Mais areia na cova do combate à corrupção

O enterro da pauta de combate à corrupção pelo governo federal é uma das questões que me causam mais repúdio

Por: Júnior Bozzella  -  18/10/21  -  06:45
Atualizado em 18/10/21 - 06:49
 O enterro da pauta de combate à corrupção pelo governo federal é uma das questões que me causam mais repúdio
O enterro da pauta de combate à corrupção pelo governo federal é uma das questões que me causam mais repúdio   Foto: Gerd Altmann/ Pixabay

O Brasil vive hoje uma inversão de valores. O discurso da família e do combate à corrupção que defendemos em 2018 foi na prática enterrado pelo atual governo Federal. No que tange a proteção à família, no meu entendimento, ela sempre esteve ligada aos valores de ética e cidadania, mas também à promoção de políticas públicas que garantam moradia, educação, emprego, segurança alimentar e saúde para as famílias, e não ao egoísta e preconceituoso conservadorismo radical.


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O enterro da pauta de combate à corrupção pelo governo federal é uma das questões que me causam mais repúdio, por caracterizar a traição de toda uma nação. Essa semana a discussão da PEC 005/21 tomou contra do Congresso Nacional. A PEC da Vingança, como ficou conhecida por ser uma retaliação contra o Ministério Público que, desde o início da Lava Jato, em 2014, vem tirando o sono de inúmeros políticos, é mais um duro golpe às instituições democráticas e ao combate à corrupção no país. A proposta é a maior investida contra a autonomia do Ministério Público já apresentada desde a promulgação da Constituição de 1988.


A quem interessa castrar o Ministério Público? Aqueles que se sentem ameaçados por ele, ou seja, corruptos que transgridem as leis. A PEC 005/21 blinda políticos através das restrições impostas às ações do MP, seguindo exatamente o mesmo curso que houve na Itália após a Operação Mãos Limpas, onde os parlamentares aprovaram uma maneira de conter a ação dos órgãos públicos no combate à corrupção e ao crime organizado.


Os que defendem a PEC tem como único argumento sua autoproteção. A autorização ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) de anular atos de promotores e procuradores abre um enorme precedente para interromper ações do MP conforme os interesses pessoais e em detrimento do coletivo.


Não bastasse a PEC enfraquecer o Ministério Público, a proposta ainda altera a composição do CNMP, aumentando de 2 para 4 o número de indicados pelo Congresso no órgão, inclusive o corregedor-geral, que é a figura responsável por iniciar processos contra os procuradores. Em contrapartida, o número de indicados pelo Ministério Público da União cai de 4 para 3. A PEC tenta transformar o Ministério Público em vassalo do Congresso diminuindo drasticamente a independência do órgão e aumentando a interferência dos parlamentares. Quem ganha com isso? Apenas os corruptos. E quem mais perde como sempre é o Brasil e o povo brasileiro.


Aliado a isso há também o temor de que o texto possa ser aplicado retroativamente, o que poderia atingir diversas investigações da Lava Jato. Com o aumento das indicações políticas teremos menos independência e autonomia no Ministério Público e, consequentemente, nos serviços prestados.


Para ilustrar em números a importância do MP e os riscos que a instituição corre com a interferência política, de acordo com dados do próprio Ministério Público, nos últimos dois anos, as ações das investigações do MP resultaram na denúncia de mais de R$ 1,3 bilhão em sonegação fiscal, dos quais R$ 774 milhões já foram devolvidos aos cofres públicos. Mais de 100 pessoas foram presas e 22 agentes políticos afastados por crimes de ordem tributária.


A PEC da Vingança não aumenta o controle da sociedade civil sobre o MP, mas sim o controle dos parlamentares sobre sobre o Ministério Público e as suas ações. Mais uma proposta sacana onde a bancada governista tenta passar a boiada no Congresso Nacional para jogar ainda mais areia na funda cova em que o governo federal vem enterrando o combate à corrupção.


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