Corrida contra o tempo pela vacina contra a Covid-19

Brasil está envolvido em duas frentes promissoras na luta pela produção de proteções contra o coronavírus

Por: Tatiane Calixto & Da Redação &  -  14/06/20  -  11:34
Governo de SP firmou parceria com um laboratório chinês para a produção nacional da vacina
Governo de SP firmou parceria com um laboratório chinês para a produção nacional da vacina   Foto: Divulgação/Governo do Estado

Enquanto o planeta ultrapassa a triste marca de 410 mil mortes causadas pelo novo coronavírus, laboratórios ao redor do mundo vivem uma corrida contra o tempo em busca de uma vacina contra a covid-19, trazendo esperança à população. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), há quase 140 pesquisas em andamento e o Brasil está envolvido com duas das mais promissoras. Tanto que, em breve, iniciará testes em voluntários.


Aprovar uma vacina não é tarefa rápida. O sarampo, por exemplo, foi identificado em 1953 e a imunização só chegou às pessoas uma década depois. No caso da hepatite B, esse intervalo entre descobrir a doença e a vacina foi de 16 anos, entre 1965 e 1981. 


Desde que a OMS anunciou os primeiros casos do novo coronavírus na China, já se passaram seis meses. Nesse período, cientistas aceleraram seus trabalhos e algumas pesquisas já entram na etapa de testes clínicos com seres humanos - algo que exige vários outros testes, mas é a última antes da aprovação dos órgãos responsáveis.


Os mais otimistas visualizam campanhas de vacinação contra a covid-19 no final deste ano. Mas a maioria dos especialistas aposta que isso só aconteça no fim do primeiro semestre de 2021.


Mais avançadas


No topo da lista da OMS está a pesquisa da Universidade de Oxford, no Reino Unido. O Brasil foi um dos países escolhidos para testar a eficácia desta vacina em duas frentes: em São Paulo e no Rio de Janeiro. Duas mil pessoas participarão dos testes nos dois estados.


Em São Paulo, os trabalhos serão conduzidos pelo Centro de Referência para Imunobiológicos Especiais (Crie) da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), contando com a viabilização financeira da Fundação Lemann no custeio da infraestrutura médica e equipamentos necessários.
 
Conforme a Unifesp, atualmente há a formatação do processo de seleção de voluntários. Eles serão escolhidos entre profissionais da saúde que atuem na linha de frente do combate à covid-19, além de adultos de 18 a 55 anos que trabalhem em ambientes com alto risco à exposição ao vírus, como agentes de limpeza de hospitais. No Rio, as ações ficarão a cargo da Rede D’Or São Luiz e do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino.


“Além da motivação científica que vem com a participação neste projeto, com a chance de trazer um protagonismo científico para o Brasil no enfrentamento da patologia e no oferecimento da vacina no País, tem a motivação pela luta mundial em relação à covid-19 e de trazer esperança para a população”, destaca Fernanda Tovar-Moll, presidente do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino.


China


Na última quinta-feira, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), anunciou uma parceria do Instituto Butantan com a farmacêutica chinesa Sinovac para produção e testes de uma vacina contra o coronavírus. 


Na lista da OMS, a pesquisa da Sinovac também está entre as mais adiantadas, na fase de testes clínicos. O acordo com o Governo Paulista prevê testagem em 9 mil voluntários brasileiros e fornecimento de doses até junho de 2021, se a imunização se provar eficaz.


“Poucos meses após a confirmação do primeiro caso de covid-19 no País, São Paulo vai liderar um ensaio clínico fase três e se prepara para iniciar a produção nacional de uma vacina promissora, que poderá ser disponibilizada em tempo recorde na rede pública de saúde”, afirmou o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas. 


Se a vacina for aprovada, Sinovac e Butantan vão firmar acordo de transferência de tecnologia para produção em escala industrial tanto na China quanto no Brasil, visando o fornecimento gratuito ao Sistema Único de Saúde (SUS).


Tecnologias diferentes são utilizadas


A diretora da Sociedade Brasileira de Imunização (SBIm), Mayra Moura, que também é mestre em Tecnologia de Imunobioló-gicos pela Fiocruz, explica que existem vacinas com tecnologias diferentes em desenvolvimento, mas o objetivo é sempre o mesmo: simular a doença, forçando o organismo a produzir anticorpos. 


“A ideia é que nossas células de defesa possam reconhecer essa simulação como perigo e iniciar a resposta imunológica, criando uma memória para inativar o vírus toda vez que a pessoa entrar em contato com ele de verdade”. 


Em uma doença rotineira, a pessoa entra em contato com o vírus e este se multiplica no organismo. O sistema imunológico reconhece a ameaça e tenta combatê-la. Porém, às vezes, não consegue neutralizar o inimigo antes dele se reproduzir, a ponto de fazer o organismo sucumbir. Por isso, a vacina precisa criar anticorpos suficientes para frear esse ataque.


Tecnologia


Mayra diz que algumas vacinas usam tecnologias já conhecidas, como vacinas atenuadas que são feitas com o próprio vírus vivo, mas enfraquecido. Podem ser também inativadas, quando o vírus está morto por ação física ou química.


É o caso da vacina da chinesa Sinovac, feita com fragmentos desativados do coronavírus que são introduzidos no organismo humano, forçando a criação de anticorpos. 


A vacina de Oxford, por outro lado, é testada há alguns anos em estudos para imunização de diferentes agentes infecciosos, como ebola e Mers (Síndrome Respiratória do Oriente Médio. Ela utiliza o vírus da gripe comum enfraquecido para carregar uma parte do coronavírus modificada em laboratório para dentro da célula humana.


Investimento


“Para haver o desenvolvimento de uma vacina, é preciso investimento em pesquisa. Vemos o exemplo da própria vacina para o coronavírus. Essas pesquisas com tecnologias mais novas já vinham sendo realizadas, sem, de fato, serem utilizadas. Quando há investimento prévio de pesquisa, no momento em que você precisa colocar em prática, é mais ágil” - Mayra Moura, Diretora da Sociedade Brasileira de Imunização (SBIm).


Cenário Atual


Segundo a OMS, 136 vacinas estão sendo estudadas hoje para imunizar o novo coronavírus. Destas, dez estão em fase clínica, ou seja, serão testadas em humanos.


O Brasil está na rota de testes de duas vacinas que estão na lista das dez em fase clínica.


Oxford - Essa vacina utiliza um vírus da gripe comum enfraquecido para carregar parte do coronavírus, modificada em laboratório, para dentro da célula humana, exigindo uma ação do sistema imunológico.


Sinovac - A farmacêutica chinesa produza medicamento com fragmentos desativados do coronavírus introduzidos no organismo humano, forçando a criação de anticorpos.


Rota de Produção


1- O primeiro passo para a criação de uma vacina é identificar qual agente é o causador da doença.


2- A próxima etapa é definir de que forma se estimulará o sistema imunológico a reagir, sem que esteja realmente doente. Aqui é possível utilizar o vírus enfraquecido ou inativo ou, ainda, um pedacinho dele inserido em um outro vírus, que servirá de vetor até a célula humana.


3- Depois, começam os testes laboratoriais, inúmeras moléculas são avaliadas para se definir a melhor composição de um imunizante. Daí, começam as experimentações em in vitro e em animais.


4- Se os testes forem positivos até aqui, começam, então, os testes em humanos. Primeiro, em um pequeno grupo para avaliar não só a eficácia, mas a segurança no organismo humano. Na segunda fase, são testadas centenas de pessoas.


5- Os testes finais são realizados em um milhão de pessoas. Aqui é interessante que os testes sejam realizados em locais com alta prevalência da doença, para que a eficácia seja realmente comprovada. A escolha de testes da vacina contra o coronavírus no Brasil está relacionada a isso.


6- Se passar tudo isso, a vacina vai para validação de autoridades regulatórias e, recebendo o aval, pode ser produzida em larga escala.


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