Processo detalha fraudes e ligação com PCC de vereador, secretária de Governo e advogado de Cubatão

Conversas com um dos supostos líderes do grupo mostram pedidos de propinas e vantagens

Por: Izabelly Fernandes  -  20/04/24  -  06:46
Queixão, Tupinambá e Fabiana foram presos nesta terça-feira (16)
Queixão, Tupinambá e Fabiana foram presos nesta terça-feira (16)   Foto: Reprodução/ Redes sociais

A reportagem de A Tribuna teve acesso nesta sexta-feira (19) ao processo do Ministério Público do Estado de São Paulo (MP-SP) que está investigando uma organização criminosa que está ligada à facção Primeiro Comando da Capital (PCC), e estaria realizando fraudes em licitações em todo o Estado. Na Baixada Santista, o vereador Ricardo Queixão (PSD), o advogado Áureo Tupinambá e a servidora Fabiana de Abreu Silva foram presos durante a Operação Munditia na última terça-feira (16), que cumpriu mandados de busca, apreensão e prisão a respeito do caso.


Os três estão entre os cinco agentes públicos apontados no documento como membros ligados ao grupo criminoso. Nele, tanto Queixão, como Tupinambá e Fabiana, aparecem trocando mensagens com um dos supostos líderes da organização criminosa, Vagner Borges Dias.


Envolvimento
A Câmara Municipal de Cubatão é apontada no documento como um “polo de corrupção para a manutenção dos contratos escusos”. A primeira envolvida destacada é Fabiana, que é vinculada a Prefeitura e consta como Assessora Especial de Políticas Estratégicas no Gabinete.


Em prints de conversas de WhatsApp, a servidora aparece em várias conversas com Vagner. Em uma das mensagens, Fabiana cobra pelos valores pagos mensalmente pelos atos corruptos junto à administração municipal e ao legislativo de Cubatão. Para receber o valor, ela usa o próprio Cadastro de Pessoa Física (CPF) para receber o Pix de propina. Em outra, ela aparece comemorando a eleição de Queixão à presidência da Câmara. (Veja na imagem abaixo)


Print de conversas entre Fabiana e Vagner
Print de conversas entre Fabiana e Vagner   Foto: Reprodução

Print de conversas entre Fabiana e Vagner
Print de conversas entre Fabiana e Vagner   Foto: Reprodução

O documento ainda aponta a existência de contratos com as empresas investigadas com o legislativo da Cidade, além de licitações forjadas. A investigação descobriu que Tupinambá, que assumia a função de diretor-secretário da Câmara, era responsável pela “gestão documental” dos contratos para passar uma sensação de legalidade a eles, e discutia isso diretamente com Vagner. Neles, eram acrescidos valores que serviriam para amparar as propinas pagas. (Veja na imagem abaixo)


Prints de conversas entre Tupinambá e Vagner
Prints de conversas entre Tupinambá e Vagner   Foto: Reprodução

Além de Fabiana e Tupinambá, o processo indica que pode haver o envolvimento de outros agentes públicos, e destaca a ação do vereador Queixão. Antes mesmo de ser empossado como presidente do legislativo de Cubatão, Ricardo aparece em conversas com Vagner, pedindo o adiantamento da propina para comprar um terno para a posse. As transferências eram feitas em contas no nome da esposa, cunhada e outros membros da família dele, além de outros agentes parlamentares, para tentar esconder os rastros dos pagamentos. (Veja na imagem abaixo)


Prints de conversas entre Queixão e Vagner
Prints de conversas entre Queixão e Vagner   Foto: Reprodução

Início da investigação
Conforme o processo, tudo começou quando uma denúncia anônima foi recebida pelo MP-SP em junho de 2023. Nela, constava que uma possível fraude estaria ocorrendo em uma determinada licitação da Prefeitura de Guarulhos. Isso porque já existia a previsão de que a ganhadora seria uma empresa do Grupo Safe, que tem o nome de Vagner como um dos empresários responsáveis.


No documento, a denúncia aponta que Vagner é responsável por manter grupo de empresas em nomes 'laranjas', e possuir esquema com servidores públicos para a publicação de editais e direcionamento de licitações em várias cidades. Essas empresas seriam combinadas para competir de forma mentirosa e assegurar o benefício do grupo empresarial nos pregões, com ajuste e repasses também aos servidores envolvidos. Com a instauração do procedimento investigatório, foi constatada a recorrente atuação criminosa em licitações públicas.


Operação Munditia
Os três foram presos na última terça-feira (16), em Praia Grande e Santos por agentes do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) e da Polícia Militar. Conforme o MP-SP, a Operação Munditia cumpriu mandados expedidos pela 5ª Vara Criminal de Guarulhos. Ao todo foram 42 mandados de busca e apreensão e mais 15 de prisão temporária em diversas cidades do Estado.


As investigações apontam que os envolvidos atuavam em empresas que fraudavam competições em processos de contratação de mão de obra terceirizada em várias prefeituras e câmaras. Contratos em cidades como Guarulhos, São Paulo, Ferraz de Vasconcelos, Cubatão, Arujá, Santa Isabel, Poá, Jaguariúna, Guarujá, Sorocaba, Santos, Buri e Itatiba foram descobertos. Outros municípios também estão com contratos sob análise.


Na investigação, ainda são apontados os crimes de fraude documental e lavagem de dinheiro. Segundo informações prestadas durante a coletiva, o grupo criminoso possui contratos que envolvem serviços terceirizados de limpeza, totalizando mais de R$ 200 milhões angariados nos últimos anos. Por isso, o nome "Munditia" foi dado à operação, pois deriva do latim “limpeza”.


A operação contou com a participação de 20 promotores de Justiça, 15 servidores e mais de 200 policiais militares, entre operadores de inteligência e policiais táticos. O processo segue tramitando em segredo no Tribunal de Justiça de São Paulo.


Defesas
A reportagem de A Tribuna entrou em contato com os advogados de defesa de Queixão e Fabiana, mas até a publicação desta matéria não recebeu um retorno. Já a defesa de Tupinambá, o advogado Marcelo Cruz, enviou uma nota sobre o caso.


“Em análise aprofundada das conversas apresentadas pelas autoridades que presidem as investigações, verificamos que não possuem o condão de apontar eventual responsabilidade criminal do advogado (Diretor da Câmara Municipal). Ademais, salientamos que a extração de meros trechos de conversas sem, contudo, a exposição de todo o seu contexto, acabam levando a interpretação equivocada”, manifestou.


Prisão revogada
Fabiana deixou a cadeia pública de São Vicente nesta sexta (19) e está em prisão domiciliar. A decisão foi tomada pela juíza Priscila Devechi Ferraz Maia, da 5º Vara Criminal de Guarulhos (SP). A defesa de Fabiana havia pedido a revogação da prisão alegando que ela foi exonerada da Secretaria de Governo e teria colaborado no cumprimento do mandado contra ela.


À frente das investigações, o Ministério Público Estadual citou que Fabiana tem filhos menores e opinou pela prisão domiciliar, como se prevê no Código de Processo Penal. Sugeriu, ainda, que fosse proibida de contatar outros investigados, ir à Câmara e à Prefeitura e exercer função pública.


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