Uma promessa pela confiança do mercado

Título verde deve ser encarado como vantagem financeira e reputacional, porém precisa ser lastreado em ações efetivas

Por: Flavia Maya  -  09/09/23  -  06:09
A evolução da compreensão e aplicação dos parâmetros ideais de governança corporativa ocorreu de forma progressiva, e nem todas as empresas se dedicaram a investir imediatamente no aprimoramento dessa frente
A evolução da compreensão e aplicação dos parâmetros ideais de governança corporativa ocorreu de forma progressiva, e nem todas as empresas se dedicaram a investir imediatamente no aprimoramento dessa frente   Foto: Pixabay

Como uma advogada que atua na intersecção entre Direito e Desenvolvimento Sustentável, me interessa muito a jornada de empresas que estão começando a ter contato com o tema de sustentabilidade e impacto. É sempre interessante estar junto das empresas e ajudá-las a identificar oportunidades, montar um plano de ação e de se apropriar do significado de atuação sustentável, que para cada companhia deverá ter uma forma e um caminho a ser percorrido.


Eu considero o processo similar, guardadas as particularidades, ao que nós observamos há pouco mais de 20 anos no Brasil com relação à governança corporativa. A evolução da compreensão e aplicação dos parâmetros ideais de governança corporativa ocorreu de forma progressiva, e nem todas as empresas se dedicaram a investir imediatamente no aprimoramento dessa frente. As que o fizeram, contudo, obtiveram uma vantagem que talvez não fosse mensurável de imediato, mas que logo se reverteu financeiramente: a percepção de risco corporativo.


Voltando para o tema de Desenvolvimento Sustentável e Impacto, existem mais camadas de incentivo, como o fato de que essa talvez seja a única forma de conciliar o desenvolvimento econômico e, assumindo o risco de soar apocalíptica, a subsistência da espécie humana no nosso planeta. Mas o incentivo financeiro também é considerável, tanto em aspectos de eficiência e produtividade como também em relação à percepção de risco corporativo, já mencionada.


Para empresas que desejam dar um passo adiante e captar recursos junto ao mercado para financiar projetos - ou mesmo suas atividades de forma geral -, a percepção de risco se traduz em dinheiro na mesa. E é nesse momento em que os títulos verdes, denominação genérica para títulos atrelados a projetos ou metas socioambientais, se apresentam como uma vantagem.


Existem, claro, os títulos verdes com incentivos fiscais do Governo Federal, especificamente as debêntures incentivadas contempladas pela Lei Federal 12.431/2011. Ou seja, debêntures destinadas a custear projetos ambientalmente sustentáveis nos setores de logística e transporte, mobilidade urbana, energia e saneamento básico. O incentivo abrange a redução de alíquota de Imposto de Renda (IR), podendo chegar a zero para investidores pessoa física. Embora o benefício direto seja direcionado ao investidor, ele se reflete positivamente nas taxas e custo geral da operação.


Contudo, os demais títulos, destinados a projetos distintos daqueles abrangidos pela Lei 12.431/11, também representam vantagem competitiva. Isso porque, para que a emissão possa ser enquadrada em uma das categorias de títulos verdes, é preciso que ela apresente destinação clara relacionada a um dos objetivos de desenvolvimento sustentável.


Dessa forma, o próprio título se torna um compromisso corporativo com esses objetivos, aumentando o grau de confiança do mercado no papel e reduzindo, portanto, a percepção de risco da operação. Até porque, quando a garantia de um título é a reputação da empresa, o risco de descumprimento reduz consideravelmente.


Por esse aspecto, considero fundamental que o emissor possua já alguma maturidade em relação ao tema e tenha controle dos processos e riscos que possam afetar negativamente os compromissos a um título verde, de forma a evitar danos reputacionais.


Os títulos verdes, portanto, devem ser encarados sim como vantagem financeira e reputacional. Porém, eles precisam ser lastreados em ações efetivas, que reflitam uma cultura organizacional alinhada com os compromissos assumidos com o investidor. Isso porque, se por um lado o ganho de confiança gera benefícios financeiros mensuráveis, a sua perda perante o mercado poderá ser inestimável.


Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
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