Como ficou a Pensão da Maria

A pandemia roubou João de Maria, com 20 anos de trabalho e quase 50 de idade

Por: Sergio Pardal Freudenthal  -  22/07/21  -  06:59
  Foto: Divulgação

A pandemia roubou João de Maria. Com 20 anos de trabalho e quase 50 de idade, o trabalhador contaminou-se, foi internado, entubado e morreu, deixando a viúva, com seus dois filhos quase criados.


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João trabalhou por longos 20 anos, nem sempre contínuos, na indústria petroquímica, sempre terceirizado. Casado com Maria há quase 25 anos, tiveram dois filhos, quase criados, já com mais de 21 anos de idade, mas ainda buscando suas vagas no mercado de trabalho.


Com o último emprego completando uma década, João teve que continuar trabalhando durante a pandemia, com a exposição continuada, desde o transporte coletivo para a indústria, até a atividade industrial em si, fazendo distribuição em toda a área e correndo risco de contaminação durante o período completo de trabalho.


Sem muita opção, foi contaminado e acabou não resistindo; João faleceu. A viúva Maria requereu a devida pensão por morte junto ao INSS, mas, quando recebeu o primeiro pagamento, ficou estarrecida com o valor do benefício.


Maria, pelo menos havia completado 45 anos de idade, e, portanto, tem direito à pensão vitalícia; ainda podia ser pior. E os filhos, maiores, não teriam direito algum. Ocorre que João estava longe de se aposentar. Com 20 anos de contribuição, sua aposentadoria por invalidez – base de cálculo para a pensão por morte – seria em 60% de sua média contributiva. Assim, se estivesse ganhando 5 mil reais, a invalidez lhe daria 3.000 reais por mês. A pensão por morte, apenas com a viúva como dependente, estaria em 60% da base de cálculo, ou seja, 1.800 reais. Ressaltando que Maria trabalhou bastante, mas dentro de casa, sem qualquer registro ou contribuição previdenciária, e, portanto, não teria direito à sua aposentadoria.


É mais um exemplo da perversidade nas reformas previdenciárias. O colunista já havia contado a história da Dona Leopoldina, que, um pouco mais nova, nem pensão vitalícia tinha. Mas o de Maria, também é um caso que merece ser pensado.


Esse advogado entende que a morte de João deve ser caracterizada como acidente do trabalho. Não seria uma doença


profissional, diretamente ligada à atividade, mas sim uma doença do trabalho, que só alcançou João em razão de sua obrigação laboral. Portanto, equivalente a um acidente do trabalho. O nexo causal, entre a moléstia que causou o óbito e o trabalho, é presumida; a contaminação não ocorreria sem a exposição do funcionário, no caminho do trabalho e em todo o tempo de atividade industrial.


A Emenda Constitucional 103, em 13/11/2019, retrocedeu muito nos cálculos da aposentadoria por invalidez e da pensão por morte (ofendendo o internacional Princípio do não Retrocesso), mas ainda manteve ambas em 100% da média contributiva nos casos de acidentes do trabalho e seus equiparados. Na morte de João, cabe até uma reclamação trabalhista exigindo indenização do patrão, que poderia ter zelado mais pelos seus empregados e nem mesmo cumpriu os devidos protocolos.


A diferença entre a pensão por morte previdenciária e a decorrente do acidente do trabalho ou seus equiparados bem representa a violência das novas regras. Vitoriosa uma ação judicial acidentária contra o INSS, o valor da pensão iria da bagatela de 1.800 reais para a média contributiva do trabalhador falecido, em torno de 5 mil reais. A briga é boa e bem demonstra os absurdos da reforma previdenciária.


Este artigo é de responsabilidade do autor e não reflete necessariamente a linha editorial e ideológica do Grupo Tribuna. As empresas que formam o Grupo Tribuna não se responsabilizam e nem podem ser responsabilizadas pelos artigos publicados neste espaço.
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