Brasil registra queda de 27,3% no número de ações trabalhistas

Número de novos processos baixou entre 2017 e o ano passado. Para especialistas, é um reflexo da reforma das leis do trabalho

Por: Matheus Müller & Da Redação &  -  19/09/19  -  19:37
O trabalhador, que antes da reforma era isento de custos, agora terá que pagar se perder o processo
O trabalhador, que antes da reforma era isento de custos, agora terá que pagar se perder o processo   Foto: Wesley Tingey/ Unsplash

O número de ações trabalhistas no Brasil caiu 27,3% entre 2017 e 2018: passou de 3,4 milhões para 2,5 milhões, segundo o relatório Justiça em Números, principal fonte estatística do Poder Judiciário. Especialistas apontam que o fenômeno está relacionado à reforma trabalhista e às mudanças decorrentes dela, como o pagamento de custas e honorários advocatícios pela parte perdedora – inclusive se for o trabalhador. 


A Tribuna teve acesso a uma sentença da 2ª Vara do Trabalho de São Vicente, em que um ex-funcionário teve julgados improcedentes todos os pedidos contra a empresa onde trabalhava: assédio moral, acidente de trabalho e jornada. A firma foi defendida pelo advogado Heitor Emiliano Lopes de Moraes, da Marsaioli & Marsaioli Advogados Associados.


Ele foi condenado a pagar R$ 4 mil em honorários advocatícios da parte acionada, equivalentes a 10% do valor da causa, mais R$ 800 em honorários periciais e multa de R$ 800 por litigância de má-fé (atitude desleal no processo). O mesmo ocorreu com a testemunha do reclamante, punida no mesmo valor.  


Como o ex-funcionário tinha conseguido direito à Justiça gratuita, ele foi isento das custas do processo e, se comprovar que não tem como pagar os honorários, o crédito fica suspenso por dois anos, até que haja uma mudança na condição financeira dele. Caso nada se altere nesse período, ele ficará desobrigado de pagar o valor.


Opiniões 


A juíza e presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Noemia Aparecida Garcia Porto, considera cedo para avaliar o impacto da reforma trabalhista, vigente desde novembro de 2017, na queda das ações. Porém, reconhece que a demanda caiu por medo dos reclamantes em perder os casos e ter que bancar os custos do processo.  


Advogado especialista em Direito do Trabalho, Vitor Rodrigues Marques concorda com a presidente da Anamatra quanto ao receio dos profissionais. “Antes da reforma, a demanda era muito maior. A condição econômica do País também contribui, pois hoje muita gente está desempregada”.


Noemia explica que, após a reforma ter sido aprovada, a Procuradoria-Geral da República (PGR) ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5766, para conter o que seria a atitude, inconstitucional, de negar o acesso pleno à Justiça.  


A medida causou uma diminuição nos processos, em 2018, à espera de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF). O tema não avançou, e a quantidade de ações cresceu no começo deste ano, na comparação com o início de 2018. Porém, ainda sob receio, segundo Noemia.


Apesar dessa retomada, ela ressalta que “os juízes notaram mudança nas ações. Antes, os funcionários pediam, em todas as ações, o que haviam sido lesados. Hoje, diminuíram os pedidos, para que se sintam mais seguros naquelas situações que têm mais provas”.


Marques destaca que antes da reforma, o trabalhador ingressava com a ação, requeria a Justiça gratuita por meio de uma declaração formal de pobreza, e não havia ônus nenhum para ele caso o pedido fosse julgado improcedente. 


“Agora, passaram a ser previstas as custas processuais, inclusive, para o beneficiado da Justiça gratuita. Pela nova sistemática, o empregado que não comparece à audiência trabalhista tem o processo arquivado e é condenado a pagar 2% das custas no valor da causa”, compara. 


Um exemplo 


Entre os dois pedidos feitos à Justiça pelo ex-funcionário citado acima, estava uma indicação de acidente de trabalho, no qual teria batido o joelho em um palete (estrado de madeira) por falta de equipamento de segurança. Alegou que, devido à lesão, foi mandado para casa e ficou debilitado. Porém, informou à perícia que jogava futebol aos fins de semana. Também citou assédio moral, mas a questão foi rejeitada após o empregador mostrar mensagens, entre as partes, em que o trabalhador o convidava para jogar futebol e fotos juntos.


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