Precisamos recuperar a credibilidade

Precisamos recuperar minimamente, mas com urgência, o mínimo de dignidade nos cálculos das aposentadorias e pensões

Por: Sergio Pardal Freudenthal  -  16/10/23  -  07:32
 Litoral de SP recebe mutirão de perícias médicas do INSS
Litoral de SP recebe mutirão de perícias médicas do INSS   Foto: Marcelo Casal Jr./Agência Brasil

Em 1988, a Constituição Cidadã recuperou a dignidade do nosso sistema previdenciário – iniciado com a Lei Eloy Chaves, em 1923, e com princípios elencados na Lei Orgânica de 1960 – formando nossa Seguridade Social, com a Previdência mantendo seu caráter contributivo, e a Saúde e Assistência Social, sob responsabilidade do Estado. Dispôs garantias importantes como a atualização monetária dos salários que compõem a média e o piso mínimo das aposentadorias e pensões em um Salário Mínimo.


Trinta anos de políticas neoliberais, culminando com o Golpe de 2016, o desgoverno seguinte e a EC 103, em 2019. Conforme o colunista tem repetido inúmeras vezes, melhor seria a revogação das reformas trabalhista (2017) e previdenciária (2019). Porém, com muita urgência devem ser corrigidas as principais perversidades do texto legal nos cálculos.


A EC 103/2019, em seu artigo 26, dispõe os tenebrosos cálculos dos benefícios, “até que lei discipline”; ou seja, é uma regra transitória, que termina sua vigência através de lei ordinária, não precisa de emenda constitucional.


A média, de todas as contribuições desde julho de 1994, defende apenas um cálculo atuarial em defesa do sistema, com estatísticas e probabilidades, que nunca foi feito. Quem sai perdendo é o trabalhador, que esperava se aposentar mantendo um rendimento próximo ao que teria em atividade. Vale discutir o assunto, mas o pior de tudo são os percentuais aplicados nos cálculos das aposentadorias e pensões.


Desde 1995, qualquer aposentadoria por invalidez ou pensão por morte era calculada em 100% da base. A partir da EC 103/2019, todas as aposentadorias, até mesmo as por invalidez, passaram a ser calculadas em 60% da média para quem tiver até 20 anos de contribuição, somando-se 2% ao ano a partir do 21º ano.


E o cálculo da pensão por morte retrocedeu para os tempos da ditadura, em 50% da aposentadoria do segurado falecido, mais 10% para cada dependente.


Vale imaginar o João, com quase 20 anos de contribuições (trabalho sem registro não vale) e uma média de 5 mil reais, faleceu, deixando apenas Maria, sua esposa, como dependente porque os filhos já estão criados. A base de cálculo será a aposentadoria por invalidez do segurado se, ao invés de morrer, ficasse inválido, ou seja, 60% da média, sendo a pensão, apenas para a viúva, em 60%. Com tal cômputo, resta para a viúva 36% da média de contribuições do falecido, apenas 1.800 reais.


A Lei 8.213/1991, em sua redação original, determinava a aposentadoria por invalidez em 80% da média e a por idade em 70%, com o acréscimo, em ambas, de 1% para cada ano de contribuição, até o máximo de 100%. E, para a pensão por morte, valeria 70% da aposentadoria do falecido, acrescido de 10% para cada dependente, ou seja, no mínimo 80% e no máximo 100%.


Assim a base de cálculo do João, suposta aposentadoria por invalidez, com 19 anos de contribuição, seria em 99% da média, com a pensão por morte em 80%, alcançando então 3.960 reais. Bem mais justo.


Será importante corrigir a lei previdenciária, apresentando cálculos mais justos para as aposentadorias e pensões, e não se trata de matéria constitucional. Corrigidas tais perversidade, também será preciso recompor os benefícios dos que tiveram o azar de ter o início durante a vigência da maldade atual, desde a promulgação da EC 103, em 13/11/2019. Impossível recuperar o que deixaram de receber antes da nova lei, mas será importante garantir os valores futuros, devidamente recalculados, a partir da sua vigência. Como diria Odorico Paraguaçu, o Bem-Amado, “pratrasmente” a lei não vale, mas “prafrentemente” tem que ser igual para todos.


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