Novos hábitos à mesa: com o isolamento social, os adolescentes passaram a comer mais legumes

Estudo mostra que o consumo de fast-food caiu durante a pandemia. Mas o de doces e frituras subiu

Por: Brenda Bento  -  30/05/21  -  17:55
   Estudo mostra que, com o isolamento social, os adolescentes passaram a comer mais legumes, verduras e frutas. O consumo de fast-food caiu, mas o de doces e frituras subiu
Estudo mostra que, com o isolamento social, os adolescentes passaram a comer mais legumes, verduras e frutas. O consumo de fast-food caiu, mas o de doces e frituras subiu   Foto: Adobe Stock

Pesquisa publicada no periódico científico Nutrients, realizada com adolescentes de cinco países, incluindo o Brasil, aponta mudança no consumo de alimentos fritos, doces, legumes, verduras e frutas durante o isolamento social. Nesse sentido, o confinamento afetou especialmente os jovens entre 10 a 19 anos, que são altamente suscetíveis a adquirir maus hábitos alimentares.


Foi identificado um aumento no consumo de hortaliças e frutas entre os adolescentes. O levantamento mostra que 43% deles consumiram vegetais todos os dias durante o confinamento, contra 35,2% que já comiam antes. Do mesmo modo, 33,2% ingeriram pelo menos uma porção de fruta por dia no período de isolamento social, contra 25,5% antes da pandemia.


A pesquisa indica ainda que o consumo de fast-food foi reduzido drasticamente. Em compensação, a ingestão de alimentos fritos e doces cresceu significativamente durante o confinamento. Enquanto 14% dos adolescentes comiam doces todos os dias antes da pandemia, esse percentual aumentou para 20,7% com o início das restrições sociais.


No que diz respeito ao consumo de alimentos fritos numa frequência de quatro a sete dias por semana, também houve aumento: os índices foram de 7,4% (quatro dias), 3,7% (cinco), 1,8% (seis) e 2,1% (sete) para 8,8%, 3,8%, 2,2% e 2,9% respectivamente.


Adaptação à rotina saudável


Com certeza, existem desafios para se ter uma alimentação saudável, mas também há soluções para isso. Algo essencial é se aproximar desses alimentos. Para a nutricionista e professora do curso de Nutrição da Universidade Metropolitana de Santos (Unimes), Ana Laura Benevenuto de Amorim, levar os adolescentes à feira pode ser um estímulo para ter uma dieta equilibrada.


Outra tática é resgatar receitas de família para incentivar o jovem a se aventurar na cozinha e comer de maneira saudável. “É importante incentivar esse tipo de hábito mesmo com o retorno às atividades presenciais, para que isso se torne algo prazeroso”, afirma Ana Laura.


A organização é o principal segredo da alimentação equilibrada, segundo ela. “Deve-se planejar o menu, ir ao mercado com a lista de compras, chegar em casa e já organizar os alimentos da semana. Tire um dia para realizar essas atividades, deixando as frutas e as saladas já higienizadas e picadas. Prepare ainda marmitas. Deixe o arroz e feijão cozidos, e separe esses alimentos, assim como os legumes e a carne, em porções para cada dia da semana”.


A nutricionista destaca que estudos apontam que o hábito de realizar refeições com os pais é algo frequente entre os adolescentes brasileiros e está associado à melhor qualidade da alimentação. Ou seja, a melhora dos hábitos alimentares dos adolescentes durante a pandemia possivelmente tem uma relação com esse fato, já que muitas pessoas passaram a realizar atividades de trabalho e de estudo remotamente.


“A nossa alimentação depende de diversos fatores. Há as questões financeira, de disponibilidade, acesso, os fatores psicológicos, familiares, de saúde. Tudo isso irá influenciar a escolha do que comemos. Dependendo do caso, a alimentação pode ser uma fuga ou o consolo de um momento que estamos vivendo, e a pandemia realmente influenciou bastante a nossa saúde mental. Por outro lado, a comida tem um papel incrível de aproximar as pessoas e valorizar as situações, só que, com o isolamento social, esses encontros têm sido raros”, observa a especialista.


De acordo com ela, antes da pandemia, estudo avaliou os hábitos alimentares de adolescentes brasileiros de 2009 a 2015 e também evidenciou uma evolução positiva no que diz respeito ao consumo de vegetais. “É muita ousadia dar uma responsabilidade única a determinado alimento como controlador da ansiedade e da fome. Temos que pensar em um conjunto de hábitos que demandam um estilo de vida saudável, o qual vai desde manter uma alimentação equilibrada até praticar atividade física regularmente, ter sono de qualidade e ter as questões pessoais bem resolvidas. Nós, por exemplo, podemos valorizar as fibras, que proporcionam uma maior saciedade, mas temos que considerar que os exercícios físicos também vão atuar no controle da ansiedade e no gasto de energia. A nossa relação com a alimentação diz muito sobre a nossa relação com a vida e precisamos cuidar das fragilidades em ambos os casos”.


Doenças que vêm no pacote


O endocrinologista e professor do curso de Medicina da Unimes, Paulo Maccagnan, afirma que o comportamento alimentar deve ser trabalhado desde a infância, tanto em casa quanto na escola. O médico acrescenta que alimentos como fast-food e doces oferecem uma quantidade enorme de calorias, que, no nosso corpo, funcionam como energia que geralmente acaba não sendogasta no metabolismo. Dessa forma, o organismo estoca essas calorias em forma de gordura.


“Esse estoque de gorduras deveria ser discreto, para que o nosso peso ficasse normal, estável. Infelizmente, nos últimos 50 anos, as pessoas vêm acumulando muito peso e a obesidade é considerada a principal pandemia. Com a obesidade puxando a fila, vêm atrás: hipertensão, diabetes, colesterol alto, triglicérides, ácido úrico, osteoartrose, varizes, infarto, AVC, câncer, entre outras doenças”.


Segundo o endocrinologista, nossas escolhas alimentares têm muita relação com as sensações vindas do paladar e do olfato. Alguns alimentos, como os doces, trazem uma recompensa imediata e, por isso, são cada vez mais preferidos. Já verduras e legumes mais amargos costumam ser evitados, principalmente se estão crus.


O médico complementa que a obesidade na adolescência tem forte impacto na autoestima e faz com que o jovem sinta bastante dificuldade para realizar atividades de grande exposição, como a prática esportiva ou até uma simples caminhada diária. “Deve haver um comprometimento dos familiares no sentido de criar um ambiente favorável ao cumprimento da dieta proposta. Não dá para um jovem fazer regime sozinho, se o restante da casa não se adequa a isso”.


Assim como acontece nos adultos, a ansiedade e o estresse também afetam a alimentação dos adolescentes. Situações como o confinamento tendem a gerar ansiedade, depressão e fobias, que acarretam respostas comportamentais como o modo de se alimentar, levando desde à anorexia até a compulsão alimentar.


“Como os adolescentes já atravessam um período conturbado com as transformações corporais decorrentes da puberdade, essas consequências na alimentação acabam sendo maiores. O apoio psicológico é fundamental nesse momento. A prática rotineira de exercícios físicos e as atividades socioculturais são grandes válvulas de escape, mas, com o isolamento social, ficam entre as coisas mais afetadas”, comenta Maccagnan.


Você sabe qual profissional deve buscar nessa hora? O nutrólogo atua na prevenção, no diagnóstico e no tratamento de doenças ligadas à alimentação. O endocrinologista cuida das enfermidades que têm a ver com hormônios e metabolismo. O nutricionista estuda os alimentos tanto no surgimento de doenças quanto na orientação dietética.


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