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Matheus Tagé

O mundo fantástico de Gabo

É possível ficar imerso em um livro por meio da dinâmica dos personagens, a trama e a ambiência

Matheus Tagé

6 de janeiro de 2025 às 06:33
(Reprodução)

(Reprodução)

Para quem sabia da opinião crítica do autor colombiano Gabriel García Márquez – morto em 2014 – acerca da possibilidade de adaptação do clássico Cem Anos de Solidão para o audiovisual, o anúncio do lançamento da série na Netflix deve ter sido um susto. Confesso que, antes de assistir ao trailer, tinha o mesmo receio. Pensava que seria uma tradução complicada demais. Afinal, há uma série de questões de materialidade que distinguem de forma contundente a narrativa literária da narrativa audiovisual. Como não romper com o processo desencadeado pelo imaginário das palavras decodificas em imagem? É possível que algo se perca no caminho. O problema seria manter a imersão com fidelidade.

É preciso deixar claro que, para que haja imersão, não precisamos necessariamente de óculos de realidade aumentada ou dispositivos tecnológicos. É possível ficar imerso em um livro por meio da dinâmica dos personagens, a trama e a ambiência. Quando não temos ilustrações, as palavras se metamorfoseiam em representações imagéticas, a partir do que houver em nosso repertório – isso torna a interpretação subjetiva. Por esse motivo, ao ler, escalamos a aparência, a voz, as expressões e o gestual dos personagens.

Nesse sentido, a linguagem de García Márquez provoca uma série de percepções estéticas acerca da história. Traduzir elementos do realismo mágico para o audiovisual seria um desafio. No entanto, é necessário pontuar: a série da Netflix é muito bem produzida. O elenco – majoritariamente colombiano – é incrível, os ambientes de Macondo são primorosos e a parte da trama que esta primeira temporada se dispôs a contar ficou muito bem estruturada.

Os personagens bem desenvolvidos conseguem trazer a essência do texto original. De jovem líder visionário a um homem enlouquecido por seus sonhos e alheio ao mundo exterior, o patriarca José Arcadio Buendía tem um dos arcos mais interessantes na adaptação. O predestinado coronel Aureliano Buendía também tem camadas bem construídas para sua transformação. Vale destacar as personagens Úrsula Iguarán, Arcadio e o cigano Melquíades. Há que se pontuar um outro elemento fundamental da adaptação: a casa.

O livro O Escândalo do Século, lançado em 2020, traz uma coletânea de artigos de Gabriel García Márquez editados em jornais e revistas. Há um texto publicado na revista Crónica, de Barranquilla, de junho de 1954 – mais de uma década antes do lançamento de Cem Anos de Solidão. O título é A Casa dos Buendía (Anotações para um romance). Cito um trecho: “A casa é fresca: úmida durante as noites, mesmo no verão. Situa-se no norte, no final da única rua do povoado, erguida num alto e sólido alicerce de cimento”.

Antes de sua obra-prima, Gabo traçava neste, e em outros textos, o que viria a ser uma das mais importantes histórias da literatura latino-americana. Na série, a atmosfera de realismo mágico do livro segue viva e muito bem adaptada. Boa semana!

Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
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