Fórum pede melhores condições para envelhecimento saudável em Santos

Carta aberta apresenta uma série de medidas, se antecipando ao crescimento da população idosa local

Por: Igor Castro e Gustavo Bertoldi*  -  01/11/22  -  19:44
Atualizado em 02/11/22 - 14:26
Instituições consideram ineficazes políticas públicas implementadas atualmente
Instituições consideram ineficazes políticas públicas implementadas atualmente   Foto: Eliza Montrezol/Arquivo Pessoal

Seis instituições representantes da sociedade civil se uniram em busca da construção de um novo paradigma sobre o envelhecimento e a implantação de mais políticas públicas para a terceira idade em Santos.

Recém lançada, a Carta Aberta do Fórum do Envelhecimento Saudável encaminha 19 propostas que visam garantir a dignidade dos idosos. Entre elas, se destacam medidas como a implementação de políticas públicas que levem em conta identidade de gênero, raça, local de moradia e renda, além da criação de espaços de acolhimento na modalidade Casa-Dia.


As reivindicações incluem também a ampliação de oportunidades para os idosos, além da realização do Censo da Pessoa Idosa de Santos e suporte ao cuidador familiar. As instituições que assinam a carta são o Conselho Municipal do Idoso, o Instituto Energia, o Fórum da Cidadania de Santos, a Fundação Settaport, o Rotary Club de Santos Aparecida e o Sesc-Santos.


"O Brasil deve reconhecer que sua população está mudando, que ela será formada, predominantemente, por pessoas de idade, ao invés de jovens”, afirma Eliza Montrezol, presidente do Instituto Energia.

Segundo ela, as propostas foram criadas para que a sociedade se envolva na discussão sobre o envelhecimento. “Futuramente, a sociedade estará estabilizada de tal forma que as gerações que se tornarão idosas possuam outras necessidades, e não as mesmas que necessitamos hoje".


O corpo humano, durante seu desenvolvimento, é caracterizado por perdas orgânicas, o que resulta em maior fragilidade na fase do envelhecimento. "Não podemos perder a perspectiva de que a velhice precisa de cuidados", defende.


Eliza Montrezol considera ineficazes as políticas públicas implantadas atualmente, porque elas só garantiriam a segurança do envelhecimento de uma minoria da sociedade.

"Realizam serviços para os idosos que estão na Zona Leste, na praia. Mas e os que estão nos morros? E os que estão acamados?", questiona. "As políticas públicas precisam responder às necessidades dos idosos, qualquer que seja a condição social deles”.


Rosiran Carvalho: envelhecimento deve ser olhado sob a perspectiva do social e do coletivo
Rosiran Carvalho: envelhecimento deve ser olhado sob a perspectiva do social e do coletivo   Foto: Rosiran Carvalho/Arquivo Pessoal

Longa permanência - A professora e assistente social Rosiran Carvalho, 60 anos, autora do livro Envelhecimento com Dependência e o Debate do Cuidado como Direito Social, diz que o Brasil tem pouco mais de 3 mil instituições de longa permanência, e que apenas 5% delas são públicas. Ela considera esse número insuficiente para um país com mais de 30 milhões de idosos.


“Pelos poucos serviços ofertados aos idosos em situação de dependência, eles ficam à mercê apenas dos cuidados da família. Algumas têm estrutura e condições para o cuidado, mas muitas não”, explica. Para ela, o envelhecimento é um fenômeno demográfico que deve ser olhado também sob a perspectiva do social e do coletivo.


A ida para uma instituição de longa permanência ainda é algo pouco falado no Brasil, aponta Rosiran. Ela diz que existe preconceito, derivado da sensação de culpa nas famílias.

“Quando o idoso está em um grau de dependência elevado, e a família não tem recursos, é recomendado que ele vá para essas instituições, que devem ser pensadas como um espaço de convivência e cuidado digno, não como depósito”, argumenta a professora.


Para Rosiran Carvalho, uma outra questão importante é a dos idosos que estão sozinhos. “Segundo o IBGE, 15% das pessoas idosas do Brasil moram sozinhas. Como vai ser quando estiverem mais debilitadas? Quando elas não conseguirem prover os próprios cuidados?”, questiona. “Provavelmente ficarão na rua. Estamos cada vez mais próximos de um futuro em que muitos idosos terão de morar na rua, e só é possível evitar isso por meio de políticas públicas”.


Rosiran lembra que o Brasil possui legislação nessa área, como o Estatuto do Idoso, os sistemas de proteção social, direito à saúde, e outros.

“Legislação não falta. O que falta são iniciativas para efetivar esses direitos, e para isso, a mobilização social é necessária. Todo direito social é conquistado com muita luta, e esse não será diferente”, diz.

Por isso, ela considera a carta importante, principalmente numa cidade como Santos, onde os mais de 100 mil idosos representam 24,2% da população, número que tende a crescer.


Transição demográfica

Patrícia Morsch, da Organização Pan-Americana da Saúde, considera esta a década do envelhecimento. Ela diz que, dentro de 10 anos, ocorrerá uma transição demográfica completa. Isto é, a população idosa representará a principal faixa etária na maioria dos países, incluindo o Brasil.

Esse fenômeno deve ocorrer pelo aumento da expectativa de vida e pela diminuição da taxa de natalidade, que é uma tendência no mundo inteiro.


Para Patrícia, os países devem se preparar para essa transição demográfica, porque ela trará grandes mudanças na sociedade. “Se a gente não se preparar e não promover um envelhecimento saudável, veremos problemas com as necessidades e dependências de cuidado, um aumento de doenças crônicas”, afirma.


Ela também considera necessária uma adequação do trabalho. “Já existem muitos preconceitos associados à idade no mercado de trabalho, como a aposentadoria compulsória, por exemplo. As pessoas têm de ter oportunidades, se querem continuar trabalhando, e se desenvolvendo, mesmo com idade avançada”.


No futuro, argumenta Patrícia, pode haver um problema de financiamento, de recursos à disposição das pessoas idosas, e elas podem cair na pobreza com uma idade elevada. “Todo mundo quer vida longa e saudável, mas a gente precisa se adequar a isso”, explica.


A maioria dos países não está preparada, especialmente na América Latina, segundo ela. Os países mais desenvolvidos já estão em processo de envelhecimento, e puderam adaptar as respectivas políticas de acordo com essas necessidades específicas da população envelhecida.

“Nesse momento, no Brasil, temos uma população de pessoas idosas que vão necessitar de cuidados. Então, precisamos adequar os serviços, assim como as políticas públicas, para esse contingente”.


*Reportagem feita como parte do projeto Laboratório de Notícias A Tribuna - UniSantos sob supervisão do professor Eduardo Cavalcanti e do diretor de Conteúdo do Grupo Tribuna, Alexandre Lopes.


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