Jovem transexual de Santos é impedida de usar banheiro em lanchonete: 'Constrangimento'

Vítima acusa estabelecimento, localizado no bairro Boqueirão, de transfobia

Por: Bruno Almeida  -  19/01/22  -  07:54
Para jovem de Santos, episódio foi transfóbico
Para jovem de Santos, episódio foi transfóbico   Foto: Arquivo pessoal

Uma jovem transexual de Santos registrou um Boletim de Ocorrência contra uma lanchonete no bairro Boqueirão, porque afirma ter sido vítima de transfobia dentro do estabelecimento, que fica na Avenida Conselheiro Nébias.


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Em entrevista para A Tribuna nesta terça-feira (18), a vítima de 28 anos, moradora da Zona Noroeste de Santos, conta que saiu da praia com familiares e amigos, e foi ao restaurante Surf Dog, onde o grupo pediu alguns lanches. Enquanto a conta era paga, a cabeleireira e nutricionista Julie Correia de Araujo pediu a um funcionário para usar o banheiro.


"Perguntei onde era e ele apontou para o masculino. Perguntei onde era o feminino e ele falou que eu não poderia usá-lo. Foi um constrangimento", lembra.


A jovem pediu para falar com o responsável pela unidade, que estava no local. Segundo Julie, ele confirmou o posicionamento transfóbico do funcionário. "Ele falou que realmente teria que usar o masculino, virou as costas e saiu andando".


De acordo com a vítima, outros clientes, que também comiam no local, a apoiaram. "Uma moça me ajudou e apontou onde era o banheiro feminino. Ficaram do meu lado. Foi a primeira vez que isso aconteceu comigo, de alguém tentar me deslegitimizar como mulher".


A vítima pretende entrar na Justiça contra a lanchonete. Nesta segunda-feira (17), um dia depois de o episódio acontecer, um Boletim de Ocorrência foi registrado no 7º Distrito Policial de Santos, onde o caso é investigado.


Outro lado

A Tribuna fez contato com o Surf Dog. Por telefone, um homem que se apresentou como dono da lanchonete inicialmente afirmou que não queria falar sobre o ocorrido. A Reportagem insistiu e ele disse que "como o local estava cheio, nem vi nada".


Após ser questionado pela terceira vez se não gostaria de comentar o caso, ele, enfim, confirmou ter visto o ocorrido e disse que estava ao lado do funcionário que não quis indicar onde era o banheiro feminino. "Ele (referindo-se erroneamente à mulher, Julie) saiu chamando o rapaz de 'baiano' e idiota, de não sei o quê. As câmeras filmaram tudo". A Reportagem ofereceu espaço para divulgar as imagens e comprovar a versão, mas ele disse que "não tem interesse nenhum".


"Não sou contra ninguém, graças a Deus. A pessoa pode ser o que for. Ladrão, pu**, vi***. Homem, branco, preto, todo mundo é ser humano", finaliza.


Discriminação em Santos


No começo do mês, Milena Augusta da Silva, também mulher transexual, acusou o Six Sport Bar, no Gonzaga, em Santos, de discriminação ao ter sua comanda cadastrada com o valor cobrado para homens. Milena disse ter sido bem recebida na entrada da casa, mas, ao cadastrar a comanda de consumação, a funcionária que viu seus documentos lhe atribuiu o gênero masculino. Segundo o bar, funcionários se desculparam e, na sequência, atribuíram a ela o gênero correto no cadastro.


Para a diretora da Associação da Parada do Orgulho LGBT de Santos (APOLGBT), Flavia Bianco, "o reconhecimento da identidade de pessoas trans é uma luta histórica dessa população", diz.


"Mesmo assim, ainda temos vários exemplos de desrespeitos". Segundo Flavia, o não uso do nome social (nome pelo qual pessoas transgêneros e travestis geralmente querem ser chamadas, e que é diferente do nome oficialmente registrado), e questões como acessos a banheiros e locais com distinção por gênero são exemplos dessas agressões.


Segundo ela, respeitar a identidade de alguém "é básico em nossa Constituição. É sobre identidade, sobre dignidade. Estamos em janeiro, mês da visibilidade trans, e apenas essa visibilidade, a conscientização para os alarmantes números da violência contra trans e a educação inclusiva em todas as esferas podem fazer com que a sociedade avance. Falar sobre o assunto, contar historias de vida, humanizar a figura dessas pessoas é o caminho para se entender que todos somos iguais graças a nossas diferencas".


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