Turbine a memória: conheça exercícios que podem ajudar a treinar a mente

Atividades podem evitar o seu envelhecimento; confira dicas

Por: Alcione Herzog  -  20/06/21  -  10:41
Atualizado em 20/06/21 - 11:46
 Conheça maneiras de cuidar da habilidade cognitiva e melhorar hábitos
Conheça maneiras de cuidar da habilidade cognitiva e melhorar hábitos   Foto: Divulgação/Unsplash

Você sempre esquece onde deixou os óculos? Vive perdendo as chaves? Tem dificuldade de gravar os nomes das pessoas que conheceu recentemente? Costuma perder o horário do remédio? Calma! Esses e outros episódios tão comuns não significam que você tem ou terá problemas mais sérios de memória. Mas eles podem ajudar a alertar que sempre é tempo de prevenir esse tipo de acontecimento.


Quem sente dificuldades semelhantes no cotidiano e quer preservar ou até turbinar a capacidade cerebral de armazenar e absorver informações pode seguir algumas orientações. Um dos medos mais comuns é o de que, com o envelhecimento, a nossa capacidade de lembrar as coisas fique muito comprometida. O neurocientista e professor de Inteligência Emocional do Curso da Terceira Idade, da Universidade Católica de Santos (UniSantos) e da Universidade Santa Cecília (Unisanta), Ari Brito, diz que a memória tem muito mais a ver com o estilo de vida que uma determinada pessoa levou até chegar numa fase mais avançada do que com a idade dela em si.


Ainda que as funções do sistema nervoso central (particularmente as que envolvem o processo cognitivo, incluindo a memória) se desgastem com o passar do tempo, levar uma vida saudável com um bom nível de oxigenação cerebral e uma boa alimentação influenciam diretamente no grau de comprometimento dessas perdas cognitivas. “É muito comum as pessoas diminuírem o ritmo físico após se aposentarem. Com o aumento do sedentarismo, há um prejuízo no nível de oxigenação cerebral. Isso faz com que a comunicação entre os neurônios, que chamamos de sinapses, acabe se enfraquecendo”, explica o médico e educador.


A cientista da computação, escritora e criadora do site Mais Aprendizagem, Ana Lopes, tem se dedicado a pesquisar estratégias para potencializar os processos de aprendizagem. Ela explica que a memória é formada por neuroconexões, em processos que ligam as informações novas e as antigas, já armazenadas. Quanto mais conhecimento prévio uma pessoa tem, mais fácil fica para ela armazenar e se lembrar de dados novos.


Com base nesse ponto de vista, quem viveu mais tem mais fatos com os quais relacionar aquilo que está chegando de novo para o cérebro processar. Então, sim, a idade interfere, mas, segundo Ana Lopes, o maior efeito negativo que o envelhecimento traz ao funcionamento cerebral envolve a velocidade de raciocínio.


“Após os 50 anos, a rapidez de raciocínio vai caindo, só que essa diminuição de velocidade acontece de um modo muito devagar. O cérebro, para a nossa sorte, envelhece num ritmo mais lento, comparado a outros órgãos”, enfatiza a especialista.


É claro que ambas as colocações excluem os casos de distúrbios cerebrais degenerativos, como o Alzheimer. Neles, outros fatores, entre eles os genéticos, acabam estando envolvidos.


De qualquer forma, há muitas maneiras de cuidar da nossa habilidade de memorizar as coisas. E alguns hábitos podem até mesmo turbinar essa capacidade.


Nos últimos anos, os estudos científicos sacramentaram a chamada neuroplasticidade como nossa grande aliada. Há algumas décadas, o entendimento médico majoritário era de que o cérebro se desenvolvia até os 2 anos de idade e depois estacionava, ou seja, não criava mais nenhum neurônio. Sabemos hoje que isso não é verdade. Inclusive em idades mais maduras, ainda há a formação de neurônios, mesmo que eles sejam poucos e estejam relacionados a áreas bem específicas.


O poder das Conexões


Para Ana Lopes, o mais importante para a memória é a formação de novas conexões entre os neurônios já existentes. “O que aumenta com a assimilação de informações novas é a quantidade de conexões. Mas também se sabe que uma das áreas que mais ganha neurônios novos durante a vida adulta é justamente o hipocampo, que é a região do cérebro responsável pela formação da memória de longo prazo”.


O neurocientista Ari Brito confirma que a neuroplasticidade é algo que a neurociência vem pesquisando nos últimos tempos. E uma das coisas que se descobriu é a neurogênese (processo de formação de novos neurônios no cérebro, provenientes de células-tronco neurais e progenitores neurais) em idades mais avançadas.


“Se imaginava que um cérebro adulto tinha uma linha de crescimento e depois começava a se deteriorar com o tempo, agora sabemos que não existe idade para aprender coisas novas. Muito pelo contrário, quanto mais estimularmos atividades novas, mais o cérebro agradecerá”, ressalta Ari Brito.


E é essa plasticidade da nossa cuca que explica, por exemplo, o que acontece quando uma o que acontece quando uma lesão e a pessoa aprende a realizar aquele movimento usando outra parte do cérebro.


Dicas valiosas


Há quem se pergunte se é verdade que fazer palavras cruzadas ou abusar dos jogos de computador que dizem exercitar o cérebro ajuda na saúde da nossa mente. De acordo com Ana Lopes, isso não faz mal, mas também não há garantia de que potencializa, de fato, a nossa capacidade de memorizar e aprender. Ela frisa que o bom mesmo é propor desafios cada vez maiores para o nosso cérebro. “Tem uma hora que as palavras cruzadas não são mais tão desafiadoras”. Já o hábito de ler é excelente, pois nos coloca constantemente em contato com coisas novas, ao mesmo tempo em que aumenta a nossa reserva cognitiva. “A rotina de leitura ajuda a diminuir a perda das funções cognitivas conforme envelhecemos. Outra coisa que turbina ainda mais o cérebro é a aprendizagem de línguas”.


Segundo Ana, estudos feitos com imagens da estrutura e do funcionamento do cérebro mostram que ele se altera sempre que uma pessoa aprende um novo idioma. Pesquisas comparativas comprovaram o aumento das massas cinzenta e branca em indivíduos que aprendem um idioma novo, ampliando, assim, a capacidade de memorizar a médio e longo prazos.


Já as dicas para colher resultados a curto prazo são praticar meditação e exercícios físicos regulares. Ambos trazem efeitos mais imediatos para o cérebro, algo ideal para quem está focado em estudar para concursos, por exemplo.


De forma geral, Ari Brito recomenda a introdução de atividades que estimulem os sentidos. “Em qualquer idade, buscar coisas novas é algo que funciona e muito. Experimente novos sabores, visite novos lugares, percorra caminhos diferentes. Isso tudo estimula os processos cognitivos”.


Praticar exercícios que estimulem a respiração e a concentração também traz muitos benefícios, porque o cérebro gosta de organização. “Manter a sua vida organizada ajuda na prevenção de diversas doenças”, afirma o especialista.


Impacto social


A parte social também interfere bastante. Na chamada Psicologia Positiva, existem inúmeros estudos que provam que envelhecer com um bom grau de sociabilização é importante.


Um dos pesquisadores desse campo, Martin Seligman mostrou, nas últimas três décadas, que os processos de intervenção social podem estimular ou inibir os processos cognitivos, incluindo a memória. “Uma pessoa que mantém bons relacionamentos, que participa de atividades coletivas e se sente reconhecida pelo grupo é beneficiada com boas doses de dopamina ao longo desses eventos”, diz Brito, complementando que a gratidão e o perdão são terapêuticos.


“As relações sociais afetam diretamente a qualidade de vida, principalmente nas idades mais avançadas. Também é fato que a solidão inibe e deixa as pessoas cada vez mais sedentárias e desmotivadas”.


Encarando os Riscos


Existem fatores considerados inimigos da nossa memória. O neurocientista enumera o estresse, os transtornos de ansiedade e a depressão. Em geral, esses quadros aumentam o nível de cortisol, hormônio que é liberado em situações mais tensas.


A adrenalina também é muito comum nessas situações, mas ela deixa o corpo em estado de atenção. Já o cortisol é mais crônico e impacta no hipocampo, diminuindo essa área e influenciando no processamento de informações que são responsáveis pelas nossas lembranças. “Uma pessoa estressada frequentemente ou com problemas de ansiedade crônicos vai, naturalmente, ter os problemas de memória agravados se não reverter esses quadros”.


Ari Brito ainda recomenda a prática de meditação e ioga pelos inúmeros benefícios comprovados cientificamente. “Hoje, se fala muito do mindfulness, que basicamente é uma técnica de meditação para fazer as pessoas se concentrarem e relaxarem, indo na contramão da rotina avassaladora cobrada pela sociedade”.


O neurocientista pondera que a maioria de nós vive um dia a dia repleto de estímulos e pressões que nos desconcentram, nos dispersam e nos estressam. A tecnologia tem uma grande responsabilidade nesse cenário agitado, pois nos mantém sempre conectados e acaba acelerando ainda mais o ritmo de vida.


“Cabe a nós fazermos a lição de casa e encontrarmos formas de nos desintoxicarmos disso, mesmo que seja em poucos momentos do dia ou nos finais de semana. O estresse permanente é extremamente danoso para os nossos processos de memória e aprendizagem”.


Olho no Sedentarismo


Outro grande fator de risco é ter uma rotina sedentária. Ana Lopes diz que o cérebro é um órgão que precisa de muita oxigenação.


“É uma parte do nosso corpo bem sensível à falta de oxigênio e são os vasos sanguíneos que garantem essa oxigenação. Uma forma de prevenir a deterioração das funções do cérebro é prevenir problemas na parte vascular, geralmente causados pela falta de exercícios físicos e pela má alimentação”.


A qualidade e a quantidade de horas de sono são cruciais. Dormir ajuda a solidificar e consolidar as memórias de tudo o que vivenciamos. Perder uma boa noite de sono é perder a maioria das informações que estudamos no dia anterior e também as que iremos absorver no dia seguinte, uma vez que, ao ficarmos desorganizados mentalmente por conta do cansaço, as funções cognitivas tendem a se mostrar muito comprometidas.


E será que o gênero interfere no ritmo de perda da memória ao longo dos anos? A resposta é sim. Estudo publicado na revista Neurology, da Associação Americana de Neurologia, mostrou que, embora as mulheres tenham mais casos de demência do que os homens, o quadro inicial, que é a perda leve de memória, afeta mais os homens do que as mulheres.


Existe um outro estudo da Sociedade Norte-Americana de Menopausa que indica que as mulheres possuem uma memória mais precisa do que os homens, porém, depois da menopausa, essa capacidade de memorização acaba sendo afetada. “Os resultados comprovaram que as mulheres de meia-idade têm uma memória mais precisa do que homens da mesma faixa etária. No entanto, a memória feminina passa a enfraquecer principalmente após a menopausa, por causa da diminuição do hormônio estradiol no organismo”, finaliza Ari Brito.


Veja mais em ATribuna.com.br:



Logo A Tribuna
Newsletter