Especialistas revelam segredos para recomeçar e ser feliz após término

Desencanto ou luto no fim de relacionamentos pode dificultar a busca pelo amor

Por: Alcione Herzog  -  12/09/21  -  12:01
 Viúvo, Roberto reencontrou o amor em Fabíola, que ainda deu uma irmã a Mariana
Viúvo, Roberto reencontrou o amor em Fabíola, que ainda deu uma irmã a Mariana   Foto: Gaby Teixeira/Divulgação

Não há quem já não tenha passado pela alegria de ter, pela dor de perder e pela dureza de recomeçar depois da queda. Quando o assunto é relacionamento amoroso, quem está no meio da jornada pode achar que ser feliz a dois depois de um desencanto ou de um luto é mais difícil do que ganhar na loteria.


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Afinal, como abrir espaço no coração e dar uma segunda chance ao amor? É possível fazer as pazes com o romantismo e embarcar em uma nova aventura tendo sofrido uma ou mais vezes o fim de uma união? A resposta de psicólogos, sexólogos e pessoas que trilharam o caminho do recomeço é que é possível, sim. Sem falar que pode ser positivo tentar de novo.


Com medo ou com o coração cheio de coragem, quando a paixão chega, a tendência é nos arriscarmos na montanha-russa dos relacionamentos. Mas, dependendo de como encaramos esse novo percurso, a aposta na esperança pode cobrar seu preço, já que novas experiências sempre demandam energia e ninguém tem a garantia do final feliz. Então, como se entregar aos altos e baixos do amor novamente, minimizando as chances de se perder em novas desilusões? Para Marli Cunha, psicóloga do hospital HCSG, não tem atalho. “Todo início de relacionamento é desafiador. O tamanho do desafio vai variar de acordo com o nível de dependência emocional de cada um”.


Com base na duração da união anterior, a nova caminhada pode ser mais ou menos penosa. “É preciso aprender a novamente perceber um olhar e a retornar esse olhar, por exemplo. Quem sai de um casamento longo precisa reaprender a paquerar”, lembra a psicóloga Adriana Severine.


Intervalo x autoconhecimento

Claro que a questão não se resume a treinar o flerte. Antes de partir para a conquista, investigue como andam as suas emoções.


Quando a história anterior carrega memórias traumáticas, as mulheres costumam ter maior dificuldade em confiar novamente. “Não é regra, mas esse recomeço pode envolver autoestima baixa e, às vezes, o receio de vivenciar as mesmas situações negativas do passado. As mulheres também têm maior facilidade de romantizar a relação afetiva e exagerar nas expectativas”, diz Marli Cunha.


No caso dos homens, os mesmos sentimentos podem surgir, porém normalmente as inquietações são outras. “Talvez por sentirem maior necessidade de uma validação social, incentivando-os a ter novas e muitas relações, eles tendem a engatar uma história na outra com mais rapidez e nem sempre isso é saudável”, avalia a especialista.


Antes de encontrar um candidato ou candidata para chamar de cara metade, o ideal é que a pausa amorosa sirva como uma oportunidade de autoconhecimento, aconselha Adriana Severine.


“A pessoa que findou um casamento longo geralmente já nem sabe mais quem é de fato. Ela pode não se lembrar do que gosta de fazer, ter dificuldade em identificar que tipo de prazer busca receber do outro. Muitas vezes, essa pessoa se dedicou tanto a fazer só o que o par ansiava que não se lembra mais das próprias preferências”, afirma. Marli reforça a importância de desenvolver um bom nível de autopercepção. “Para ter uma vida positiva com um novo amor, o ideal é que ambos possuam uma relação consigo mesmos de qualidade. Há pessoas que quase que se despersonalizam para viver um novo amor e esquecem que o outro se interessou por elas do jeito que são ou eram. Logo, a dica é estar bem consigo mesmo e ficar ainda melhor com uma boa e leal companhia”.


Administre o estranhamento

É natural que pessoas que saíram de longos relacionamentos ou que enviuvaram depois de uma vida inteira compartilhada sintam-se estranhas e até tristes por meses. “É o momento certo para os que nunca fizeram terapia iniciarem esse trabalho. Ele ajudará a compreender essa nova realidade, essa nova versão de si mesmo. Entendendo seu momento de vida, aos poucos a pessoa recupera a confiança e a segurança”.


Outra dica é conversar com quem está separado ou viúvo há mais tempo, lembrando sempre que cada caso é único.


João Ribeiro, sexólogo, faz um lembrete especial para as mulheres que viveram relações tóxicas e se encontram mais fragilizadas. De acordo com o especialista, antes de embarcar numa nova relação, é preciso resgatar o autoamor.


“Se acolhendo, elas descobrem a verdadeira mulher dentro delas e, então, vem a coragem para abrir a vida para um novo relacionamento mais pleno e saudável. Muitas mulheres, habituadas a viver com um tipo de pessoa, acabam por trazer para a sua vida homens idênticos aos do seu antigo relacionamento. Se isso é frequente, vale buscar ajuda de profissionais, como psicólogos e terapeutas, para entender melhor o que gera essa postura”.


Para os homens, a dica é não ceder às pressões de amigos e da sociedade em geral, que cobram deles o perfil do ser poderoso e garanhão imediatamente após mudarem o status nas redes sociais para solteiro.


“Eles também sofrem com o término, mas boa parte não vive o luto do fim do relacionamento, como a maioria das mulheres faz. Isso pode causar alguns problemas e erros no futuro”, diz João.


Evite comparações

Partir para uma nova história requer entender o real significado do novo. Isso implica em deixar de lado as comparações. “Não compare e, sim, descubra. Comparar é criar uma âncora no passado e ficar preso ou presa no que já foi. Quando não comparamos, temos a capacidade de descobrir coisas novas e de nos descobrirmos também. Assim não se perde tempo para ser feliz”, ressalta João Ribeiro.


O conselho vale também para o sexo. “O que passou passou. Apenas leve o seu aprendizado para o outro relacionamento. Não comente sua vida pregressa. Descubra novas nuances e guarde as impressões para si”.


Com a ajuda do aplicativo

Quanto às estatísticas que mostram o aumento na quantidade de divórcios, são muitas as histórias inspiradoras de quem redescobriu o amor após quase perder as esperanças na vida a dois. Testemunhos como os da gerente de recursos humanos Mariane Lira, de 56 anos, e do microempresário Haroldo Lima, de 50, provam que para sentir o coração acelerar basta estar vivo e querer ser feliz novamente.


Ambos já tinham passado por relacionamentos longos. Ela foi casada por 25 anos e teve uma filha. Ele viveu por 23 anos com a mãe de seus cinco filhos. Antes de se encontrarem, foi um tempo de solteirice.


Após sete anos de separação, Mariane, incentivada pela filha, resolveu experimentar um aplicativo de relacionamento. Lá estava Haroldo, separado há oito anos, buscando alguém especial para tentar construir uma nova relação estável.


“Eu já tinha me conscientizado que casar de novo não era mais uma opção. Estava curtindo a vida com a família e as amigas. Até queria ter um namorado, mas não pensava em dividir o mesmo teto novamente”, conta Mariane.


Mas as expectativas mudaram quando a gerente de RH recebeu um bom dia de Haroldo no app. “Ele me deu um oi, sumiu e depois voltou. Achei que estava de brincadeira. O fato é que começamos a conversar e fomos nos entrosando. No encontramos primeiro em locais públicos. Aos poucos, fomos nos conhecendo melhor e as coisas aconteceram. Não desgrudamos mais”, lembra.


Dois anos depois, Haroldo diz, sem medo de errar, que encontrou sua “rainha”. Meses depois do início do relacionamento, pediu a namorada em casamento, com direito a aliança e tudo. A cerimônia aconteceu em outubro passado e os pombinhos agora só pensam em aproveitar juntos o melhor da vida. “Hoje, vejo o quanto precisava de alguém bacana, de uma mulher romântica, alto astral e em quem se pode confiar. Isso não é tão simples de encontrar”.


Feliz da vida, Mariane pensa em viver com seu “rei” até ficarem bem velhinhos. E claro que existem perrengues, como em qualquer relação, mas a vontade de fazer dar certo e de manter a essência do amor é como uma bússola a guiar os dois. “Nós temos um combinado, proposto por ele, e que seguimos à risca: todos os dias, ao acordarmos, dizemos um ao outro ‘eu te amo’”, comenta a gerente de RH.


Isso é como selar diariamente os votos de ser e fazer o outro feliz. “Para quem quer viver essa linda experiência de novo, nosso conselho é se abrir. Não fique preso a padrões estéticos, ao corpo perfeito ou à melhor condição financeira do pretendente. Se abra para o novo. O que aconteceu conosco foi isso. Por isso temos certeza de que foi um encontro de almas”, resume Mariane.


O que importa é tentar

A professora Patrícia Santos também ficou em dúvida se poderia ter direito à felicidade conjugal depois de um casamento de 11 anos, desgastado com a rotina e as atribulações do dia a dia. “Imaginei que jamais teria ao meu lado uma pessoa que eu sonhasse. Com o tempo, começamos a reparar que todos têm várias qualidades, mas também defeitos. Conviver com as imperfeições dos outros é bem difícil”.



Depois de um período sozinha, a educadora conheceu uma pessoa que lhe despertou interesse na mesma medida em que trouxe receios. As dúvidas eram muitas e a principal pergunta: será que vale a pena mergulhar e correr o risco de, mais uma vez, não dar certo?


Por sorte, o medo não a paralisou. “Ele é uma pessoa superamável e muito calma. Fomos nos conhecendo e resolvi deixar o tempo tomar conta de tudo. Com tranquilidade, as coisas foram se ajeitando. Descobri que bastava ter calma também”.


Algo que ajudou Patrícia foi usar a experiência gerada pelos erros cometidos e sofridos no passado. Mais madura, ela trouxe aprendizados para a nova relação que fizeram toda a diferença. Um dos principais resultados dessa mudança de postura foi a leveza na convivência. “Ainda tenho muito que caminhar e melhorar, mas estou tentando. E é isso que vale: tentar. É fundamental a vontade dos dois de se doarem e serem parceiros em tudo. A vida é um sopro e não estamos aqui para sofrer ou viver com alguém só por acomodação. Vale a pena se entregar ao novo. Acredito muito na frase ‘viva o amor’”.


E quando o seu par morre?

Quando um relacionamento é interrompido com a morte do parceiro ou parceira, o processo de recomeçar pode ser ainda mais delicado.


Uma ferida tão dolorida tem como arruinar as chances de uma pessoa escrever uma nova história de amor? Depende. Separar-se fisicamente da esposa após um longo tratamento contra um câncer de mama fatal chegou a tirar do administrador de empresas Roberto Gonzalez, de 52 anos, a fé na vida. Ele questionou seriamente até mesmo a existência de Deus. Com uma filha pequena para criar, Roberto só pensava em ter forças para suprir a ausência da mãe na vida da menina. Uma constelação familiar (prática terapêutica que busca resolver conflitos internos) ajudou o viúvo a entender que sua capacidade de amar não tinha ido embora com seu grande amor.


Depois de um ano e meio totalmente fechado em sua dor, ele começou a perceber que tinha direito a tentar ser feliz novamente. E isso não significava desocupar a parte de seu coração reservada para a amada que se foi.


Quando conheceu Fabíola, seu novo grande amor, algo mágico aconteceu. “Ela era uma velha conhecida. Nos reencontramos por acaso num restaurante e reatamos a amizade. Essa ligação foi se estreitando e nos apaixonamos”.


Um dia, Roberto criou coragem e perguntou para a filha, Mariana, então com 8 anos, o que ela achava de ele pedir a “amiga Tia Fabíola” em namoro. A resposta foi positiva, seguida de uma pergunta que encheu o pai coruja de emoção.


“Ela queria saber como poderia chamar a Fabíola. Eu respondi que poderia chamá-la do que desejasse”, comenta.


Alguns dias depois, Mariana trouxe um desenho da escola. Um pouco envergonhada, entregou o presente para o casal. No papel estava escrito: “Tia Fabíola, posso chamar você de mãe?” E abaixo da indagação, ela desenhou dois quadradinhos para serem assinalados. Um continha a palavra SIM. O outro estava sinalizado com a palavra NÃO.


O desfecho da história? É lógico que Mariana ganhou uma resposta positiva e carinhosa, e muitos beijos. Mas não foi só isso. Depois de pouco mais de um ano, ainda ganhou a irmãzinha Stella.


“Há momentos em que achamos que o amor nunca mais vai bater na nossa porta. Mas é só abrir o coração. Estamos nessa vida para viver o amor. Para dar amor. Cada um a seu modo”.


Uma nova reviravolta Foi o que fez também a vendedora Maria Alice Silva de Queiroz, de 57 anos. Ela conheceu o marido em 1989. Um ano depois, já estavam casados e muito felizes.


“Foram 27 anos de parceria e amor. Na minha cabeça, nosso envelhecimento seria compartilhado também. Mas, em 2017, ele infartou. Com a morte, fiquei sem chão e tive a certeza de que jamais poderia ter um companheiro como aquele novamente. Do tipo que levava até café na cama para mim”.


De fato, Maria Alice não achou o mesmo amor. Encontrou outro e, após quatro anos de luto, se permitiu viver essa nova história. Antes, ainda teve uma desilusão. “Em 2020, em plena pandemia, conheci um parceiro que achei ser a pessoa que seguiria comigo. Me apaixonei, porém era uma ilusão. Descobri várias mentiras e do nada ele sumiu. Voltei às noites e aos dias tristes”.


Há seis meses, uma reviravolta a fez sorrir novamente. “Conheci um parceiro de verdade. Um amor e um amigo. Hoje, posso dizer que estou amando e sendo amada. Cada dia traz aprendizado diferente e a consciência de que o amor é a arte da convivência. E que ela seja eterna e boa enquanto dure”.


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