ninguém imagina”.


Sem saber o que fazer e com medo de perder a lucidez no meio de tanto sofrimento, ela aceitou o conselho da equipe de saúde que atendeu seu filho. 


“Fui agradecê-las pelo bom atendimento, viram minha expressão de perdida e sugeriram que eu procurasse fazer um serviço social. Saí de lá, passei no Fundo Social e comecei no dia seguinte. E lá se vão cinco anos de muita troca, que me salvou de um mal maior”.


Continuar vivendo


Hoje, ela mora com a única filha que tem e ocupa seu tempo entre as atividades do FSS e em compromissos com as amigas que fez no órgão. 


“Trabalhar, sair para tomar um chá, jantar, são coisas fundamentais para continuar vivendo. Já falei para Deus não ter pressa de ‘tocar o sino’ para mim, pois ainda tenho muito que aprender por aqui”, brinca.


Como fazer


Elisabete integra o grupo de 110 voluntárias do FSS, que atuam como professoras nos cursos de qualificação, em eventos, ações e campanhas solidárias. Quem tem interesse em ser voluntário no FSS deve ir até a Avenida Conselheiro Nébias, 388, na Encruzilhada, de segunda a sexta-feira, das 9h às 12h e das 14h às 18h, onde preenche ficha, passa por entrevista sobre o que gostaria de fazer e conhece o trabalho desenvolvido no local.


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