Reforma trabalhista portuária - parte 1

Sistema de transição criado em 1993 está prestes a completar três décadas e se encontra defasado

Por: Lucas Rênio  -  13/09/22  -  06:08
Portos eficientes são catalisadores de desenvolvimento econômico e progresso social nas comunidades em que se situam
Portos eficientes são catalisadores de desenvolvimento econômico e progresso social nas comunidades em que se situam   Foto: Carlos Nogueira

Portos eficientes são catalisadores de desenvolvimento econômico e progresso social nas comunidades em que se situam: há geração de empregos diretos e indiretos, evolução dos mais diversos setores produtivos (com destaque para o agronegócio e a indústria), aumento na circulação local de renda, incremento de arrecadação tributária etc. Conforme apontado em nota técnica da Secretaria Nacional de Portos e Transportes Aquaviários, estudo publicado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) “indicou uma correlação de 89% entre o crescimento econômico dos países membros da organização e o crescimento das exportações e importações” (Nota Técnica 10/2020).


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No caso de países como o Brasil, em que aproximadamente 95% do comércio exterior passa pela via marítima, esse papel transformador dos portos ocupa um protagonismo ainda maior na sociedade como um todo. O Banco Mundial, em estudos relativos à implantação de reformas estruturantes no setor portuário, destaca que a relação capital-trabalho é um dos principais nós a serem desatados em tais processos.


Em acórdão recente, no bojo de auditoria operacional relativa às limitações dos portos organizados no Brasil, o Tribunal de Contas da União (TCU) identificou uma série de deficiências no atual modelo de trabalho portuário brasileiro. Apontando entraves ligados ao sistema de vinculação empregatícia, o TCU asseverou ser “certo que o acesso à mão de obra portuária, nos termos das normas que hoje são vigentes, acarreta limitações à eficiência do setor que não existiriam num ambiente de livre concorrência para a contratação de trabalhadores”.


Em decorrência disso, a Corte de Contas recomendou que o Ministério da Infraestrutura (MInfra), com apoio da Agência Nacional de Transpores Aquaviários (Antaq), promova estudos e adote medidas “acerca do fornecimento de mão de obra portuária (...) objetivando a transição para um sistema que permita ganhos de eficiência ao setor portuário e estimule a capacitação e a especialização dos trabalhadores”. Essa auditoria do TCU, que também destaca problemas relacionados ao treinamento e à produtividade no âmbito do trabalho avulso, deixa claro que a competitividade, a evolução e o crescimento sustentável do setor portuário brasileiro passam, necessariamente, por uma reforma trabalhista portuária.


Inspirada na regulação portuária de Portugal, e nas normas da Organização Internacional do Trabalho (OIT) - Convenção 137 e Recomendação 145 -, a Lei Federal 8.630/1993 foi disruptiva, mas não implementou todas as medidas que se faziam necessárias para alinhar o trabalho portuário aos princípios constitucionais da livre iniciativa e da liberdade de profissão.


O que se instituiu, no contexto do que era politicamente viável àquela altura, foi um regime transitório. Nas palavras do relator do projeto de lei, o deputado federal José Carlos Aleluia, tratou-se de uma lei com caráter “gradualista de adaptação das novas regras ao costume e às posições radicais que precisam ser flexibilizadas em benefício de todos”. Tendo em vista que a Lei Federal 12.815/2013 não trouxe nenhum avanço em termos de relação capital-trabalho, o sistema de transição criado em 1993 está prestes a completar três décadas e se encontra altamente defasado.


A necessária e já atrasada reflexão sobre uma reforma trabalhista portuária deve englobar as seguintes questões (sem prejuízo de outras): 1) extinção de todo e qualquer tipo de reserva de mercado para contratação de portuários pela CLT; 2) derradeira proteção social para os trabalhadores portuários avulsos (TPAs) que compõem atualmente o sistema do Órgão Gestor de Mão de Obra (Ogmo); 3) modernização do sistema Ogmo, com reflexão sobre temas como o amplo acesso à verba para treinamento do Fundo de Desenvolvimento do Ensino Profissional Marítimo (FDEPM), a total autonomia para cancelar diretamente a inscrição de trabalhadores portuários avulsos improdutivos etc; 4) liberdade econômica e de iniciativa que inclua, dentre outros parâmetros, a definição de ternos e de remuneração independentemente de negociação coletiva; 5) limite de idade, com aposentadoria compulsória, e impedimento de que trabalhadores jubilados sigam participando do rodízio de avulsos. Cada uma dessas questões será objeto de análise detalhada, e sequencial, nos próximos artigos sobre trabalho portuário desta coluna.


Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
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