Rhodia: reparação aos trabalhadores da Baixada Santista já demora 30 anos

Fábrica que a indústria química mantinha foi fechada em 1993; trabalhadores contaminados e famílias ainda sofrem

Por: Luiz Guilherme Lima*  -  03/11/23  -  07:23
A Em 2002, a Rhodia anunciou a saída definitiva da Baixada Santista
A Em 2002, a Rhodia anunciou a saída definitiva da Baixada Santista   Foto: Arquivo/Rogério Soares/AT

Trinta anos após o fechamento da fábrica da indústria química Rhodia em Cubatão, representantes de ex-funcionários contaminados por poluentes ainda clamam por reparação às vítimas de um dos episódios mais graves de poluição ambiental ocorridos no País.


A questão foi lembrada no último dia 27, em um ato solene na Assembleia Legislativa, em São Paulo. Integrantes da Associação de Combate aos Poluentes (ACPO) acusam a Rhodia de não tratar o caso com a atenção merecida e alegam ignorar o nível atual de contaminação do solo nos locais onde estava instalada.


Também se apontou que houve lixões tóxicos e clandestinos da empresa ainda não encontrados e resíduos químicos descobertos, principalmente, na área de conservação de Pilões, em Cubatão, e na Área Continental de São Vicente.


No ato, o ex-funcionário Jorge da Silva, contaminado, recebeu uma homenagem póstuma da filha, Silvia. Ela relatou que o pai teve problemas renais e não recebeu assistência da empresa. “Meu pai teve de sair da Baixada e ir para São Paulo. Tiramos o dinheiro do nosso bolso. Não deram suporte, muito menos após a morte dele. Nem parece que ele trabalhou durante mais de três décadas na Rhodia”, comentou.


A médica Lia Giraldo relembrou que, quando foi criado o programa de saúde do trabalhador na rede pública, os primeiros pacientes eram da Rhodia.


Entre os trabalhadores afetados, estava o hoje aposentado João Amador, de 66 anos. Ele começou a trabalhar na Rhodia em 1986 e foi um dos contaminados. “Quando entramos na Rhodia, não sabíamos que tipo de equipamento de proteção eles iriam nos oferecer. Não havia roupa adequada. Eu me arrependo de ter trabalhado lá.”


Empresa responde:
Em nota, a direção da Rhodia alegou que “cumpre rigorosamente o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), relativo à sua unidade química de Cubatão, assinado pela empresa com o Ministério Público (Estadual) e o Sindicato dos Trabalhadores das Indústrias Químicas da Baixada Santista”. Em relação ao meio ambiente, apontou que os locais de responsabilidade da Rhodia na região “estão sob controle da empresa, monitorados e fiscalizados pelas autoridades, sem causar riscos às comunidades ou ao meio ambiente”, e que, nessas áreas, a empresa realiza projetos de recuperação ambiental, aprovados e autorizados pelos órgãos ambientais.


Quanto aos trabalhadores, a Rhodia disse que “cumpre rigorosamente os aspectos jurídicos e trabalhistas dispostos nos instrumentos normativos firmados pela empresa, para garantir o melhor atendimento de saúde dos trabalhadores de sua unidade de Cubatão” e tem atuado com “total transparência, pautando o relacionamento com os seus colaboradores e com a comunidade pela promoção dos valores da cidadania e da atuação responsável, em conformidade com suas práticas mundiais de desenvolvimento sustentável”.


Resíduos por décadas
Em 1965, a empresa Clorogil iniciou a operação em Cubatão, produzindo pesticidas organoclorados, popularmente conhecidos como pó da china. Quase dez anos depois, já como unidade da Rhodia, começou a produzir também solventes clorados. De 1974 a 1993, geraram-se cerca de 20 toneladas de resíduos tóxicos. Na metade dos anos 1970, pela falta de espaço em armazenamento na fábrica, rejeitos tóxicos eram descartados de maneira considerada inapropriada.


Em 1978, a Companhia Ambiental do Estado (Cetesb) registrou a primeira denúncia de problemas de saúde dos trabalhadores, mas não houve punição. Entre 1982 e 1985, os funcionários conseguiram consolidar as conquistas trabalhistas relacionadas ao caso. Em seguida, os locais de despejo clandestino começaram a ser ocupados pela população de baixa renda, por desconhecimento dos riscos. O Ministério Público Estadual (MPSP) abriu investigação, afirmando que solo, água, legumes, frutas e peixes foram contaminados.


Nos anos seguintes, lixões químicos foram descobertos. A Rhodia alegava ter herdado o problema da Clorogil, mas foi condenada a isolar as áreas contaminadas e remover todo o solo contaminado.


Em 1992, trabalhadores da fábrica de solventes clorados descobriram hexaclorobenzeno na corrente sanguínea e alegaram que a empresa omitiu a situação. Após denúncia ao MPSP, uma inspeção constatou a contaminação ambiental do local e os riscos à saúde dos funcionários. No final daquele ano, um deles morreu com suspeita de intoxicação pelos poluentes da Rhodia.


No ano seguinte, a Justiça concedeu liminar interditando a fábrica. Em 2002, a Rhodia anunciou a saída definitiva da Baixada Santista.


(*) Reportagem feita como parte do projeto Laboratório de Notícias A Tribuna - UniSantos sob supervisão do professor Eduardo Cavalcanti e do diretor de Conteúdo do Grupo Tribuna, Alexandre Lopes


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