Por linhas tortas

Estados e municípios driblam o Planalto abertamente, sem que este pareça se incomodar em perder protagonismo

Por: Da Redação  -  11/03/21  -  09:17

Os avanços estruturais da organização política brasileira não resultam do que se faz para seu aperfeiçoamento, mas do que se deixa de executar, por omissão ou incompetência — ou, como tem sido nesta pandemia de covid-19, por ambas.


Clique e Assine A Tribuna por apenas R$ 1,90 e ganhe acesso completo ao Portal e dezenas de descontos em lojas, restaurantes e serviços!


Por décadas, o antigo MDB de Ulysses Guimarães e Franco Montoro evocou o “municipalismo”, sob o mote de que as pessoas não vivem na União nem no Estado, mas nas cidades. O Governo Federal preservaria seu papel maior. Porém, assegurando autonomia para prefeitos decidirem o melhor à população local.


Em outros termos, essa teoria ressurgiu, rediviva, quando o ainda candidato à Presidência Jair Bolsonaro prometia “mais Brasil, menos Brasília” caso eleito. Descentralização de decisões, agilidade em medidas urgentes, entrega à iniciativa privada daquilo que fosse ineficaz e custoso ao Estado.
Esse discurso, afinal, está sendo praticado em parte. Entretanto, por força de governos estaduais e municipais, que driblam o Planalto abertamente, sem que este pareça se incomodar com a perda de protagonismo. Do contrário, por convicções ideológicas, dele abdica em meio à mais dolorosa emergência sanitária da história do País. Mais mortal do que a gripe espanhola, tanto de maneira absoluta quanto proporcional, como este jornal mostrou ontem.


Pois aí está. Governadores não apelam ao Planalto para que busque mais vacinas no exterior, mas ao Congresso. Prefeitos se organizam em um consórcio cujo papel deveria caber ao Ministério da Saúde. Por linhas tortas, “mais Brasil, menos Brasília”.


O caminho para essa liberdade recém-descoberta por governantes regionais pode dar em um pântano: a imagem internacional que o Governo central vem transmitindo. É de se imaginar uma cena na qual a frente de prefeitos que se desenha leve uma proposta de compra de imunizantes a um laboratório, e representantes da empresa indaguem: “Onde está Brasília?”.


Ora, está pulverizada. A ponto de o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, eleito pelo Centrão com aval do Governo, se dirigir ao embaixador da China no Brasil, Yang Wanming, nestes termos: “O Governo brasileiro não é apenas o Executivo, mas também o Legislativo e o Judiciário”.


Legalmente, Lira tem razão. O Artigo 2o da Constituição reza que “são poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Contudo, sabe-se bem, e não só no Brasil, que o apelo da Câmara à solidariedade chinesa decorre do entendimento de que era preciso fazer algo ante a inação federal.


Em termos geográficos mais restritos, é desejável que o Governo do Estado atue com rigor científico e sem hesitações diante do avanço do coronavírus. Antes enfrentar o medo de aborrecer setores do que um cenário aterrador na Saúde. E que São Paulo logo se lembre dos profissionais da Educação, como prioridade, em esquemas vacinais.


Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
Ver mais deste colunista
Logo A Tribuna
Newsletter