Festival Música Nova chega à 56ª edição como a cara da vanguarda musical erudita brasileira

O evento, que ocorre entre os dias 21 e 26 de março, amplia seu alcance e importância cultural

Por: Pedro Porto*  -  19/03/22  -  14:10
Márcio Barreto, diretor artístico do festival: espaço para os compositores santistas
Márcio Barreto, diretor artístico do festival: espaço para os compositores santistas   Foto: Márcio Barreto/Arquivo pessoal

Reconhecido como o mais duradouro e importante festival de música contemporânea da América Latina, o Festival Música Nova Gilberto Mendes, organizado pela Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, chega à sua 56ª edição. Mais uma vez, ele acontece on-line, modelo adotado desde 2020, com a chegada da pandemia.


Ao todo, serão mais de 30 ações artísticas, incluindo eventos como concertos, palestras, oficinas e sessões de videodança, cinema e literatura. O festival acontece anualmente e, além de concertos sinfônicos, apresenta palestras, mesas-redondas e outras atividades.


O diretor artístico do evento, Márcio Barreto, 52 anos, explica que há destaque para os compositores santistas, na Escola Santista de Música Nova. “Era um núcleo de pesquisa desenvolvido pelo próprio Gilberto Mendes. Compositores e músicos como Antonio Eduardo Santos, Gil Nuno Vaz, Silas Palermo e João Carlos Rocha, que atualmente mora nos Estados Unidos, entre outros, são nomes expressivos desse movimento”, diz Barreto. As cidades de Santos, São Vicente e Cubatão têm forte participação no festival e, nesta edição, apresentarão concertos, palestras, videodança e curtas-metragens.


Antonio Eduardo Santos, 64 anos, coordenador da Cátedra Gilberto Mendes da Universidade Católica de Santos, conta que a música contemporânea sempre fez parte de sua vida como pesquisador, maestro, pianista, intérprete e educador.

“O Festival Música Nova de Santos segue firme na sua característica de ser um painel da música contemporânea em sua diversidade de propostas e estéticas. Assim foi desde o começo, em 1962. Trazê-lo para Santos e mantê-lo na cidade, que foi o berço do movimento, faz de nossa cidade o núcleo histórico da renovação da linguagem musical no Brasil”, relata.


O lendário compositor Gilberto Mendes, fundador e principal referência do Festival Música Nova
O lendário compositor Gilberto Mendes, fundador e principal referência do Festival Música Nova   Foto: Divulgação/Festival Música Nova

Para o compositor Gil Nuno Vaz, 74 anos, houve uma “imersão profunda” no que pode ser chamado de “espírito” do Festival. “Houve uma concepção atemporal da Música Nova”, comenta. “Não apenas o conceito da “Neue Musik” que protagonizou o cenário musical na época em que o evento foi criado, mas a música nova de todos os tempos, um diálogo do contemporâneo com a invenção de outros séculos. Prefiro pensar como música nova atemporânea, numa descontextualização verbal do contemporâneo e da vanguarda”.


O maestro regente do Madrigal ARS Viva, Roberto Martins, 78 anos, concorda com Gil Nuno. Para ele, o festival é um fenômeno internacional, que não se restringe a compositores brasileiros. “Aqueles que aderiram ao tipo de música, de experimentação que estava sendo mostrado, eram representados pelo festival. Muito raramente se mostrava música que não era da linha experimental, mas acontecia. Em algumas ocasiões, o festival misturou, por exemplo, música medieval com música contemporânea”, relembra o maestro.


Martins também esclarece que o objetivo não era tocar música nacionalista, mas música brasileira. “Não era um movimento fechado. Nunca houve preconceito. O festival tem sido um reflexo do que mais de novo se faz em música entre os séculos XX e XXI”.


Roberto Martins: festival é um fenômeno de alcance internacional
Roberto Martins: festival é um fenômeno de alcance internacional   Foto: Roberto Martins/Arquivo pessoal

Diósnio Machado Neto, 56 anos, professor da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP, figura ativa no cenário cultural de Santos, admite que o Festival Música Nova nunca teve grande presença de público. “As pessoas que vão aos concertos são pessoas interessadas, ou amigos dos compositores e músicos. Não é um evento de massa, muito longe disso. Eu acompanhava o Gilberto (Mendes) nos concertos, e sempre era um público diminuto e bastante seleto, se restringia a pessoas que gostavam ou tinham convivência com a música de concerto”.


Machado explica que as pessoas vinculadas ao festival encabeçaram uma grande transformação estética na música acadêmica do Brasil. “Trouxeram linguagens que estavam sendo discutidas nos principais centros europeus, como o aleatorismo e o serialismo integral, ou seja, fizeram uma grande atualização também com a música eletroacústica”. Para ele, o festival sempre foi um espaço de atualização das técnicas de composição e, ao mesmo tempo, uma ponta de lança que quebrava a dominância que havia da “música modernista nacionalista”.


*Reportagem feita como parte do projeto Laboratório de Notícias A Tribuna - UniSantos sob supervisão do professor Eduardo Cavalcanti e do diretor de Conteúdo do Grupo Tribuna, Alexandre Lopes.


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