Respire fundo e diga trinta e três

Eu sei bem que não tenho capacidade para isso, mas queria ser médico

Por: Renê de Moura  -  07/01/21  -  21:34
Poderia ser médico de qualquer especialidade
Poderia ser médico de qualquer especialidade   Foto: Divulgação

Eu sei bem que não tenho capacidade para isso, mas queria ser médico. Eu usaria jaleco branco. Calça branca. Camisa branca. Meia branca. Sapato branco. Cinto branco com fivela branca. Cueca branca. Relógio branco. As lentes dos meus óculos escuros seriam brancas. Meu crachá seria branco, escrito em branco. Não interessa se não iria dar para ler. Você me perguntaria e eu diria meu nome. Com “doutor’ na frente. Potz. Seria muito legal.


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Poderia ser médico de qualquer especialidade. Ortopedista, oftalmologista, pediatra... enfim. Poderia ser até médico de cabelo. Nem sei se existe médico de cabelo. Mas se existir, me indique. Sou careca há muito tempo e queria voltar a ter uma cabeleira para pintar de azul que está na moda. A tiazinha que mora do meu lado pintou. Parece que ela tem algodão doce de circo na cabeça.


Então. O legal de ser médico é que não precisa cumprir horário. A moça marca sua consulta as 15h, você chega as 14h e é atendido as 19h. Esse sistema se chama “eu-atendo-a-hora-que-eu-quero”. E quando você entra no consultório, o moço pergunta: “Tudo bem?”. Tá de sacanagem, doutor? Quem, estando bem, ficaria 5 horas esperando para ser atendido? Se eu estivesse bem teria ido embora.


Os médicos são ricos porque são econômicos. Nenhum consultório no sistema solar tem um cafezinho, um amendoim ou uma bolachinha. Ô povo avarento essa galera de medicina. Cara, quando muito, tem água. Sem gelo. Não tem WiFi, pô. Eles colocam você sentado durante um ciclo de vida numa cadeira de plástico (que vende no Extra por vinte reais) e não libera um sinalzinho de internet para você ficar vendo umas fakenews no Facebook. Sacanagem.


Eu tenho uma teoria de que eles devem pagar mal as pessoas que trabalham nos consultórios. Cara, todo mundo está sempre de mau-humor. Na última consulta que estive a moça me chamou de Rener. Eu corrigi, educadamente. Disse: “Meu nome é Renê”. A moça parou de escrever, foi virando a cabeça vagarosamente para mim e disse: “Isso não vai mudar o resultado do exame que o senhor trouxe”. Desde aquele dia, digo para as pessoas que meu nome tem um “r” no final. Nervosa aquela moça. Acho que é porque não tem café. Nem bolacha. Nem amendoim. Nem água geladinha. Nem wifi.


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