Reforma trabalhista portuária (Parte 3)

O presidente eleito apontou que uma das metas do novo governo será “aperfeiçoar os marcos regulatórios"

Por: Lucas Rênio  -  08/11/22  -  06:27
  Foto: Arquivo/Carlos Nogueira/AT

O presidente eleito, ao listar suas 13 propostas para a infraestrutura, apontou que uma das metas do novo governo será “aperfeiçoar os marcos regulatórios, com a participação das associações de usuários, ampliando a capacidade da infraestrutura e garantindo a modicidade tarifária”. Portos desenvolvidos, com custos adequados e um comércio exterior pujante, interessam a todos.


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Tudo isso com livre iniciativa e adequada proteção social. A sistemática da relação capital-trabalho nos portos, que já foi identificada como um gargalo por estudos técnicos do TCU e da OCDE, precisa de uma atualização que atenda aos principais anseios de trabalhadores, empresários e sociedade em geral.


Seja por iniciativa do Poder Executivo, ou diretamente através de projeto nascido no Parlamento, a regulação portuária trabalhista precisará ser modernizada. Os pilares normativos do trabalho portuário estão defasados, pois baseiam-se num modelo que foi concebido no início dos anos 90, destinado a vigorar transitoriamente. Ultrapassada, a lei 12.815/2013 tem se revelado incapaz de assegurar um ambiente regulatório positivo para o presente e o futuro do trabalho portuário. Um exemplo simples de que a referida lei encontra-se obsoleta é a descrição da atividade do Bloco: “limpeza e conservação de embarcações mercantes e de seus tanques, incluindo batimento de ferrugem, pintura, reparos de pequena monta e serviços correlatos”! É público e notório o fato de que os trabalhadores do Bloco já não realizam tais serviços há muito tempo, pois passaram a se dedicar a outras tarefas, como a de conexo de estiva.


Recentemente, quando falei numa palestra que precisamos avançar na implementação de nova regulação portuária trabalhista, um dos espectadores perguntou: o que isso quer dizer, na prática? Ao responder, mantendo a coerência da minha concepção de equilíbrio cooperativo entre capital e trabalho, disse que avançar significa atualizar e preparar, para o futuro, a legislação do trabalho portuário.


A atual lei não possui mecanismos que assegurem, aos trabalhadores do sistema OGMO, a efetiva fruição da verba bilionária existente para qualificação profissional retida no FDEPM. As aposentadorias e desligamentos voluntários também carecem de disposições efetivas, concretas, que garantam aos trabalhadores uma saída financeiramente tranquila do sistema.


A lógica de remuneração e progressão profissional é engessada: quais opções o TPA tem para conseguir, com esforço próprio, se destacar e almejar evolução nesse sentido? Os OGMOs, que ainda devem ocupar um papel relevante no Brasil por bastante tempo até que cheguemos a um sistema mais flexível, como o das ETPs (empresas de trabalho portuário), em Portugal, precisam ser dotados de ferramentas que lhes deem mais autonomia na gestão de ingressos, desligamentos e planos de carreira dos TPAs. Sim, planos de carreira! Por que não? A negociação coletiva é relevante, mas tem ficado paralisada diante do improdutivo debate sobre o sistema de vinculação empregatícia: prioridade x exclusividade. Esse ponto, que seria pacificado pela simples adoção de uma “preferência controlada” ou “exclusividade relativa” dos TPAs, tem sido um câncer para a saúde da relação capital-trabalho no porto.


A “exclusividade absoluta” foi criada para proteger os trabalhadores avulsos e doqueiros que estavam no sistema quando a lei 8.630/1993 entrou em vigor. Essa proteção cumpriu seu papel, e entre 2007 e 2013, o setor teve paz social com a prioridade.


Muitos avanços têm ficado represados por esse conflituoso ponto. Em Portugal, o histórico de modernização da legislação do trabalho portuário foi marcado por diálogo tripartite. Na Espanha e na Bélgica (Wet-Major), porém, as alterações têm sido impostas por decisões do Tribunal de Justiça da União Europeia, através da aplicação de princípios que muito se assemelham à livre iniciativa e à liberdade difusa de profissão (acesso livre ao mercado de trabalho). E no Brasil, que caminho seguiremos?


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