Conheça histórias de mães da Baixada Santista que inspiraram filhos a seguir suas profissões

Em alguns casos, essa paixão compartilhada também faz com que eles trabalhem juntos

Por: Alcione Herzog  -  09/05/21  -  07:22
   Arthur e sua mãe, Denize
Arthur e sua mãe, Denize   Foto: Arquivo Pessoal

Quantos significados cabem na palavra mãe? Amor incondicional, porto seguro e modelo de superação são algumas expressões de uma lista interminável. Para aqueles que seguiram os passos de suas mães na hora de escolher a carreira, há um elemento extra: inspiração profissional.


Clique e Assine A Tribuna por apenas R$ 1,90 e ganhe acesso completo ao Portal e dezenas de descontos em lojas, restaurantes e serviços!


Em áreas como as da Saúde, Educação, Direito e Artes, mães inspiradoras encorajam as suas crias naturalmente, pelo próprio exemplo. Foi assim com Arthur Lotufo Estevam de Farias Filho, de 23 anos. O estudante do quinto ano de Medicina não esconde a admiração que sente pela infectologista Denize Lotufo Estevam, de 59. “A minha mãe sempre me encantou com o seu olhar para o ser humano. Ela encara os pacientes como seus iguais, com um profundo respeito. Essa característica de enxergar o papel social do trabalho dela nunca foi algo dito em palavras. Eu aprendi observando o seu jeito de agir na profissão e isso me ajuda muito nas aulas”.


Para o futuro médico, há coisas que a faculdade não fornece e que acaba extraindo do modelo que tem em casa. “Na universidade, nos ensinam toda a técnica necessária para colocar o conhecimento em prática. E eu tenho o privilégio de aprender fora da academia que ser médico é também se preocupar com a história do paciente. É muito gostoso chegar em casa e contar como foi o meu plantão e discutir questões da área com a minha mãe”, comenta.


Denize Lotufo Estevam escolheu trabalhar com saúde pública, mais especificamente com pessoas com HIV. Hoje, atua no Centro de Referência e Treinamento DST/AIDS, ligado à Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo.


“Tenho muito orgulho de o Arthur ter seguido essa área, embora eu nunca tenha projetado isso para ele. Foi algo natural. Vejo no meu filho um perfil mais próximo da clínica, de mais humanização na relação com o paciente. Não é à toa que ele participa de um trabalho voluntário lindo, chamado Sorrir é Viver, que leva arte e humor para pacientes em hospitais”.


O martelo ainda não está batido, mas tudo indica que Arthur deverá seguir o exemplo da mãe até mesmo na especialidade médica.


“Hoje em dia, a Infectologia é a minha primeira opção, exatamente por ver nela esse potencial de despertar o brilho que vejo no olhar da minha mãe”.


Os dois sabem que ser infectologista em um cenário pandêmico como o que vivemos é um ato de coragem e de amor.


“Existem muitas dificuldades e desafios nessa profissão. Sou muito grato por ter a minha mãe, o meu pai, que também é médico, e toda a família me dando apoio. No momento da formatura, todo esse filme vai passar na minha cabeça e quero a minha mãe na primeira fila para comemorar comigo”.


Espelho desde cedo


Um filho pode escolher abraçar a carreira da mãe por vários motivos. Para a dentista Luciana De Marigny Pires, de 45 anos, a admiração e a cumplicidade foram os fatores que a moveram. A mãe e espelho é Margaret da Silva Pires, de 70.


“Eu cresci acompanhando a minha mãe nas consultas de Odontopediatria. Sempre pedia para ser ajudante dela. Nas minhas memórias da infância, há muitas do antigo consultório dela, de cortinas de xadrez vermelho e móveis parecidos com os de uma casinha de bonecas”, lembra a filha.


   A dentista Luciana de Marigny Pires e sua mãe, Margaret da Silva Pires
A dentista Luciana de Marigny Pires e sua mãe, Margaret da Silva Pires   Foto: Vanessa Rodrigues/AT

Desde muito cedo, Luciana dizia que seria dentista de crianças. “Nunca tive dúvidas, tanto que meu pai é cirurgião-dentista e nunca me interessei pela especialidade dele, apesar de conviver com esse ambiente também”.


Uma de suas alegrias de menina era ver que os amigos eram atendidos no consultório da família. “A minha mãe ganhava desenhos das crianças que tratava. Eu achava isso o máximo”, conta, mostrando algumas folhas de sulfite com formas coloridas recebidas nas últimas consultas.


Além de partilharem da mesma profissão, mãe e filha dividem também o consultório. E todos os dias, essa parceria rende novas recordações da relação construída há mais de quatro décadas.


“Nós discutimos muitos casos para chegarmos à melhor opção de tratamento para os pacientes. Também vamos a congressos juntas e nos apoiamos mutuamente em nosso crescimento profissional. É gratificante ter essa troca de experiências. Aprendo demais com ela”, afirma Margaret.


A mãe coruja destaca que a sintonia profissional é produto da relação profunda entre as duas. “E olha que temos personalidades diferentes, mas até isso é positivo. Embora seja mais nova, a Lu é a mais conservadora da dupla. Eu sou a que gosta de trazer inovações. Enquanto ela me segura com os pés no chão, eu a empurro para novas visões e perspectivas para a clínica. Com isso, encontramos um equilíbrio”.


Ao tentar expressar o que significa ter Margaret sempre por perto, Luciana se esforça para segurar as lágrimas, sem sucesso. “É a pessoa que mais me conhece. É quem sabe tudo sobre mim, mas sabe, também, a hora certa de falar e de calar. É aquela que quando avisa é bom ouvir. O que ela enxerga é o que acaba acontecendo, porque mãe sabe das coisas”.


Orgulho mútuo


As advogadas Laís Amaral Rezende de Andrade, de 65 anos, e Carla Amaral de Andrade Junqueira, de 43, não vivenciam juntas a carreira diariamente, mas muitos pontos unem mãe e filha nos caminhos profissionais.


Orgulhosa, Laís conta que ficou feliz quando soube da opção da então vestibulanda. “Logo que ela entrou no curso de Direito, já tinha o inglês fluente e começou a fazer francês. Percebi que caminhava para o Direito Internacional e depois de formada, efetivamente, fez mestrado e doutorado na França, defendeu tese na Sorbonne e na USP (Universidade de São Paulo) em Comércio Internacional, fez estágio na Organização Mundial do Comércio (OMC), em Genebra (Suíça), e seguiu um caminho na advocacia totalmente diferente do meu. Eu a apoiei em todas as escolhas”, diz Laís, que atua em Direito de Família e Sucessões.

   A mãe Laís e a filha Carla construíram carreiras bem-sucedidas dentro do Direito
A mãe Laís e a filha Carla construíram carreiras bem-sucedidas dentro do Direito   Foto: Arquivo Pessoal

Carla se divide entre o escritório de Buenos Aires, na Argentina, e a sede do negócio em São Paulo. Apesar da distância física, a intimidade e a cumplicidade que sempre marcaram a relação das duas só crescem com o passar dos anos. “A minha mãe é o meu grande modelo. Me ensinou a ética da profissão, como me portar nessa área, como lidar com outros advogados e com os clientes. Ela luta pela equidade de gênero e sempre me mostrou que é possível ser mãe e ter uma carreira consolidada”.


A especialista em Direito Internacional, que tem cinco filhos, lembra que quando garota adorava ver a mãe se arrumar para trabalhar. E acrescenta que um dos pilares de sua formação foi o compromisso com a família. “Força, inteligência, independência, generosidade e dedicação. Para mim, ela é tudo isso, dentro e fora da advocacia”, afirma Carla.


“Somos amigas e confidentes. Iguais na persistência em buscar objetivos e sucesso nos casos que nos são confiados”, resume Laís, que atuou como conselheira em órgãos de classe, como Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Associação dos Advogados de São Paulo e Instituto dos Advogados de São Paulo.


E uma acrescenta à carreira da outra. “Tenho muitos amigos e conhecidos em todas as áreas do Direito que acabaram se tornando amigos da Carla. Por outro lado, ela me apresentou jovens brilhantes da área jurídica, numa troca bem gratificante para ambas”, complementa a mãe.


Por ter iniciado a sua carreira defendendo mulheres vítimas de violência doméstica, Laís sente que inspirou a filha involuntariamente na postura feminista. “Com pouco mais de 30 anos de idade, eu fui nomeada conselheira do Conselho Estadual da Condição Feminina. Depois, fui presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB-SP e vice-presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB federal, com atuação em palestras e congressos, apresentando e defendendo políticas públicas e da sociedade civil para facilitação da proteção da mulher vítima”.


Não por acaso, Carla está seguindo o mesmo caminho de defesa de mulheres vulneráveis, em atuação paralela à profissional e institucional na área do Comércio Internacional. Outro grande exemplo feminino vem da avó, Guilhermina Amaral, que cursou uma faculdade aos 42 anos. Ela se formou em Odontologia numa época difícil para mulheres que buscavam autonomia, e foi com filhos pequenos para o Pará, promover a saúde bucal dos índios.


Exemplo dentro de casa


E o que dizer de quem influenciou não uma, mas duas filhas a cumprir a mesma missão vocacional? É o caso da educadora aposentada Rosa Maria Sessa, de 70 anos.


A professora e coordenadora de ensino da rede municipal de Santos, Priscila Sessa, de 45, lembra com carinho das idas à escola da mãe quando era criança. “Ela também levava o trabalho para casa e eu a ajudava a rodar as provas no antigo mimeógrafo. O meu universo era cheio de livros e materiais escolares. Eu sempre gostei de crianças e fui cursar o Magistério por já saber, graças à minha mãe, o quanto a profissão é encantadora”.

A irmã, Patrícia Sessa, de 48 anos, seguiu a mesma trajetória. “Iniciei a docência aceitando uma sugestão da minha mãe, que propôs que eu experimentasse lecionar. Não imaginava me realizar tanto nessa profissão”, diz a professora universitária e pesquisadora.


   Priscila Sessa lembra com carinho das idas à escola da mãe quando era criança
Priscila Sessa lembra com carinho das idas à escola da mãe quando era criança   Foto: Arquivo Pessoal

Da infância à adolescência, as irmãs ouviam todos os dias relatos de Rosa sobre o cotidiano escolar. “Sempre percebia muita dedicação, profissionalismo e seriedade nela, características que me movem até hoje”, diz Priscila.


Ver as filhas mantendo o seu legado de amor à educação é motivo de realização para a ex-professora, ex-diretora e ex-supervisora da rede pública de ensino. “Elas seguem todos os valores passados em casa e no trabalho. Sabem que a humildade, a honestidade e a responsabilidade são a base de um profissional e de uma pessoa”, comemora a veterana.


Para Patrícia, a maior herança e exemplo é o compromisso com a missão de educar. “A minha mãe construiu uma credibilidade na profissão. Sempre priorizou o aluno. Essa é a nossa principal tarefa na carreira docente”.


Excelência em dose dupla


Trabalhando juntas na clínica Voss Dermatologia, Sonia Voss, de 68 anos, e Talita Voss, de 36, têm em comum a busca pela excelência. Ambas são perfeccionistas e isso traz a sintonia necessária para a carreira escolhida.


   Sonia Voss vê na filha, Talita, a sequência de seu legado na Dermatologia
Sonia Voss vê na filha, Talita, a sequência de seu legado na Dermatologia   Foto: Arquivo Pessoal

Mas demorou para que a filha enveredasse pelos caminhos da mãe. Primeiro, fez Administração de Empresas e ajudou na parte administrativa da clínica. Aí, com o passar do tempo, passou a atuar também como auxiliar durante as consultas.


Ao ver a mãe em ação, o interesse pela Dermatologia cresceu em Talita. Prestes a terminar a primeira faculdade, resolveu mudar de área. “Cheguei a fazer duas faculdades juntas: o primeiro ano de Medicina e o quarto ano de Administração. A minha meta sempre foi a mesma especialidade da minha mãe, só que ela não facilitou a minha vida. Sempre deixou claro que eu só poderia atender na clínica depois de concluir a residência na área”.


E assim foi. Talita estudou muito e realizou a residência em Dermatologia. A mãe, orgulhosa, recorda que a filha passou em segundo lugar e teve a chance de escolher o local da residência. “Ela optou por Santos e, para a minha alegria, fui sua preceptora no Hospital Guilherme Álvaro”.


Hoje, Sonia encara como um grande presente de Dia das Mães a certeza de que terá na filha uma continuidade de seu trabalho, com a mesma energia e o mesmo comprometimento. “Ela agrega bastante no cotidiano da equipe. Trouxe uma dinâmica nova. Vamos juntas a congressos e cursos”.


Tanto companheirismo é visto como um privilégio por Talita. “A minha mãe sempre fez o melhor por nós. Ela não é apenas uma profissional exemplar, mas também uma mãe e uma mulher incrível”, finaliza.


Logo A Tribuna
Newsletter