Pioneira na Arquitetura da Baixada Santista, FAUS chega aos 50 anos

Criada em 70, faculdade inovou no currículo e formou arquitetos em uma época de expansão e desenvolvimento

Por: Arminda Augusto  -  03/01/21  -  12:21
Prédio da Avenida Conselheiro Nébias foi entregue em 1976 e inovou para a época
Prédio da Avenida Conselheiro Nébias foi entregue em 1976 e inovou para a época   Foto: Matheus Tagé/AT

As cidades são o principal laboratório de uma das áreas mais antigas e nobres do conhecimento: a Arquitetura, que no Brasil tem expoentes conhecidos e reconhecidos internacionalmente, como Oscar Niemeyer e Lúcio Costa.


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O que nem todos sabem é que a Baixada Santista também figura como importante centro formador de arquitetos e urbanistas, cuja história está ligada à criação de uma das escolas mais antigas, a Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de Santos (FAUS), vinculada à UniSantos. A FAUS completou 50 anos em 2020.


Sua trajetória, as razões que levaram à sua criação, seus fundadores e a disseminação e influência da formação ali oferecida foram o foco da tese de doutorado do arquiteto e professor José Maria de Macedo Filho.


Projeto FAUS - ensaios no campo ampliado do ensino de arquitetura em São Paulo é o tema de seu trabalho, apresentado para uma banca de professores da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP no final do ano passado.


“As alianças ideológicas, as políticas pedagógicas entre as instituições e grupos de professores e alunos possivelmente consolidaram o modo paulista de pensar e fazer arquitetura. E muitos projetos na Baixada Santista têm forte influência dessa forma de pensar a arquitetura e o urbanismo”, diz o arquiteto.


Origem europeia


A FAUS foi fundada em 1970 e é a terceira escola mais antiga do Estado, depois da FAU-USP e da FAU-Mackenzie.
Não só a FAUS, mas diversas outras escolas de ensino superior nasceram na época da ditadura militar e do “milagre econômico”, em que havia grande demanda pela formação de profissionais no ensino superior.


Foi nessa época que o Ministério da Educação permitiu a ampliação da abertura de vagas em faculdades privadas.
Em sua tese e para explicar a origem da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de Santos, José Maria remonta a duas das principais escolas de arquitetura da história, ambas na Europa e criadas no século 20: os VKhutemas na extinta União das Repúblicas Socialistas Soviéticas e a Staatliches-Bauhaus de Weimar, na Alemanha.


“Em São Paulo, reflexos dessas experiências ocorreram no período de luta, no âmbito nacional pela conquista da autonomia da educação e da profissão do arquiteto, e influenciaram as reformas de ensino realizadas pela FAU-USP, posicionando o atelier no centro de todas as atividades didáticas da escola a partir de 1962”, escreve o professor em seu trabalho.


Em síntese, essas escolas propunham a valorização da arquitetura no sentido de aproximar a arte das questões técnicas e científicas. Buscava-se “orientar o ensino artístico no sentido de uma perfeita harmonia com a construção”, escreve José Maria.


Regulamentação


A profissão de arquiteto foi regulamentada em 1933, mas ainda sem a devida compreensão de que ser arquiteto não se limitava apenas às disciplinas tradicionais, mas impunha noções espaciais e urbanísticos, conceitos estéticos, humanos e sociais.


A autonomia das escolas, com novo currículo e em sintonia com o anseio desse movimento só aconteceu em 1945, com o decreto do governo estipulando novas regras para as faculdades de arquitetura.


Um personagem importante na criação dos novos conceitos sobre arquitetura foi o jovem João Baptista Vilanova Artigas, que depois de um curto período de estudo nos Estados Unidos influenciou outros arquitetos, entre eles, Oswaldo Correa Gonçalves.


Plano diretor e a criação da FAUS


Foi na elaboração do Plano Diretor de Santos, em 1968, que se percebeu a grande dificuldade de arregimentar arquitetos e urbanistas para planejar a Cidade e organizar seu desenvolvimento urbano.


“Vivia-se uma época de efervescência também nos campos cultural e a artístico. Havia demanda para projetos de habitação, educação, saúde, lazer, mas os quadros eram todos da Capital”, explica o arquiteto, justificando os motivos pelos quais se deu a criação da FAUS.


A proposta de Oswaldo era formar arquitetos para atender às necessidades de desenvolvimento da região, sem sofrer injunções políticas. “O arquiteto tem que fazer projeto, é próprio do arquiteto, o projeto. Projeto para a cidade, para as casas e para as coisas, mas fazer projeto”, disse o fundador da escola, à época.


As primeiras turmas funcionavam no prédio da Rua Euclides da Cunha, hoje desativado. Depois, ocupou um galpão na Avenida Ana Costa, depois transferiu-se para um prédio na Avenida Senador Feijó; depois no Colégio Santista.


Nas primeiras turmas da FAUS, a grande maioria dos professores era egressa da FAU-USP. Além de Oswaldo Corrêa, também Julio Katisky, Abrahão Sanovicz, todos responsáveis por diversos projetos em Santos.


Projeto inovador


Quem passa em frente à atual FAUS, na Avenida Conselheiro Nébias, não imagina quão inovador foi o projeto para a época. Entregue em 1976, foi o primeiro construído com lajes pré-fabricadas, que desceram a serra em complicada operação logística.


Concebido com espaços e dimensões adequadas para a criação e discussão de projetos, o novo prédio também foi palco de discussões ideológicas típicas do período, também marcado pelas diversas tentativas de censura dentro da própria faculdade, resultante das relações entre professores e alunos que, sob o pretexto de ameaças subversivas, viviam um processo de desconfiança mútua, pois sabiam que seus movimentos eram acompanhados de perto pela inteligência do alto comando do exército.


Cidade laboratório


Em sua tese, José Maria conclui que o projeto da FAUS atingiu o propósito a que se destinava: formar quadros para o desenvolvimento da região a partir de um currículo que incluísse amplo debate sobre os problemas concretos e suas necessidades.


Um dado reforça essa conclusão: José Maria buscou o paradeiro de todos os formandos da FAUS desde a primeira turma. Cerca de 10% responderam ao questionário. Desses, 87% atuam na área, tanto nas cidades da Baixada, como ABC, Capital, outros estados e países. Projetos de edificações são o foco de 64% deles, seguido de projetos de interiores (17%), e projetos de urbanismo (12%).


“Em 50 anos, o trabalho desses profissionais está presente em centenas de projetos, tanto na área pública como privada, contribuindo para o desenvolvimento da região”.


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