Comparando as duas versões que já se tem do projeto de reforma do Imposto de Renda em menos de três semanas, fica a grande dúvida do que de fato será promulgado até o fim do ano. Enquanto o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), promete uma votação célere a tempo da proposta entrar em vigor já no próximo ano eleitoral, o equivalente de Lira no Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), está “relutante”, segundo o próprio ministro da Economia, Paulo Guedes. Lembrando a força com que a base aliada desfigurou propostas do próprio Executivo, como o da privatização da Eletrobras, não será surpreendente se o texto ficar bem diferente do que o governo pretendia ter votado.
Daqui para frente, alguns pontos populares devem ser preservados, como a faixa de isenção da pessoa física até a renda mensal de R$ 2,5 mil, metade do que o presidente prometeu em sua campanha eleitoral, mas pelo menos corrigindo a tabela do IR pela primeira vez desde 2015. Por outro lado, os parlamentares devem suavizar a barreira da renda média de R$ 3,333 mil por mês para ter o benefício da declaração simplificada.
O projeto de Guedes chegou inicialmente à Câmara em 25 de junho, entregue nas mãos de Lira, com boa repercussão no noticiário – mas nos dias seguintes, se tornando alvo das críticas de aumento de carga tributária, principalmente por parte das grandes empresas. Nesse período, o deputado Celso Sabino (PSDB-PA) assumiu a relatoria da proposta e, desde então, têm realizado reparos, segundo ele mesmo, mediante discussões com a equipe de Guedes.
Para compensar medidas como a revisão da tabela, o texto que se tem até o momento acaba com incentivos do PIS/Cofins para o setor industrial e o desconto da concessão do vale-refeição. Como consequência, segundo o jornal O Estado de S. Paulo, fabricantes de medicamentos, químicos, aviões e embarcações já se movimentam no Congresso para não perderem seus subsídios.
Em meio às conversas, veio à tona um racha no governo, dos chamados fiscalistas – basicamente servidores do Fisco preocupados com a arrecadação para sustentar o Estado gastador, mas cheio de demandas – e os liberais de Guedes. Este último tenta costurar uma redução de carga tributária, o que é bem positivo, porém, sob o risco de haver aumento da dívida se ocorrer um rombo acima do previsto com um novo sistema de impostos.
O que preocupa é o discurso da parceria Sabino-Guedes se basear na certeza de que a economia vai voltar a crescer e, dessa forma, a receita também irá aumentar e cobrir o rombo de R$ 30 bilhões que o parecer do deputado pretende deixar nas contas públicas. Entretanto, o Brasil tem apresentado um crescimento pífio, alternado com estagnação e até recessão profunda, há uma década e ainda não existem fundamentos econômicos que sustentem a ideia de uma era de prosperidade a partir do pós-pandemia.