Queda no setor da construção por causa de pandemia pode ser de 23%

Segundo CBIC, projeção feita por economista de banco aponta crise menos dura que a de 2008

Por: Marcelo Santos & Da Redação &  -  26/04/20  -  22:07
Obras do Ambesp Central de Santos devem ser concluídas em outubro
Obras do Ambesp Central de Santos devem ser concluídas em outubro   Foto: divulgação/ Prefeitura de Santos

Entre as apostas para o mês o qual o setor da construção espera voltar a operar com mais força está agosto. Há também estudos que apontam uma crise muito forte, mas em um ritmo inferior ao baque do caos financeiro de 2008, quando o governo injetou muito dinheiro na economia e lançou o Minha Casa, Minha Vida para estimular o mercado imobiliário.


O grande problema para o construtor vislumbrar um horizonte de recuperação e investir com força ou mesmo o comprador assinar contrato é o acúmulo de crises. Simultaneamente à paralisação imposta pelo coronavírus há a queda do barril do petróleo. No Brasil, a desvalorização da commodity fulmina o caixa da Petrobras e a arrecadação de royalties, lembrando que há ainda um forte recuo da receita de estados e municípios com impostos. 


O economista-chefe do Secovi, Celso Petrucci, afirmava animado logo no início da live de A Tribuna que acreditava que o setor da construção retomaria fôlego já em agosto, não ainda no mesmo ritmo de fevereiro, mas o suficiente para aquecer os investimentos. “Mas após a notícia da demissão do ministro Sergio Moro e a possibilidade de impeachment, sou economista, mas não astrólogo”, brincou ele.


Portanto, além dos problemas de saúde e do petróleo, há uma crise política ainda a ser contabilizada e que pode expandir as incertezas nos investimentos e no consumo. 


Queda nas vendas


Petrucci contou ainda que em uma live com economista do Bradesco, o representante do banco apresentou uma pesquisa sobre a perda do setor com o coronavírus, com queda estimada das vendas entre 21% e 23%, inferior ao recuo de 45% na crise de 2008. Nessa época, o gigantesco volume de crédito ofertado a compradores de imóveis de baixa capacidade de pagamento nos Estados Unidos fez uma bolha imobiliária estourar, quebrando bancos e contaminando o mundo todo. 


Na época, o Governo Lula injetou muitos recursos na economia, que puxaram fortemente o Produto Interno Bruto, que não se tornou sustentável devido ao endividamento público. Agora, os economistas afirmam que o grande erro foi perpetuar essa injeção que asfixiou o caixa público. Por isso, defendem o atual socorro de forma transitória. 


De acordo com Petrucci, o setor sofreu o auge de sua crise na recessão de 2014-2015, que perdurou na construção até 2016. Santos sofreu com o naufrágio do sonho do petróleo, que estimulou muitos investimentos imobiliários que até hoje mantêm excesso de oferta. “Esse período (2014 a 2016) finalizou com o impeachment, o pior em 20 anos”. 


A Capital, entretanto, teve no ano passado uma recuperação forte e a esperança era que continuasse neste ano. Como São Paulo serve de termômetro e locomotiva, o mercado achava que seguiria os passos paulistanos. Mas a covid-19 frustrou as expectativas.


Retomada


Para Petrucci, o mercado imobiliário vai retomar fôlego de forma pontual e gradativa, com os empreendimentos do Minha Casa estando à frente. Há ainda a expectativa de faturar com a demanda reprimida dos compradores de classes média e alta. “Nosso produto vai sair fortalecido em relação a outros ativos financeiros (o setor concorre com a bolsa e papéis financeiros por investimento)”.


Tendências do Mercado


Imóveis corporativos


Para os representantes da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), o segmento corporativo do mercado imobiliário (edifícios de escritórios) sentirá profundamente os reflexos do uso de tecnologias de comunicação nas empresas, que devem investir mais em home office. A expectativa é que os inquilinos vão exigir instalações mais compactas. A referência para isso é a XP, que durante a covid-19 descobriu que pode manter mais de 2 mil funcionários em teletrabalho com a mesma eficiência do modelo presencial.


Defesa do FGTS


O economista da CBIC e Secovi, Celso Petrucci, critica os contínuos saques de recursos do FGTS, como é o caso da medida provisória 946, que prevê liberação de R$ 40 bilhões. Petrucci foi conselheiro do fundo durante dez anos e lembra que 75% do mercado imobiliário são financiados com esses recursos. Ele afirma que o FGTS é mais importante do que a caderneta de poupança para o crédito imobiliário e que também financia o saneamento básico.O FGTS não ajuda apenas a baixa e média rendas. Petrucci diz que o fundo cobre imóveis de até R$ 1,5 milhão. 


Distratos em queda


O distrato, que é a possibilidade
do comprador desistir do imóvel na planta, não ganhou força com a crise da covid-19. O temor era de uma onda de devoluções devido ao medo do desemprego ou de uma desvalorização. O distrato castigou as construtoras, inclusive as da Baixada Santista, nos anos 2010, quando até metade das unidades de um mesmo empreendimento era devolvida devido à frustração do investidor com uma valorização abaixo do esperado. O conflito inundou a Justiça de processos,mas uma nova legislação disciplinou os distratos, segundo analistas do setor. Para a CBIC, hoje não há mais possibilidade de ganhar retornos de 14% com a taxa Selic, o que dificulta a fuga de investidores da construção. 


Segmento de materiais


O segmento de varejo de materiais da construção, muito voltado a reformas ou construção de casas direto pelo proprietário, está sofrendo fortemente neste momento, segundo um participante da live de  A Tribuna com a BIC.


O representante da CBIC, Carlos Henrique Passos, alerta que o nicho da obra individual até o momento não conta com crédito previsto nas atuais medidas da Caixa. “Tem fábrica (de materiais) que atendia mais o varejo e cujas vendas caíram 70%”. O dono preferiu desativá-la.


Obras continuam, mas com restrições


Enquanto o País conta com uma média de 80% dos canteiros de obras ainda em execução, em comparação ao período pré-coronavírus, no Estado de São Paulo essas operações estão entre 90% e 95%, segundo a Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC). 


De acordo com o vice-presidente de Habitação de Interesse Social da CBIC, Carlos Henrique Passos, a paralisação foi total apenas em Pernambuco, Ceará e Piauí, enquanto Goiás retornou aos trabalhos na semana passada. 


Entretanto, a produtividade não é a mesma do pré-coronavírus. As construtoras trabalham com restrições para reduzir aglomerações no local de obra, como evitar vários operários no local das refeições e muita gente batendo ponto ao mesmo tempo, além de afastar quem tem mais de 60 anos ou possui doenças do grupo de risco. 


Em Salvador (BA), obras de reforma em imóveis com moradores foram proibidas. Passos conta que o funcionário de uma obra de urbanização na Avenida Sete de Setembro, na capital baiana, foi o primeiro do setor a ser diagnosticado com covid-19. 


Reconhecimento


Segundo o vice-presidente da Área Imobiliária da CBIC, Celso Petrucci, as empresas seguem protocolos de operação durante a pandemia para evitar contaminação. “Houve reconhecimento de que a atividade da construção não pode parar”, aponta. 


Ele afirma que na Capital há 700 obras do mercado imobiliário e que 90% do efetivo atuam nos canteiros. Dos trabalhadores, um a cada dez tem mais de 60 anos ou é portador de doença de risco.


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