Fundações nebulosas

O contribuinte assiste, impotente, ao despejo dos impostos que paga em finalidades nem sempre republicanas em partidos

Por: Redação  -  27/07/21  -  06:24
  Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

A dificuldade que partidos políticos têm em constituir uma alternativa de peso aos nomes de Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva para a corrida presidencial do próximo ano — a tão decantada terceira via — contrasta com a pujança financeira ostentada, em especial, pelas siglas com maior representação na Câmara dos Deputados.


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Reportagem publicada no domingo pelo jornal O Estado de S. Paulo mostra que siglas partidárias têm destinado percentual cada vez maior do dinheiro a que têm direito às fundações mantidas por elas. Trata-se de instituições cuja existência, obrigatória, se destina à capacitação de filiados para propor políticas públicas consistentes.


Todas as legendas devem ter uma fundação e lhes reservar, no mínimo, 20% dos recursos do Fundo Partidário. No entanto, conforme revelou a reportagem, esse índice está em alta. Em 2019, 22% das despesas dos partidos se deram com as fundações. No ano passado, 28%. Neste ano, considerado o primeiro semestre, um salto: 39%.


Em uma análise inicial, parece positivo. Afinal, significaria que, em média, quatro em cada dez reais repassados aos partidos estariam servindo para a educação política de seus filiados. Ideologias à parte, isso representaria formação embasada e sólida para membros que desejassem ou não disputar mandatos.


Não tem sido assim. A má qualidade explícita de governantes, em quaisquer esferas, seria suficiente para demonstrar as graves falhas de fundações nessa tarefa basilar. Custosa, também: desde 2019, partidos repassaram em torno de R$ 414 milhões para esses órgãos.


Há, também, um elemento que desperta compreensível desconfiança quanto à integridade e à moralidade desse sistema, ainda que sob amparo legal. Os partidos devem prestar contas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) quanto ao uso do Fundo Partidário. Contudo, como também apresenta a reportagem, o TSE ainda não está estruturado para analisar as contas das fundações de forma específica.


Dados do tribunal dão conta de que, no primeiro semestre deste ano, as siglas que alcançaram a cláusula de barreira receberam R$ 489,6 milhões do Fundo Partidário. Se 39% vão para as fundações, R$ 190,9 milhões podem estar, na pior hipótese, ao deus-dará.


Em suma, inexiste transparência a respeito do uso da verba enviada às fundações. De modo paralelo, como se tem dito e advertido há tempos, congressistas trabalham para expandir outro fundo: o Eleitoral, prestes a ser quase que triplicado para R$ 5,7 bilhões anuais.


O contribuinte brasileiro assiste, impotente, ao despejo dos impostos que paga em finalidades nem sempre republicanas — no sentido que a palavra tem, “coisa pública”. Com anuência da Justiça Eleitoral, lenta em coibir e punir abusos, partidos têm estrada livre para cuidar de interesses eleitoreiros. Por este ângulo, a ausência de terceira via ao Planalto parece menos inépcia partidária do que objetivo oculto.


Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
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