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Fernanda Lopes

Doces gerações

Sobremesas revelam a idade

Fernanda Lopes

3 de maio de 2025 às 16:32
(FreePik)

(FreePik)

Sobremesas revelam a idade. Elas são compartimentadas em gerações. Manjar com calda de ameixa, curau, doce de abóbora, romeu e julieta... Pra muita gente nascida depois dos anos 2000, isso nem se enquadra na categoria sobremesa. Está mais pra hortifrúti ou ofensa, quem sabe?! Fios de ovos em bolos de aniversário, então?! Pode colocar datação de carbono. É jurássico, item de museu.

O que dirão, então, dos doces vidrados, tão refinados em tempos passados. Aquela casquinha parecida com vidro sempre me pareceu desnecessária, só mais uma barreira entre mim e o doce que ela guardava. Mas, para a minha avó, era a finesse em forma de quitute. Custavam uma pequena fortuna e enfeitavam mesas de casamento, bodas de ouro e aniversários de 15 anos. Era o Louvre das festas. Só que com mais açúcar e menos segurança.

Agora, a tal geração Z – aliás, só saber o nome das gerações já denuncia a idade, né? Só os mais novos têm isso na ponta da língua. Eu mesma preciso consultar o oráculo Google toda vez. Ajudando vocês, a Z é aquela nascida entre o meio da década de 1990 e o início da de 2010. Eles, se gostam de doces, é dos mais gourmetizados e estéticos, tipo o tal chocolate de Dubai com pistache e pó de ouro, ou versões funcionais, com chia, whey protein e pouca alegria.

Já os millennials... esses sabem fazer um drama na sobremesa. São fãs das taças vulcão, Grand Gateau — um petit gateau bombado — e, claro, banoffee e suas primas abrasileiradas: morangoffee, uvanoffee... virou sufixo fixo. Brigadeiros de colher, de pipoca, de Ninho com Nutella — a criatividade é tanta que, às vezes, o brigadeiro vira coadjuvante do próprio nome.
E antes deles, a geração X, que cresceu achando que Danoninho era item gourmet e sorvete de flocos, excentricidade de verão. Lembro da gelatina mosaico, basicamente um vitral comestível, e se errassem a mão, com textura questionável. E o arroz-doce? Sabendo fazer, é puro afeto, mas se for meia-boca vira comida de hospital.

Eu mesma já nasci com paladar de velha. Quando criança, um dos passeios da família era a Biquinha, em São Vicente, com suas barracas de doces. Naquela infinidade de opções, de cocadas a pudins, de maçã do amor a brigadeiros gigantes, sempre escolhia pamonha.

Enquanto minhas irmãs ficavam em dúvida sobre qual delícia açucarada iriam se jogar, eu já ia com a minha escolha na cabeça. Sou capaz de ainda sentir o gostinho dela quando fecho os olhos. Tem sabor de saudade.

Renata sempre queria maçã do amor, mas não era toda vez que minha mãe deixava. Ficava com medo dos dentes. Afinal, aquilo é um perigo cheio de corante, mesmo que no centro tenha uma fruta. Já Roberta variava entre os sabores de cocada. Verdadeira sommelière dos bolos prestígio da Cidade. Fanie já é do chocolate. Caçula, era acordada todos os dias com um Lolo ou barra de Surpresa ao lado do travesseiro deixado por nosso pai. Fez o mesmo com a raspa de tacho, Ana Luiza, uma geração Z raiz, rata de academia e adepta dos shakes saudáveis.

Mas todas, isso é unânime, tínhamos o manjar de Ano-Novo da vó, o bolo de frutas de aniversário da minha mãe e a bananada do meu pai como o suprassumo da doçaria. Isso não tem idade, geração ou gosto. É simplesmente sabor de conforto.

A tradição segue. De vez em quando me arrisco a fazer o bolo. E o manjar marca presença no Réveillon, com calda feita em casa e o pensamento em quem adoçou as nossas vidas e encheu elas de boas memórias.

Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
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