Aposentado muda vida de moradores de rua com café da manhã em Praia Grande: 'Minha fé aumentou'

Gernival Siqueira da Silva, de 67 anos, perdeu R$ 2 milhões e uma empresa que mantinha 30 colaboradores. Ele precisou recomeçar do zero para se reerguer e aposentar

Por: Jean Marcel  -  03/02/21  -  12:51
Gernival mudou-se em 2019 para Praia Grande, quando começou a ajudar as pessoas na rua
Gernival mudou-se em 2019 para Praia Grande, quando começou a ajudar as pessoas na rua   Foto: Arquivo Pessoal

Gernival Siqueira da Silva tem 67 anos e três filhos, é de Santo Anastácio, interior de São Paulo, mas ele, na verdade, passou a maior parte da vida no Mato Grosso do Sul. Desde 2019 mora em Praia Grande, no bairro Aviação. Todas as manhãs o aposentado e a esposa Ione, de 58 anos, acordam cedo e preparam o café da manhã que ele carrega em sua bicicleta adaptada para levar os mais de 50 litros de chá, achocolatado, pão e bolachas para moradores em situação de rua, e até ração para cães e gatos.


Clique e Assine A Tribuna por apenas R$ 1,90 e ganhe acesso completo ao Portal e dezenas de descontos em lojas, restaurantes e serviços!


No início o trabalho era feito de carro, mas com a dificuldade de estacionar e por juntar pessoas em volta ele mudou a estratégia. "Passei a fazer com a bike, porque eles não precisavam vir a mim, e assim eu vou onde eles estão, e levo o café da manhã", conta. Segundo ele, a ideia é de ampliar a ajuda: "Como a colaboração de amigos aumentou, estou pretendendo servir o almoço, e na parte da tarde eu vou dar assistência com roupas e cuidados com a higiene".


Em sua bike há também espaço para levar ração e alimentar cães e gatos
Em sua bike há também espaço para levar ração e alimentar cães e gatos   Foto: Arquivo Pessoal

Na rua, além de alimentar e levar palavras de estímulo, o aposentado também encontra vários testemunhos de quem está trabalhando ou deixou de usar as drogas depois de terem se conhecido, e param para agradecer ou contar sobre as mudanças. "A ação tem um impacto muito grande no coração das pessoas, muitos estão ali pelos mais variados motivos, cada um tem sua história", contou.


Marcos José Monteiro de Araujo é um desses. Atualmente trabalha dirigindo um caminhão de entregas. "Eu estava na rua, e graças a Deus e a este homem que apareceu todos os dias para me trazer um café e me ajudar, tudo mudou. Eu vivia debaixo de um cobertor, e hoje consegui um emprego. Há 25 dias eu estou limpinho, cheiroso, e até a minha fé aumentou. Não desista, persista! Esse é o segredo", disse o motorista.


Além desse caso, Gernival lembra-se também de uma senhora que usava drogas, e ao reencontrá-lo nas ruas, disse que voltou a trabalhar e até comprou uma bicicleta, e outros que voltaram para suas famílias ou também começaram a trabalhar ao receber a injeção de ânimo do aposentado.


Gratificante


Além de casos assim, ele conta que é comum também encontrar pessoas que passam a replicar sua atitude começando trabalhos de ajuda, ou oferecendo doações. "É mais gratificante para quem faz, eu penso. A gente aprende muito. E ver as coisas acontecerem, os resultados aparentes, é incrível. Encontro pessoas que sentem que precisam colaborar de alguma forma, nem que seja se desapegando e doando algo que não usam mais", disse.


Gernival sai todos os dias com seu veículo adaptado para levar maior quantidade de alimentos
Gernival sai todos os dias com seu veículo adaptado para levar maior quantidade de alimentos   Foto: Arquivo Pessoal

A História


Ao se aposentar e mudar para Praia Grande, ele não ficou confortável com o que encontrou aqui: "Eu vi moradores em situação de rua, e desabrigados e aí conversei com a minha esposa, e nós tomamos a decisão de comprar um kitzinho pra poder socorrer essas pessoas. Lembrei da minha infância, de tudo que passei na vida, e de como consegui me levantar.


Gernival relembrou o tempo em que sua vida era muito diferente. Ele já foi empresário, fazia feirões, e chegou a ter mais de 30 colaboradores. "Eu confesso que dominava em minha cidade, era muito bom, mas fui arrogante e numa dessas foi quando quebrei, e foi doído, perdi mais de R$ 2 milhões. Perdi praticamente tudo. Foi quando comecei a andar só de bicicleta", conta.


O empresário acabou tendo como opção um trabalho bastante diferente do que estava acostumado. "Aprendi o que era humildade. Fui trabalhar no serviço educacional Lar e Saúde, que é uma instituição da Igreja Adventista do Sétimo Dia, e lá tive palestras sobre o que iria passar a vender: livros de autoajuda, de saúde, de como deixar de fumar, se libertar das drogas, e muitos outros". E foi alí que ele começou a adquirir experiência em lidar de forma diferente com pessoas.


"Às vezes quando alguém passa por uma situação difícil, ou passa pela primeira vez, não está preparado pra enfrentar uma situação. Quem que já passou por obstáculos, sabe melhor como pulá-los", diz o aposentado. E com isso ele tenta sempre levar mensagens de apoio, aconselhar, e ouvir além de alimentar. "A primeira pessoa que tem que gostar de você, é você mesmo. Muita gente entra em desespero por pouca coisa, no primeiro obstáculo, já vai pro extremo, entende? E uma das coisas que a gente faz com isso, é levar esperança, mostrar que tem saída, aí ela encontra o caminho e segue. E esse é o nosso papel, levantar pessoas".


Ajudar quem ajuda


No início da atividade nas ruas, Gernival usava parte da aposentadoria para comprar os produtos que distribui. Fazia tudo sozinho, e em alguns meses já chegou a gastar todo o pagamento para manter o atendimento às pessoas. Com o tempo, passou a receber ajuda de amigos que viam o que ele fazia.


Atualmente o trabalho aumentou, e ele pretende ajudar muito mais. Porém, ele necessita de mais ajuda. Produtos como achocolatado, leite, bolachas, açúcar, chás são os mais necessários. Há, também, um número de conta para depósito, ou mesmo ligando para ele é possível colaborar. "Eu moro em Praia Grande e quem quiser pode me ligar, que eu vou buscar" o contato de Gernival é o (13) 99648-2807.


Todos os dias a esposa prepara com ele o 'café da manhã' distribuído nas ruas
Todos os dias a esposa prepara com ele o 'café da manhã' distribuído nas ruas   Foto: Arquivo Pessoal

Logo A Tribuna
Newsletter